quinta-feira, 30 de julho de 2015

OS NOSSOS "YES, BWANA!" E OS NOVOS "HAI, BWANA!" DO FINANCIAL TIMES

Por Mauro Santayana


(Jornal do Brasil) - A imprensa brasileira destacou amplamente na semana passada o "duro" editorial da última quinta-feira do jornal inglês Financial Times sobre a crise política e econômica no Brasil, . Com o título “Recessão e politicagem: a crescente podridão no Brasil”, o texto conclui que a “incompetência, arrogância e corrupção abalaram a magia” do nosso país.

Assim como há quem se pergunte, nos moldes da sabedoria popular, de que se riem as hienas, seria o caso de se perguntar de que estava falando o Financial Times, quando chamou o Brasil de "um filme de terror sem fim", em seu editorial, prontamente reproduzido e incensado, com estardalhaço, por uma multidão de "Yes, Bwana!" nativos, prostrados - como os antigos criados negros na frente de seus mestres estrangeiros nos filmes de Tarzan - diante do trovejar do Grande Totem Branco do Reino Unido de Sua Majestade Elizabeth, quando ele se digna a contemplar com sua atenção este “pobre” e “subdesenvolvido” país.


Diante de tão poderoso édito e tão diligentes arautos, não há, no entanto, como deixar, também, de se perguntar:


Afinal, na economia, de que estava falando - ou rindo, como hiena - o Financial Times?


Se a Inglaterra, com uma economia do mesmo tamanho da nossa, tem uma dívida externa 20 vezes maior que a do Brasil, de 430% contra menos de 25% do PIB ?


Se as reservas internacionais britânicas são, também segundo o Banco Mundial, quase quatro vezes menores (107 bilhões contra 370 bilhões de dólares) que as do Brasil ?Se o déficit inglês no ano passado, foi de 5,5%, o maior desde que os registros começaram em 1948, e a renda per capita ainda está 1.2% abaixo da que era no início de 2008, antes da eclosão da Crise da Subprime?


Quanto à corrupção, também seria o caso de se perguntar: de que estava falando - ou rindo, como uma hiena - o Financial Times?Se a Inglaterra é tão corrupta, que deputados falsificam notas para receber ressarcimento e aplicam a verba de gabinete até para a assinatura de canais pornográficos?


Se a Inglaterra é tão corrupta, que o político conservador e ex-presidente do Comitê de Inteligência do Parlamento Malcolm Rifkind, que trabalhou por mais de uma década nos gabinetes da famigerada Margaret Tthatcher e do ex-primeiro-ministro John Major, e o político trabalhista Jack Straw, ex-secretário de Justiça, Ministro do Interior, Ministro de Relações Exteriores e ex-líder da Câmara dos Comuns, caíram em uma arapuca criada por um jornal e um canal de televisão, no início deste ano, e foram filmados sendo contratados para vender serviços de "consultoria" para pressionar embaixadores britânicos e líderes de pequenos países europeus para favorecer os negócios de uma empresa chinesa (fictícia), por quantias que variavam de 5.000 a 8.000 libras por dia?


Se em 2010, o mesmo tipo de reportagem, feita também pelo Channel 4, revelou que deputados e Lordes britânicos, como os ex-ministros trabalhistas Stephen Byers, a ex-secretária (ministra) de Transportes, Governo Local e das Regiões, Patricia Hewitt o ex-secretário (ministro) de Saúde, Geoff Hoon, e o ex-secretário (ministro) dos Transportes e ex-secretário (ministro) da Defesa Richard Caborn estavam dispostos a fazer lobby em favor de empresas privadas em troca de grandes somas de dinheiro, em um esquema que foi totalmente convenientemente blindado pelo governo do Primeiro-Ministro Gordon Brown?


Se, dois anos mais tarde, em maio de 2012, foram revelados que teriam sido oferecidos pelo tesoureiro do Partido Conservador, Peter Cruddas, jantares "íntimos" com o Primeiro-Ministro David Cameron - que está atualmente no poder - pela módica quantia de 250.000 libras, quase um milhão de reais, em "doação" para seu partido, e o gabinete do Primeiro-Ministro se recusou a revelar qualquer detalhe sobre esses jantares, nome dos "convidados", etc, alegando que eles eram "privados"?


Já imaginaram se fosse o Lula no lugar do Cameron? O que não iria dizer do Brasil o Financial Times em seus editoriais?


Finalmente, quanto à questão política, de que fala, como uma hiena - o Financial Times, com relação à popularidade da Presidente Dilma Roussef, se a desaprovação do Primeiro-Ministro James Cameron, segundo a empresa de monitoramento de redes sociais Talkwalker, subiu de 25% para 65%, e o número de cidadãos que o aprova caiu de 9 para 7 % nos últimos meses?


Não seria o caso - se nos preocupássemos com eles da mesma maneira que eles insitem em se meter em nossos assuntos - de escrever um editorial sobre a "permanente podridão da Grã Bretanha" ?


É por isso, por sua mania de dar lições aos outros, que os ingleses acabam tomando as suas. Quando a empáfia é muita, ela incomoda os deuses, e o castigo vem a cavalo.


Na mesma quinta-feira passada, do seu arrogante editorial sobre a situação brasileira, em suave vingança poética, depois de 153 anos servindo de escudo e biombo para a hipocrisia de um império decadente, erguido por corsários, bandidos e traficantes de drogas - vide a Guerra do Ópio - o Grupo Financial Times - por incompetência e risco de quebra - incluído o próprio jornal e todas as suas outras publicações - foi vendido para o grupo japonês Nikkei.Inc, por 1.3 bilhões de dólares.

A partir de agora, os jornalistas, editores e "analistas" do FT, famosos pela visão colonialista que tem do resto do mundo, vão ter que se acostumar - os que sobrarem, depois das demissões - a trabalhar, debaixo de chibata - em sentido figurado, mas não menos doloroso - para o Império do Sol Nascente, como os figurantes do clássico filme de guerra a Ponte do Rio Kwai, e a pronunciar "Hai, Bwana-San!", para seus novos donos nipônicos, expressão que deveria ser aprendida, por osmose - para que possam reconhecer quem são, a partir de agora, seus novos mestres - pelos "Yes, Bwana!" - nacionais.


http://www.maurosantayana.com/

quarta-feira, 15 de julho de 2015

Métodos dos abutres do sistema financeiro

Este é o capitalismo defendido pelos neoliberais, pelos arautos das "maravilhas" do estado mínimo, da tese de que capitalistas tem direito ao lucro porque se sujeitam à possibilidade do prejuízo. Quando suas manobras especulativas dão errado, eles simplesmente transferem o prejuízo para o Estado, para ser pago por toda a sociedade.

