Por Michael Roberts, do blog "The Next Recession"
O recente relatório do Banco Mundial (Bird) sobre as perspectivas econômicas mundiais (GEP13AFinalFullReport) é uma leitura sombria sobre a economia do planeta. O banco estima que a economia global crescerá apenas 2,4% este ano em todo o mundo, incluindo a Ásia, a China e as economias capitalistas em desenvolvimento de mais rápido crescimento. É mais ou menos o mesmo que aconteceu em 2012. O banco espera que chegue até 3,3% em 2014, mas não dá para confiar muito, uma vez que ele vem revisando para baixo suas previsões a cada ano. Em junho passado a instituição afirmava que o crescimento mundial se situaria em 3% este ano.
Enquanto para os EUA o Bird prognostica um crescimento real este ano de apenas 1,9% e de 1,1% para o Reino Unido, muito abaixo da maioria dos prognósticos de consenso, prediz que a zona do euro permanecerá em recessão. Portanto, o Banco Mundial espera que os EUA cresçam mais lentamente neste ano que no anterior. Entre as principais economias, acredita que só a China tenha um crescimento mais rápido em 2013 (8,4%) do que em 2012 (7,9%). De fato, as chamadas economias capitalistas em vias de desenvolvimento cresceram apenas 5,1% no ano de 2012 em seu conjunto, o crescimento mais lento em uma década.
Dei uma olhada nos dados sobre o crescimento econômico mundial do Banco Mundial, remontando até 1960. Voltei a lembrar da intensidade da Grande Recessão. O PIB real mundial se contraiu em 2009 em 2,2%, o único ano em que se produziu uma contração desde 1960! Apesar da profunda recessão de 1982, ainda houve um pequeno aumento no PIB mundial, e subiu mais de 1% na primeira recessão mundial do pós-guerra, em 1974.
Claro, o PIB real per capita (que leva em conta o aumento da população mundial) se contraiu nessas recessões anteriores, mas a queda do PIB real per capita em 2009 foi mais que o dobro de 1982.
E, quando chegamos na maior economia capitalista, os EUA, os dados mostram o mesmo. Doug Short, em seu excelente blog sobre dados dos EUA, segue quatro indicadores chave para a saúde da economia dos EUA: produção industrial, vendas no varejo, emprego e ingressos pessoais. Short considera que a Grande Recessão foi realmente enorme para a economia dos EUA, com um descenso médio da média agregada destes indicadores acima de 10%, quase o dobro da queda de 1974-5.
E, se olharmos mais de perto a grande recessão nos EUA e a posterior recuperação, Short constata que se produziu uma importante recuperação do piso de 2009, mas ainda há um longo caminho a percorrer para chegar de novo ao máximo anterior. Poder-se-ia argumentar, como fazem alguns, que a queda da Grande Recessão foi tal que se necessitará mais tempo para a recuperação que em recessões anteriores. Sem dúvida, mas, no ritmo atual de recuperação, poderia levar três anos mais, o que somaria oito anos no total. E Short encontrou indícios de que o ritmo da recuperação em 2012 estava debilitando-se. Como cantava Bruce Springsteen em seu último disco, Wrecking Ball, nesta depressão "estivemos abaixo, mas nunca tão abaixo".
E se aprofundamos nos setores produtivos da economia dos EUA, como a produção industrial, se observa uma desaceleração do crescimento. Não é um retorno à recessão, mas a recuperação está dando lugar a uma depressão em longo prazo.
E, como tenho demonstrado em muitas ocasiões anteriores, a recuperação do emprego de seu piso na Grande Recessão tem sido particularmente fraca nos EUA – a chamada recuperação sem emprego (em relação às anteriores recuperações das recessões).
Se a recuperação dos EUA é fraca em comparação com as anteriores, continua sendo muito melhor que na zona do euro. Depois de tudo, o PIB real de EUA em 2012 foi 7% superior ao de 2006, enquanto na zona do euro foi apenas 2%; ainda que provavelmente seja mais justo comparar o PIB real com seu último pico no final de 2007: nesse caso o PIB real de EUA é só 2,5% superior ao de cinco anos atrás.
Paolo Manasse estudou as diferenças entre os porcentuais de recuperação dos Estados Unidos e da zona do euro. Descobriu que o déficit público nos EUA aumentou muito mais que na zona do euro, 12%, em vez de 5% do PIB entre o piso e o teto. Argumenta que isso demonstra que na zona do euro a politica de austeridade foi aplicada com mais dureza e que isso explica a pior recuperação.