Ora, mas se o Estado é quem deve arcar com o pagamento em caso de prejuízo, deve então receber os lucros da atividade financeira, isto sem contar que este prejuízo não ocorreria se a intermediação financeira fosse exclusivamente gerida pelo Estado, pois administradores públicos jamais iriam ao limite da irresponsabilidade, quando não cometendo crimes, em suas manobras especulativas, só para alavancar ao máximo seus lucros.

Maria Lúcia Fattorelli é entrevistada do Espaço PúblicoMaria Lúcia Fattorelli é entrevistada do Espaço Público

"O Espaço Público de terça-feira (14/07) recebe a especialista em dívida pública, Maria Lúcia Fattorelli. Ela, que também é auditora fiscal aposentada da Receita Federal, participou junto com outros 35 especialistas de uma auditoria em Atenas, a convite do parlamento grego, para analisar a crise financeira que a Grécia atravessa.

Segundo a especialista, a conclusão da auditoria é que a Grécia foi usada para encobrir um escândalo financeiro de ajuda aos bancos privados no país. O esquema resultou no aumento expressivo da dívida grega que já alcançou 271 bilhões de euros, o correspondente a 177% do Produto Interno Bruto (PIB) do país.

“A Grécia, de 2010 para cá, não recebeu recursos. Ela recebeu papéis. Papéis que vieram de uma empresa privada, localizada em Luxemburgo, da qual os países europeus são sócios. Essa empresa foi criada no auge da crise em 2010 para salvar os bancos privados. E faz uma espécie de reciclagem, tirando esses papéis podres que estavam abarrotando os bancos privados. É um escândalo!”, afirma Maria Lúcia.

No programa, Fattorelli também fala sobre o trabalho de auditoria da dívida interna e externa do Equador, a pedido do presidente Rafael Correa, concluída em 2008. O trabalho, segundo ela, levou à anulação de 70% da dívida externa em títulos e permitiu que os recursos liberados fossem investidos, principalmente, em saúde e educação.

O Espaço Público é apresentado pelos jornalistas Paulo Moreira Leite e Florestan Fernandes Júnior e neste episódio conta com a participação de Leandra Peres, do jornal Valor Econômico."

http://tvbrasil.ebc.com.br/espacopublico/episodio/espaco-publico-recebe-maria-lucia-fattorelli

terça-feira, 14 de julho de 2015

Resposta a uma capivara monarquista

Um capivara retardada, tentando justificar os benefícios da adoção pelo Brasil da monarquia parlamentarista, escreveu no site http://pensabrasil.com/atriz-global-chama-brasil-de-mera-e-se-arrepende-de-voltar-ao-pais/ :

"Você sabe porque temos TANTA corrupção no Brasil?? Nossa república é ilegítima e nasceu de um GOLPE político militar. A república nasceu por vontade da ELITE CORRUPTA. Por isso o Brasil só anda para trás. Não é culpa dos "EUA" ou do "capitalismo" ou da nossa "colonização portuguesa". É culpa de um governo ilegítimo que apareceu para favorecer as ELITES CORRUPTAS da época.

Nós tínhamos uma MONARQUIA PARLAMENTARISTA com um Poder MODERADOR (como muitas monarquias de hoje TÊM) e fomos "DOUTRINADOS" pelos professores de "estória" a odiar esse modelo para acharmos que o poder moderador é "Ditadura Absolutista do Monarca" quando na verdade é um poder regulador da política e atos dos partidos visando o BEM DO PAÍS!! A monarquia ANDA PARA FRENTE e visa um projeto de país e não o projeto do partido e do "presidente" que muda de 4 em 4 anos. A Monarquia não é DE ESQUERDA E NEM DE DIREITA!! A Monarquia não representa partidos, ela representa o PAÍS!! Assista o vídeo e ajude a divulgar!!!"

E mais além:

"Niltinho Carlos Você não conhece a história VERDADEIRA de seu país... eu luto por algo VERDADEIRO, não por essa república idiota que só entrega "doutrinação" e mentiras para nossas crianças na sala de aula... E no mais... eu desculpo você por ter me chamado de besta. Você nem me conhece e já vem com agressões.. Mais fácil agredir do que vir com argumentos. São esses atos que só colocam esse país no buraco. Abraço"

A resposta não poderia tardar. Ei-la:

"João Antônio, você é sim uma capivara retardada, um fascista de merda, tentando justificar o injustificável, como um regime no qual o poder, ou pelo menos uma respeitável parcela deste, é exercido por uma pessoa pelo simples fato de ter nascido nesta ou naquela família. Isto é que é a monarquia, onde o deus de vocês, o zumbi do deserto, o "walking dead" da palestina, é quem escolhe quem deve nascer rei ou vassalo, nobre ou plebeu, independentemente dos méritos pessoais.

Você, por outro lado, demonstra ser uma múmia filosófica ao alegar que o rei não é de direita e nem de esquerda, e portanto absolutamente isento.

Seu cadáver intelectual, o rei e toda a nobreza, em uma monarquia, são membros da elite, com fortes laços com o poder econômico, e portanto, jamais podem ser isentos quando seus interesses colidirem com os do povo.

Veja o canalha do Pedro II, um racista e capacho, com complexo de vira-latas, que permitiu a imigração maciça de europeus para "branquear" a população brasileira e para resolver o problema das monarquias européias (muitas das quais seus familiares afastados!), que com a Segunda Revolução Industrial, não tinham empregos para toda uma massa de trabalhadores desempregados pela evolução das técnicas e máquinas. Para que amplas populações na Europa não chafurdasse na miséria, na mendicância e criminalidade, e potencialmente em revoluções sangrentas, as monarquias européias recorreram ao capacho Pedro II, que por ser racista, aceitou de bom grado todos os párias, principalmente italianos, espanhóis e portugueses.

Para avaliarmos a "isenção" do canalha Pedro II, o interesse dos baronetes locais nos cafundós do Brasil era que toda a população fosse analfabeta, portanto semi-escravos sem direito a voto. Pedro II, alegremente, atendeu aos anseios de barões caipiras, jamais promovendo a educação pública mas, muito pelo contrário, condicionando a abertura de qualquer escola, fosse apenas de alfabetização, a decreto real, que logicamente deveria receber o "nihil obstat" do baronete local. O resultado é que quando de sua deposição, em 1989, enquanto cerca de 80% da população dos EUA era alfabetizada, no Brasil apenas cerca de 8%.