Talvez seja assim, mas a outra cara da moeda é que a relação da dívida com respeito ao PIB do governo dos EUA aumentou muito mais, provocando, em minha opinião, graves problemas para o crescimento nos EUA.
Em um relatório privado, os economistas do banco de investimentos Morgan Stanley analisaram o estado das finanças públicas nas economias capitalistas e argumentam que o financiamento da dívida atual e futura se transformará em uma carga significativa para a rentabilidade e o crescimento do setor privado.
Os governos capitalistas terão duas políticas alternativas para enfrentar a austeridade. A primeira seria o não pagamento de suas dívidas com o setor privado, como na Grécia. Essa é a "solução" da escola austríaca de economia: desfazer-se da dívida excessiva. Ou podem forçar para baixo os tipos de juros da dívida para manter seus custos baixos, com a esperança de que a economia se recupere nesse meio tempo (a chamada repressão financeira). Essa é a solução keynesiana. Mas esse caminho significa que não haverá benefícios para quem investe em bônus do Estado ou que seja "animado" a fazê-lo pelos governos.
Ambas "soluções" implicam que os governos não honrarão suas dívidas de uma maneira ou outra, a fim de que a futura carga do aumento dos impostos sobre os setores produtivos capitalistas possa reduzir-se. Entretanto, ambas as soluções são um problema para o setor financeiro que possui a maior parte da dívida pública. Preferem que todas as dívidas do governo sejam honradas e pagas, seja porque os setores produtivos assumem a fatura ou, melhor ainda, os trabalhadores pagam mais impostos e recebem menos serviços e gasto social.
Quer dizer que a austeridade continua pelo momento. O não pagamento significaria uma nova recessão. Mas a repressão financeira implicaria baixo crescimento durante muito tempo porque supõe que o setor produtivo privado, de alguma maneira, se livrará da carga de sua própria dívida com o setor financeiro, assim como a limitação de uma rentabilidade relativamente baixa - para assim restaurar o crescimento.
*Michael Roberts é um reconhecido economista marxista britânico que trabalhou 30 anos na City londrinense como analista econômico. Ele publica o blog The Next Recession.
O recente relatório do Banco Mundial (Bird) sobre as perspectivas econômicas mundiais (GEP13AFinalFullReport) é uma leitura sombria sobre a economia do planeta. O banco estima que a economia global crescerá apenas 2,4% este ano em todo o mundo, incluindo a Ásia, a China e as economias capitalistas em desenvolvimento de mais rápido crescimento. É mais ou menos o mesmo que aconteceu em 2012. O banco espera que chegue até 3,3% em 2014, mas não dá para confiar muito, uma vez que ele vem revisando para baixo suas previsões a cada ano. Em junho passado a instituição afirmava que o crescimento mundial se situaria em 3% este ano.
Enquanto para os EUA o Bird prognostica um crescimento real este ano de apenas 1,9% e de 1,1% para o Reino Unido, muito abaixo da maioria dos prognósticos de consenso, prediz que a zona do euro permanecerá em recessão. Portanto, o Banco Mundial espera que os EUA cresçam mais lentamente neste ano que no anterior. Entre as principais economias, acredita que só a China tenha um crescimento mais rápido em 2013 (8,4%) do que em 2012 (7,9%). De fato, as chamadas economias capitalistas em vias de desenvolvimento cresceram apenas 5,1% no ano de 2012 em seu conjunto, o crescimento mais lento em uma década.
Dei uma olhada nos dados sobre o crescimento econômico mundial do Banco Mundial, remontando até 1960. Voltei a lembrar da intensidade da Grande Recessão. O PIB real mundial se contraiu em 2009 em 2,2%, o único ano em que se produziu uma contração desde 1960! Apesar da profunda recessão de 1982, ainda houve um pequeno aumento no PIB mundial, e subiu mais de 1% na primeira recessão mundial do pós-guerra, em 1974.
Claro, o PIB real per capita (que leva em conta o aumento da população mundial) se contraiu nessas recessões anteriores, mas a queda do PIB real per capita em 2009 foi mais que o dobro de 1982.