Não podemos esquecer que no nosso regime monarquista, para você que alega conhecer a história, a Igreja Católica era instituição do Estado, e portanto partilhava o poder com os canalha dos Orleans e Bragança. Ora, ao contrário dos evangélicos, onde cada um deve ler a bíblia, e portanto ser alfabetizado, para o clero o interessante é que fosse apenas o padre o intérprete das "escrituras sagradas", e portanto, era interessante que amplas camadas da população fossem analfabetas, para serem exploradas, manipuladas e obedientes aos "comedores de hóstia".

Em que pesem ensinar aos filhos da nobreza e da burguesia, a Igreja Católica na nossa história sempre foi contrária à universalização da educação pública, sob o argumento pueril de que deus é quem escolhe quem deve ser ignorante ou sábio (veja os discursos de Deputados cléricos nos anais do legislativo!).

Em suma e síntese, eis a obra da monarquia no Brasil! Eis os méritos da canalha família real brasileira! Um país de ignorantes, analfabetos e semi-escravos, sempre de pires na mão, genuflexo perante a judeuzada dos Rothschild, na city de Londres, prontos a serrem escorchados com as maiores taxas de juros do planeta!"

segunda-feira, 13 de julho de 2015

O antropofágico ódio à ampla defesa, a advogados e uma democracia brazuca


Por JEAN MENEZES DE AGUIAR
Advogado e professor da pós-graduação da FGV

Uma sociedade boçal odeia muitas coisas. Odeia ampla defesa de réus e acusados; presunção de inocência de quem é suspeito de prática criminosa; garantias que são dadas a investigados por um delito.
Mas também odeia gays, prostitutas, negros, velhos, pobres. Não se preocupe, a lista do preconceito e da burrice é avassaladoramente grande.
Essas sociedades aceitam, sem qualquer remorso, linchamentos no meio da rua de suspeitos e julgamentos sumários apenas pela aparência do acusado. Por um mero indício de autoria, já tem que condenar e ponto final.
O pensamento retrógrado é assim.
A história mostra diversos países com este perfil. O Brasil viveu recente uma ditadura militar. Muitos processos judiciais eram esdrúxulos e calhordas, apenas um espartilho prostituto de seriedade excelencial para se condenar quem ‘se queria’ condenar. Em muitos casos, a acusação era mancomunada com a polícia e com o juiz. O famoso e clandestino livro ‘Brasil: nunca mais’, que não tem autor – repare-, relata mais de 700 processos judiciais de um Brasil que efetivamente não se deve tolerar novamente.
Advogados foram presos, espancados, tiveram escritórios explodidos. Uma bomba matou uma funcionária na OAB carioca. A ‘ampla defesa’ era uma guerra, vivenciada a tapa por defensores que arriscaram a própria vida. Muitos morreram.
Confirmaram-se lições que, entretanto, não são brasileiras, mas mundiais. Qualquer livro de Direito do mundo democrático reprova sociedades assim. A Declaração Universal dos Direitos do Homem, no artigo XI, 1, a que o Brasil e todos esses países são regidos, impõe:  ‘Toda a pessoa acusada de um ato delituoso presume-se inocente até que a sua culpabilidade fique legalmente provada no decurso de um processo público em que todas as garantias necessárias de defesa lhe sejam asseguradas.’
No Brasil atual há um curso curioso, para não dizer desesperador e antropofágico. Uma imprensa comercial, ávida por escândalos e heróis de plantão, passou a dar, assimetricamente, enormes espaços a investigadores, acusadores e julgadores, em um dos lados da balança. E ínfimos e burocráticos espaços a defensores, ou seja, a advogados, no lado oposto. É a imprensa julgando e preferindo. E preterindo.
A responsabilidade do jornalista, admitindo-se a hipótese de ele poder contrariar a ideologia do patrão e dizer verdades, seria imensa. Esta assimetria ‘jornalística’ com três pratos na balança de um lado – investigação, acusação e juiz-, e apenas um prato no outro lado, o advogado, começa a criar uma cultura infame numa sociedade já propensa a preconceitos.
Pôr-se o princípio constitucional da ‘ampla defesa’ em xeque, aceitando-se menosprezá-lo por meio da satanização de advogados, por exemplo, é parir um tipo obtuso de democracia. É pretender o pior dos mundos: um Estado policial [nazista], ou um Estado acusador [ditatorial]. Em termos constitucionais modernos não há estupidez maior que esses modelos de Estado.
Quando o Conselho Federal da OAB, por exemplo, provoca a cúpula fiscalizatória do Ministério Público a controlar melhor a delação premiada, por suspeita de coação, ou insta o Legislativo a não invadir questões blindadas legalmente por sigilo na relação advogado-cliente – como se quer fazer esta semana-, não está buscando proteger o advogado, mas sim a democracia, o direito de toda e qualquer pessoa de conversar com segurança e imunidade com seu advogado.
Ninguém ouve um relato possivelmente criminoso sem o ímpeto de ‘julgar’. Nem a mãe, nem um amigo. Só o advogado. Essa conquista da inviolabilidade de conversa advogado-cliente é universal. Não podem, por exemplo, parlatórios patéticos – e ilegais- de modernosas unidades policiais quererem que advogados conversem com seus clientes por meio de interfones presumivelmente censuráveis. Isto é uma piada, ilegal. Como não se pode exigir que advogados ‘contem’ o que ouviram de seus clientes.
Essas garantias não são brasileiras. São próprias de democracias. O grande risco é a sanha conservadora e autoritária oficial brasileira rangendo dentes e querendo ‘saber’ coisas diretamente pelo investigado ou por seu advogado. Que se reinstaure então o pau de arara e se rasguem as fantasias.
A jurisprudência sobre ‘ampla defesa’ do Supremo Tribunal Federal, ligando-a ao próprio conceito de democracia é de envergonhar qualquer ‘autoridade’ autoritária ou truculenta do país. Como também a segmentos tacanhos que acham bonito enaltecer as idiotices de um Estado policial ou de um Estado acusador.
Não há que se medir esforços para se enterrar o ilegal, o atrasado, o preconceituoso e o que o mundo democrático já concluiu não ser o melhor para as pessoas, as famílias e a segurança jurídica de uma sociedade. A imprensa, os intelectuais, as universidades têm um papel importante aí.
A cultura do menosprezo e ridicularização às garantias de qualquer pessoa investigada por um crime – que não tem relação com a proteção de vítimas que devem ser exemplarmente protegidas e assistidas-  é a síntese do atraso. Nem se precisa ir à Declaração Universal dos Direitos do Homem. Uma leitura ao artigo 5º da Constituição do Brasil é mais que suficiente. Ali está o que existe de mais moderno no mundo. Ainda que desavisados e não estudiosos de plantão ‘queiram’ que não seja assim.

domingo, 12 de julho de 2015

Dois anos depois, o que você precisa saber sobre o Mais Médicos


Médico cubano trabalha em aldeia indígena  Kumenê, em Oiapoque, a 590 quilômetros de Macapá. Para alcançá-la é necessário viajar mais de 15 horas por rio
Médico cubano trabalha em aldeia indígena Kumenê, a 590 quilômetros de Macapá-AP. Para alcançá-la é necessário viajar mais de 15 horas por rio.
Qual o perfil das populações atendidas. Como são avaliados os cubanos. Que parte de seus salários é transferida a Havana. Como ajudam a recuperar, em nações indígenas, a medicina tradicional 
Por Cynara Menezes
Há exatos dois anos, no dia 8 de julho de 2013, o Brasil foi tomado por uma onda de ira corporativista contra um projeto que visava ampliar a oferta de médicos especializados em saúde da família no País. Naquele dia, o governo baixou a MP (Medida Provisória) criando o programa Mais Médicos, que previa a importação de médicos de diversos países, inclusive cubanos. O CFM (Conselho Federal de Medicina) e a oposição ao governo tentaram, de todas as formas, impedir que os estrangeiros viessem suprir a carência de profissionais em áreas rejeitadas pelos médicos brasileiros.
Médicos cubanos chegaram a ser vaiados e insultados por colegas em sua chegada no aeroporto de Fortaleza (CE), em uma atitude que surpreendeu os dirigentes da OPAS (Organização Pan-Americana de Saúde), parceira do governo federal no programa. “Nunca pensei que fosse chegar a este extremo de preconceito e até racismo, que fossem dizer que as médicas cubanas pareciam empregadas domésticas, que os médicos negros deveriam voltar para a África ou que eram guerrilheiros disfarçados”, lamenta o representante da OPAS/OMS no Brasil, Joaquín Molina.
Neste meio tempo, sempre que a mídia brasileira noticiou o programa foi para contar quantos cubanos fugiram para Miami ou os erros que porventura cometeram, ainda que nunca tenha se concretizado nenhuma condenação. Molina se queixa que, cada vez que era procurado pelos jornais para defender o programa, ganhava um parágrafo na reportagem, contra dez do presidente do CFM atacando a ideia. “Pessoalmente, acho que a mídia brasileira privilegia a notícia ruim. Nunca vi uma manchete positiva neste país”, critica.
Reuni neste post 10 pontos que a imprensa não destacou para que as pessoas possam conhecer melhor o programa Mais Médicos. Confira.
1. O número de médicos na atenção básica à população na rede pública do País foi ampliado em 36%: tinha cerca de 40 mil antes do programa e ganhou 14.462 profissionais, entre eles 11.429 cubanos e 1.187 com diplomas de outros países. A lei priorizou os brasileiros, mas apenas 1.846 se inscreveram na primeira convocatória. Este ano, a situação se inverteu e 95% das 4.146 vagas foram ocupadas por médicos brasileiros.
Atualização: o ministério da Saúde informou que o número atualizado é de 18.240 médicos no programa.
2. Além de serem reconhecidos como excelentes médicos de saúde da família, a principal vantagem dos médicos vindos de Cuba, segundo a OPAS, é que vieram todos de uma vez, em um pacote. Outra vantagem é que qualquer abandono que não seja por razões de saúde é coberto pelo governo cubano, que envia outro profissional sem nenhum custo adicional para o governo brasileiro. A OMS situa o sistema de saúde cubano entre os 39 melhores do mundo; o sistema de saúde brasileiro aparece na 125ª posição. Ao contrário dos brasileiros e profissionais de outros países, os cubanos também não escolhem para onde querem ir, é o ministério e a OPAS que decidem para onde serão designados.
3. Os médicos cubanos ganham R$ 3 mil por mês; os outros R$ 7 mil do salário previsto no acordo vão para o governo de Cuba. Ainda assim, o pagamento que recebem no Brasil é 20 vezes superior ao que receberiam em sua ilha natal. Além disso, os municípios arcam com todas as despesas: transporte, moradia e alimentação. Ou seja, o cubano praticamente não gasta o dinheiro que recebe.
4. Uma avaliação independente feita em 1.837 municípios revelou um aumento de 33% na média mensal de consultas e 32% de aumento em visitas domiciliares; 89% dos pacientes reportaram uma redução no tempo de espera para as consultas. Uma pesquisa feita em 2014 pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), baseada em 4 mil entrevistas em 699 municípios, revelou que 95% dos usuários estão satisfeitos ou muito satisfeitos com o desempenho dos médicos. 86% dos entrevistados afirmaram que a qualidade da atenção melhorou após a chegada dos profissionais do Mais Médicos e 60% destacaram a presença constante do médico e o cumprimento da carga horária. Queridos por seus pacientes, vários médicos cubanos têm sido homenageados pelas câmaras municipais por seu trabalho no Brasil.
5. O programa cobre 3.785 municípios, sendo que 400 deles nunca haviam tido médicos. Os 34 distritos indígenas contam hoje com 300 médicos; antes não tinham nenhum. Entre os yanomami, por exemplo, houve um aumento de 490 atendimentos em 2013 para 7 mil em 2014, com 15 médicos cubanos dedicados à etnia com exclusividade. 99% dos médicos que atendem os índios no programa são cubanos.
6. Um dos trabalhos mais interessantes desenvolvidos pelos médicos cubanos nas aldeias indígenas é o resgate da Medicina Tradicional, com o uso de plantas. Na aldeia Kumenê, no Oiapoque (AP), o médico Javier Lopez Salazar, pós-graduado em Medicina Tradicional, atua para recuperar a sabedoria local na utilização de plantas e ervas medicinais, perdida por causa da influência evangélica. O médico estimulou os indígenas a buscar as canoas defeituosas e abandonadas nas beiras dos rios para transformá-las em canteiros de uma horta comunitária só com ervas medicinais, identificadas com placas e instruções para uso.
7. Ao contrário do que os jornais veiculam, os médicos e médicas cubanos não são proibidos de se casar com brasileiros. Existe uma cláusula que os obriga a comunicar os casamentos para evitar bigamia em seu país natal, segundo a OPAS. Os casos de romances entre médicos/as e brasileiros/as são numerosos. Houve até uma prefeita em Chorrochó, na Bahia, que se casou com um médico cubano.
8. Desde que o programa Mais Médicos começou, 9 médicos cubanos morreram: cinco por enfarto, 3 por câncer e 1 por suicídio (em 2014, um médico de 52 anos, ainda em treinamento, foi encontrado morto em um hotel de Brasília, possivelmente por enforcamento). Até agora, somente oito abandonaram o programa e deixaram o país rumo aos EUA.
9. O programa Mais Médicos virou modelo no continente e países como a Bolívia, o Paraguai, o Suriname e o Chile, que também sofrem com falta de profissionais, já planejam fazer projetos semelhantes.
10. Além do atendimento de saúde, o Mais Médicos inclui a ampliação da oferta na graduação e na residência médica e a reorientação da formação e integração da carreira. A meta é criar, até 2018, 11,5 mil novas vagas de graduação em medicina e 12,4 mil de residência médica, em áreas prioritárias para o SUS. Os municípios onde serão instalados os novos cursos de medicina foram escolhidos de acordo com a necessidade social, ou seja, lugares com carência de médicos.
http://www.jornalggn.com.br/noticia/dois-anos-depois-o-que-voce-precisa-saber-sobre-o-mais-medicos