E, quando chegamos na maior economia capitalista, os EUA, os dados mostram o mesmo. Doug Short, em seu excelente blog sobre dados dos EUA, segue quatro indicadores chave para a saúde da economia dos EUA: produção industrial, vendas no varejo, emprego e ingressos pessoais. Short considera que a Grande Recessão foi realmente enorme para a economia dos EUA, com um descenso médio da média agregada destes indicadores acima de 10%, quase o dobro da queda de 1974-5.
E, se olharmos mais de perto a grande recessão nos EUA e a posterior recuperação, Short constata que se produziu uma importante recuperação do piso de 2009, mas ainda há um longo caminho a percorrer para chegar de novo ao máximo anterior. Poder-se-ia argumentar, como fazem alguns, que a queda da Grande Recessão foi tal que se necessitará mais tempo para a recuperação que em recessões anteriores. Sem dúvida, mas, no ritmo atual de recuperação, poderia levar três anos mais, o que somaria oito anos no total. E Short encontrou indícios de que o ritmo da recuperação em 2012 estava debilitando-se. Como cantava Bruce Springsteen em seu último disco, Wrecking Ball, nesta depressão "estivemos abaixo, mas nunca tão abaixo".
E se aprofundamos nos setores produtivos da economia dos EUA, como a produção industrial, se observa uma desaceleração do crescimento. Não é um retorno à recessão, mas a recuperação está dando lugar a uma depressão em longo prazo.
E, como tenho demonstrado em muitas ocasiões anteriores, a recuperação do emprego de seu piso na Grande Recessão tem sido particularmente fraca nos EUA – a chamada recuperação sem emprego (em relação às anteriores recuperações das recessões).
Se a recuperação dos EUA é fraca em comparação com as anteriores, continua sendo muito melhor que na zona do euro. Depois de tudo, o PIB real de EUA em 2012 foi 7% superior ao de 2006, enquanto na zona do euro foi apenas 2%; ainda que provavelmente seja mais justo comparar o PIB real com seu último pico no final de 2007: nesse caso o PIB real de EUA é só 2,5% superior ao de cinco anos atrás.
Paolo Manasse estudou as diferenças entre os porcentuais de recuperação dos Estados Unidos e da zona do euro. Descobriu que o déficit público nos EUA aumentou muito mais que na zona do euro, 12%, em vez de 5% do PIB entre o piso e o teto. Argumenta que isso demonstra que na zona do euro a politica de austeridade foi aplicada com mais dureza e que isso explica a pior recuperação.
Talvez seja assim, mas a outra cara da moeda é que a relação da dívida com respeito ao PIB do governo dos EUA aumentou muito mais, provocando, em minha opinião, graves problemas para o crescimento nos EUA.
Em um relatório privado, os economistas do banco de investimentos Morgan Stanley analisaram o estado das finanças públicas nas economias capitalistas e argumentam que o financiamento da dívida atual e futura se transformará em uma carga significativa para a rentabilidade e o crescimento do setor privado.
Os governos capitalistas terão duas políticas alternativas para enfrentar a austeridade. A primeira seria o não pagamento de suas dívidas com o setor privado, como na Grécia. Essa é a "solução" da escola austríaca de economia: desfazer-se da dívida excessiva. Ou podem forçar para baixo os tipos de juros da dívida para manter seus custos baixos, com a esperança de que a economia se recupere nesse meio tempo (a chamada repressão financeira). Essa é a solução keynesiana. Mas esse caminho significa que não haverá benefícios para quem investe em bônus do Estado ou que seja "animado" a fazê-lo pelos governos.
Ambas "soluções" implicam que os governos não honrarão suas dívidas de uma maneira ou outra, a fim de que a futura carga do aumento dos impostos sobre os setores produtivos capitalistas possa reduzir-se. Entretanto, ambas as soluções são um problema para o setor financeiro que possui a maior parte da dívida pública. Preferem que todas as dívidas do governo sejam honradas e pagas, seja porque os setores produtivos assumem a fatura ou, melhor ainda, os trabalhadores pagam mais impostos e recebem menos serviços e gasto social.
Quer dizer que a austeridade continua pelo momento. O não pagamento significaria uma nova recessão. Mas a repressão financeira implicaria baixo crescimento durante muito tempo porque supõe que o setor produtivo privado, de alguma maneira, se livrará da carga de sua própria dívida com o setor financeiro, assim como a limitação de uma rentabilidade relativamente baixa - para assim restaurar o crescimento.
*Michael Roberts é um reconhecido economista marxista britânico que trabalhou 30 anos na City londrinense como analista econômico. Ele publica o blog The Next Recession.
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