sexta-feira, 10 de julho de 2015

A ODEBRECHT E O BNDES




Por Mauro Santayana

Nos últimos dias, jornais e portais deram destaque para a informação de que os financiamentos à Odebrecht pelo BNDES teriam “disparado” de 2007 para cá, e de que diplomatas brasileiros servindo em outros países e na Venezuela, teriam apoiado a empresa e comemorado, em comunicados e correspondência interna,  o fato dela ter aumentado nos últimos anos seus negócios no exterior. 

Chama-se  a atenção para isso, como se houvesse algo de irregular nesses dois fatos. 

Primeiro, o de o nosso maior banco de fomento, que carrega os adjetivos “econômico” e “social” no nome, financiar,  para clientes internacionais da maior empresa de engenharia e construção da América Latina, a aquisição de produtos e serviços brasileiros. 

E, em segundo lugar, o  de diplomatas brasileiros darem suporte à expansão de empresas nacionais no exterior, como fazem, por milhares de vezes, embaixadores e encarregados de negócios  norte-americanos em todo o mundo, como pode ser visto  em centenas de telegramas publicados no Wikileaks.  

Segundo esse dados, os financiamentos do BNDES para clientes da Odebrecht no exterior, teriam passado de uma média de 166 milhões de dólares por ano, de 1998 a 2005, para um bilhão de dólares, em média, depois, até 2014. 

Uma quantia que equivale a um percentual - como a mesma matéria acaba informando mais adiante -  de apenas 8,4% dos contratos totais da Odebrecht fora do Brasil no período, que foram de 119 bilhões de dólares, em sua maioria emprestados por bancos internacionais - o que mostra que o BNDES não está sozinho em sua confiança na empresa - para o financiamento da execução de projetos de seus clientes em outros países. 

Para se ter uma ideia, os recursos do BNDES para financiar pagamentos à Odebrecht alcançaram em 2014 apenas 7% dos 14 bilhões de dólares que a empresa faturou no ano passado. 

No entanto, ao ler a matéria, muitos leitores podem ser levados a pensar que esse aumento foi apenas para a Odebrecht, ou, como dizem muitos, que o BNDES tem investido preciosos recursos fora daqui, no lugar de aplicá-los em projetos dentro do Brasil.

Isso seria verdade, se, nos últimos anos, o BNDES tivesse subtraído de seu orçamento histórico, sem aumentá-lo, dinheiro para obras no exterior e se essas obras não tivessem criado milhares de empregos para brasileiros, dentro e fora do país.    

Mas o que ocorreu foi exatamente o contrário. 

Os desembolsos do BNDES, para financiamento de todos os setores da economia,  passaram de menos de 35 bilhões de reais, em 2002, para 187 bilhões de reais em 2014.   

E mais, se de 1990 a 2006, em 16 anos, o dinheiro emprestado pelo BNDES EXIM, o seu braço de apoio a exportação, foi de aproximadamente 23 bilhões de dólares, ele subiu, em apenas sete anos, de 2007 a 2014, para mais de 40  bilhões de dólares - para sermos exatos, 128 bilhões de reais, beneficiando não apenas a Odebrecht e outras grandes empresas, mas, por meio delas, milhares de pequenas e médias empresas brasileiras.

Outra impressão que fica, para certo tipo de público, ao ler o texto, é que a Odebrecht parece ser uma organização “terceiro-mundista”, “comunista” e “bolivariana”, que apenas graças ao apoio do PT se expandiu no mundo.

Como projetos da Odebrecht no exterior, são citados o metrô de Caracas e de Los Teques, na Venezuela - o primeiro financiamento para essa obra foi do governo Fernando Henrique Cardoso - centrais hidroelétricas e termelétricas no Equador, Angola, Peru, República Dominicana, um gasoduto na Argentina, aeroportos “como o de Nacala, em Moçambique”, e o onipresente, na imprensa brasileira, de uns tempos para cá, Porto de Mariel, em Cuba.

Mas não se diz, para maior informação dos leitores, e de toda a sociedade brasileira, que, se a Odebrecht fez obras no porto de Mariel, em Cuba, também as fez no Porto de Miami, como a infra-estrutura que permitirá  receber os super-cargueiros  que atravessarão o novo  Canal do Panamá, ampliado; que se faz obras no aeroporto de Nacala, em Moçambique, também as faz no aeroporto de Miami - o novo Terminal Norte do Miami Airport, construído pela Odebrecht, recebeu o prêmio Global Best Projects, da conceituada revista ENR, Engineering News-Record  - ou nos aeroportos de Orlando e de Fort Lauderdale; que se faz metrô subterrâneo na Venezuela,  também já fez um tipo de metrô (suspenso - foto) em Miami;  rodovias como a Route 56, na Califórnia, a SR 836/I-395 na Flórida, ou a Sam Houston e a Grand Parkway, no Texas, viadutos como o Golden Glades e estádios como a American Airlines Arena, em Miami, centros culturais como o Adrienne Arsht Center for Performing Arts, na mesma cidade, sistemas de proteção hidraúlica e ordenamento hídrico contra enchentes, como a Barragem de Seven Oaks, na Califórnia, ou o LPV-9.2, que protege as estações de bombeamento do Lago Pontchartrain, na Louisiana, contra furacões. 

Tudo isso nos Estados Unidos, país em que está presente desde 1990, e no qual emprega - entre eles muitos brasileiros - milhares de trabalhadores de 33 diferentes nacionalidades.

Como vemos, a situação está tão surreal e absurda, que, mesmo que a capital da Odebrecht, fora do Brasil, seja Miami - a cidade mais conservadora dos EUA - e  não Havana, o seu presidente está preso e é execrado, diariamente, nas redes sociais brasileiras, pelo suposto  “bolivarianismo” de sua empresa e eventuais “ligações” com o PT.  

Já faz algum tempo que o BNDES tem sido atacado violentamente  nas redes sociais. 

Pretende-se, no “liberou geral” da prorrogada, persistente, duradoura, temporada de Caça ao Chifre na Cabeça de Cavalo, ou de cabelo, em casca de ovo, envolver, “de boca”, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social com alguma irregularidade. 

Tornou-se corriqueiro dizer que há uma “caixa preta” do BNDES, que, quando aberta, abalaria a República - nos círculos mais ignorantes segue viva a lenda urbana de que a família Lula é dona da FRIBOI, também beneficiada por financiamentos do banco - quando se trata de uma das mais sérias e competentes instituições brasileiras, e de um esteio de grande importância para o desenvolvimento econômico e social do país.   

Outro mito recorrente, nos últimos tempos, é que as operações do BNDES no exterior teriam causado rombo no tesouro e dado bilhões de dólares em prejuízo ao país.

Ao contrário do que muitos pensam,  o BNDES não tem costume de salgar carne podre e é uma das instituições mais sólidas do mundo.  

O índice de Basileia exige mais que 11%, quando o do BNDES é de 15,9%. O Capital Principal tem que ser de mais de 4,5%, quando o do BNDES é de 10,6%. A Exposição Cambial tem que ser de menos 30%, quando no BNDES ela é de apenas 4,8%. A exposição ao Setor Público deve ser de menos de 45%, quando no BNDES é de 26,2%. A imobilização deve ser de menos de 50%, quando no BNDES, ela é de apenas 11,4%. Os dados são de dezembro de 2014. 

Os seus ativos aumentaram de 782 para 977 bilhões de reais (eram de menos de 43 bilhões em 2002) entre dezembro de 2013 e um ano depois. O Patrimônio Líquido subiu de 60 para 66 bilhões de reais, a inadimplência manteve-se em modestíssimos 0.01% e os lucros, o Resultado Líquido, subiu de 8.150 para 8.594 bilhões de reais no final de 2014.

O que atrapalha a expansão da infra-estrutura no Brasil não é a falta de dinheiro. É a ortodoxia monetária que impede que o governo se endivide, eventualmente,  para desenvolver - e até mesmo defender - o país, como costumeiramente fazem nações como os Estados Unidos, que estão entre os maiores devedores do mundo, e todo tipo de empecilho e de sabotagem que fazem com que obras como a Hidrelétrica de Belo Monte - e a própria refinaria Abreu e Lima - já tenham enfrentado dezenas de interrupções.    

O Congresso aprovou o fim do sigilo das operações de financiamento exterior do BNDES - vetado pela Senhora Dilma Roussef - como se essa norma fosse praticada em bancos de apoio à exportação de países como a Coréia do Norte, quando ela faz parte do comportamento normal - para não entregar de graça informações para a concorrência - de bancos e instituições semelhantes em nações como a Alemanha (KFW), Canadá (Banco de Desenvolvimento do Canadá), Espanha (ICO), e a JFC- Japan Finance Corporation e o JBIC - Japan Bank for International Cooperation, do Japão.          

Não temos maiores simpatias pela Odebrecht do que teríamos com relação a qualquer empresa que gerasse o número de empregos que gera e que fosse da importância estratégica que tem para o Brasil, já que ela está à frente, entre outros importantes projetos - condição também ameaçada pelos problemas que está vivendo agora - da construção de nossa nova base de submergíveis, de vários submarinos convencionais e do novo submarino atômico nacional. 

Também acreditamos que já passou da hora de empresas que são financiadas pelo BNDES no exterior promoverem uma ação institucional coletiva para explicar ao público como funcionam os financiamentos dessa instituição nessa área e a importância da exportação de serviços de engenharia para o Brasil e a economia nacional, e do BNDES fazer o mesmo, já que tem o dever de prestar contas à população.

Mas o primeiro compromisso de um jornalista é com a verdade.

E a verdade, para além dos fatos já citados, é que grandes nações não se fazem sem grandes bancos públicos, como o BNDES, para financiar seu desenvolvimento e suas exportações, sem uma diplomacia ativa em defesa dos interesses nacionais e sem grandes grupos empresariais, especialmente das áreas de engenharia e infra-estrutura, que possam apoiar a venda de seus produtos e serviços e projetar - para lugares menos e mais desenvolvidos que o nosso - a imagem de um  país atuante e competente lá fora.

Os financiamentos do BNDES no exterior garantem um milhão e quinhentos mil empregos no Brasil, e a sobrevivência de milhares de empresas brasileiras, como as que fornecem serviços e produtos para clientes da Odebrecht no exterior, cuja lista, (apenas das maiores) retirada do site da empresa, fazemos questão de publicar depois deste texto.     

São instrumentos de financiamento, apoio governamental, know-how avançado, entre outros - que distinguem os países fortes e bem sucedidos dos mais dependentes e fracos, e que abrem caminho para o avanço de certas nações em detrimento de outras, em um planeta cada vez mais complexo e competitivo.

http://www.maurosantayana.com/

quinta-feira, 9 de julho de 2015

Lula, o 9 de julho e a contrarrevolução


Beto Almeida
Arquivo

É reconhecida a criatividade de Lula de fazer caracterizações políticas que alargam o imaginário popular para a compreensão política, além de promover importantes quebras de paradigmas na  ardilosa conceituação conservadora sobre eventos históricos, quando estes são falsificados de modo grosseiro, invertendo seu real sentido histórico.

Lula surpreende positivamente ao declarar que o que o houve em 32, quando a oligarquia paulista se lançou em armas  contra a Getúlio Vargas, foi uma contrarrevolução, nada a ver com uma revolução como querem os conservadores.
De fato,  foi uma rebelião oligárquica  contra a industrialização e o avanço das conquistas trabalhistas. Lula questiona, com uma frase, o que  toneladas de teses acadêmicas não lograram, fulminando o batismo  daquele levante conservador de “revolução”, tal como se tentou crivar o golpe ditatorial de 64, como se revolução fosse.
 
Em 32, o conservadorismo apelidou de "Revolução" um movimento armado feito para defender os privilégios da oligarquia cafeeira, em conexão submissa aos banqueiros de Londres. Por isso é feriado estadual em São Paulo, cuja capital é , provavelmente,  a única a não possuir uma Avenida Getúlio Vargas, como nas demais, em homenagem ao presidente que mais avanços econômicos e sociais promoveu no Brasil. 

Contrariando a ideia de um ”Brasil cordial”, em 32 houve  guerra civil. A desinformação conservadora, até hoje predominante, sonegou aos brasileiros o direito de saber  que a classe operária paulista, solidária com Vargas, contribuiu com a sua vitória “abastecendo” as forças militares da direita paulista com granadas e balas contendo  apenas  areia.  Lembremos:  em 9 de julho de 32, Vargas já havia convocado as eleições para o ano seguinte, para as quais foram instituídos o voto secreto e o direito das mulheres de votarem e de serem votadas,  direito que a França só alcançou em 1945. Em 32, Vargas já havia iniciado a auditoria da dívida externa brasileira, reduzida à metade.

Nesta guerra civil, em defesa da legalidade, estavam JK,  o Gonzagão, o Rei do Baião e um jovem estudante de direito mineiro, mais tarde  presidente do Brasil:  Tancredo Neves, que em agosto de 54, Ministro da Justiça,  propôs a Vargas a resistência armada ao golpe da UDN. Ainda hoje, o embate ideológico de 1932 divide a política brasileira.
 
De um lado os defensores dos ideais da Revolução de 30, com seu programa de industrialização, desoligarquização do Brasil, expansão dos direitos trabalhistas, política externa baseada na integração latino-americana e independente dos  ditames imperiais. De outro, os ainda  defensores dos ideais do Movimento de 32, críticos do protagonismo do estado nas políticas públicas,  hoje alinhados com  FHC , proclamador da necessidade de “acabar com a Era Vargas”. Por isso a importância de debater criticamente esta data,  em sintonia com a sinalização feita por Lula.

http://www.cartamaior.com.br/?%2FEditoria%2FPolitica%2FLula-o-9-de-julho-e-a-contrarrevolucao%2F4%2F31324

quarta-feira, 8 de julho de 2015

Assassinar agentes ou parentes de agente penitenciário passa a ser crime Hediondo

A presidente Dilma Rousseff sancionou lei que torna crime hediondo e homicídio qualificado o assassinato de policial,bombeiro, integrante das Forças Armadas, agentes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança. O agravamento se estende ainda se a vítima for cônjuge, companheiro ou parente até de terceiro grau do policial. A nova lei foi publicada na edição desta terça-feira do Diário Oficial da União.


segunda-feira, 6 de julho de 2015

Por que em Cuba não há violência com armas de fogo?

Cuba_Crianca09
Com a educação das crianças, a delinquência juvenil em Cuba é praticamente nula.
Yuris Nórido

Em Cuba, a maioria das pessoas já viu tiroteios… na televisão.
Com certeza, muitos leitores discordarão de alguns argumentos aqui expostos, mas ninguém pode desconhecer uma realidade inquestionável: comparada a outras capitais latino-americanas, Havana é uma cidade segura.

Disso sabem seus habitantes e também as centenas de milhares de turistas que visitam a urbe todos os anos. O índice de homicídios por armas de fogo, por exemplo, está entre os mais baixos do continente.

Não estamos descrevendo um paraíso. Nas últimas décadas – décadas marcadas por uma crise econômica que se tornou em certa medida uma crise de valores – fomos testemunhas de um aumento da criminalidade.

Fica difícil para o cidadão comum ver essa realidade em números: as autoridades não costumam divulgar as estatísticas e os meios de comunicação estatais não incluem normalmente em seus espaços informações sobre atos criminosos.

Mas uma coisa é clara: um assassinato não é notícia todos os dias em Cuba. Pelo menos isso não faz parte da rotina das pessoas.

Eu mesmo moro num bairro da periferia, amiúde volto tarde para casa e, no caminho, percorro um longo trecho de locais mal iluminados. Nunca tive o menor problema.

É claro que há bairros e bairros. Algumas zonas são mais perigosas que outras, as pessoas que circulam em certas horas são mais vulneráveis. Isso acontece, em maior ou menor medida, em todas as cidades grandes.

Mas, em Havana, os tiroteios, os assaltos aos comércios e aos domicílios a mão armada não são rotineiros. E fenômenos como sequestros e ações do crime organizado, que afetam outras cidades da região, são praticamente inexistentes em Havana.

Isso tem muito a ver com o fato de Cuba ter uma legislação rigorosa no que tange ao porte de armas. De fato, nenhuma pessoa física está autorizada a adquirir ou portar armas de fogo, com exceção daquelas utilizadas na caça, e mesmo estas últimas estão submetidas a um forte controle.

Apenas efetivos das forças policiais, agentes de segurança e pessoas autorizadas pela natureza de suas funções podem portar armas. Os efetivos do Exército só as podem usar em zonas militares e durante exercícios de treinamento.

As disposições contra a posse de armas brancas em lugares públicos também são rigorosas. Isso não significa, obviamente, que todos os atos de violência possam ser evitados. Mas suas consequências são quase sempre menos trágicas.

Quando em discursos e slogans se fala das conquistas da Revolução (a própria construção se tornou um lema: “As conquistas da Revolução”), faz-se referência, sobretudo, à educação e à saúde gratuitas e universais. Mas não se fala tanto na tranquilidade cidadã.

A Revolução de 1959 exterminou as organizações do crime organizado, extirpando o mal pela raiz. Havana era um dos centros internacionais da máfia: poderosos chefões passavam suas férias tranquilamente nos hotéis da capital.

O governo revolucionário, num processo paulatino, foi limitando a aquisição de armas de fogo a tal ponto que a única armaria pública que ainda resta na cidade agora é um museu.

Alguns alegarão que a proibição é um atentado contra os direitos dos cidadãos, mas o certo é que isso tem sido a garantia do sossego. O porte de armas de fogo por um adolescente na escola (dolorosa realidade em outros países) é algo que em Cuba não pode sequer ser concebido.

A maioria dos cubanos tem sido testemunha de tiroteios apenas na televisão, no cinema e durante treinos militares.

Não estamos imunes a roubos, agressões mais ou menos violentas, vigarices… E é possível que esses delitos sejam mais frequentes do que se imagina (pelo menos essa é a percepção popular, dada a reticência da mídia em divulgá-los); mas poucas famílias tiveram de chorar a perda de um de seus integrantes durante assaltos a mão a armada.

http://limpinhoecheiroso.com/2015/06/30/por-que-em-cuba-nao-ha-violencia-com-armas-de-fogo/

domingo, 5 de julho de 2015

O perfeito idiota brasileiro


Por Adriano Silva
Ele não faz trabalhos domésticos. Não tem gosto nem respeito por trabalhos manuais. Se puder, atrapalha o trabalho de quem pega no pesado. Trata-se de uma tradição lusitana, ibérica, que vem sendo reproduzida aqui na colônia desde os tempos em que os negros carregavam em barris, nas costas, a toilete dos seus proprietários, e eram chamados de “tigres” – porque os excrementos lhes caíam sobre as costas, formando listras. O Perfeito Idiota Brasileiro, ou PIB, também não ajuda em casa por influência da mamãe, que nunca deixou que ele participasse das tarefas – nem mesmo por ou tirar uma mesa, nem mesmo arrumar a própria cama. Ele atira suas coisas pela casa, no chão, em qualquer lugar, e as deixa lá, pelo caminho. Não é com ele. Ele foi criado irresponsável e inconsequente. É o tipo de cara que pede um copo d’água deitado no sofá. E não faz nenhuma questão de mudar. O PIB é um especialista em não fazer, em fazer de conta, em empurrar com a barriga, em se fazer de morto. Ele sabe que alguém fará por ele. Então ele se desenvolveu um sujeito preguiçoso. Folgado. Que se escora nos outros, não reconhece obrigações e que adora levar vantagem. Esse é o seu esporte predileto – transformar quem o cerca em seus otários particulares.
IDIOTA BRASILEIRO
Uso indevido de vaga de deficientes em shopping.
O tempo do Perfeito Idiota Brasileiro vale mais que o das demais pessoas. É a mãe que fura a fila de carros no colégio dos filhos. É a moça que estaciona em vaga para deficientes ou para idosos no shopping. É o casal que atrasa uma hora num jantar com os amigos. A lei e as regras só valem para os outros. O PIB não aceita restrições. Para ele, só privilégios e prerrogativas. Um direito divino – porque ele é melhor que todos os outros. É um adepto do vale tudo social, do cada um por si e do seja o que Deus quiser. Só tem olhos para o próprio umbigo e os únicos interesses válidos são os seus.
O PIB é o parâmetro de tudo. Quanto mais alguém for diferente dele, mais errado esse alguém estará. Ele tem preconceito contra pretos, pardos, pobres, nordestinos, baixos, gordos, gente do interior, gente que mora longe. E ele é sexista para caramba. Mesma lógica: quem não é da sua tribo, do seu quintal, é torto. E às vezes até quem é da tribo entra na moenda dos seus pré-julgamentos e da sua maledicência. A discriminação também é um jeito de você se tornar externo, e oposto, a um padrão que reconhece em si, mas de que não gosta. É quando o narigudo se insurge contra narizes grandes. O PIB adora isso.
O PIB anda de metrô. Em Paris. Ou em Manhattan. Até em Buenos Aires ele encara. Aqui, nem a pau. Melhor uma hora de trânsito e R$ 25 de estacionamento do que 15 minutos com a galera no vagão. É que o Perfeito Idiota tem um medo bizarro de parecer pobre. E o modo mais direto de não parecer pobre é evitar ambientes em que ele possa ser confundido com um despossuído qualquer. Daí a fobia do PIB por qualquer forma de transporte coletivo.
Outro modo de nunca parecer pobre é pagar caro. O PIB adora pagar caro. Faz questão. Não apenas porque, para ele, caro é sinônimo de bom. Mas, principalmente, porque caro é sinônimo de “cheguei lá” e “eu posso”. O sujeito acha que reclamar dos preços, ou discuti-los, ou pechinchar, ou buscar ofertas, é coisa de pobre. E exibe marcas como penduricalhos numa árvore de natal. É assim que se mostra para os outros. Se pudesse, deixaria as etiquetas presas ao que veste e carrega. O PIB compra para se afirmar. Essa é a sua religião. E ele não se importa em ficar no vermelho – preocupação com ter as contas em dia, afinal é coisa de pobre.
O PIB é cleptomaníaco. Sua obsessão por ter, e sua mania de locupletação material, lhe fazem roubar roupão de hotel e garrafinha de bebida do avião e amostra grátis de perfume em loja de departamento. Ele pega qualquer produto que esteja sendo ofertado numa degustação no supermercado. Mesmo que não goste daquilo. O PIB gosta de pagar caro, mas ama uma boca-livre.
E o PIB detesta ler. Então este texto é inútil, já que dificilmente chegará às mãos de um Perfeito Idiota Brasileiro legítimo, certo? Errado. Qualquer um de nós corre o risco de se comportar assim. O Perfeito Idiota é muito mais um software do que um hardware, muito mais um sistema ético do que um determinado grupo de pessoas.
Um sistema ético que, infelizmente, virou a cara do Brasil. Ele está na atitude da magistrada que bloqueou, no bairro do Humaitá, no Rio, um trecho de calçada em frente à sua casa, para poder manobrar o carro. Ele está no uso descarado dos acostamentos nas estradas. E está, principalmente, na luz amarela do semáforo. No Brasil, ela é um sinal para avançar, que ainda dá tempo – enquanto no Japão, por exemplo, é um sinal para parar, que não dá mais tempo. Nada traduz melhor nossa sanha por avançar sobre o outro, sobre o espaço do outro, sobre o tempo do outro. Parar no amarelo significaria oferecer a sua contribuição individual em nome da coletividade. E isso o PIB prefere morrer antes de fazer.
Na verdade, basta um teste simples para identificar outras atitudes que definem o PIB: liste as coisas que você teria que fazer se saísse do Brasil hoje para morar em Berlim ou em Toronto ou em Sidney. Lavar a própria roupa, arrumar a própria casa. Usar o transporte público. Respeitar a faixa de pedestres, tanto a pé quanto atrás de um volante. Esperar a sua vez. Compreender que as leis são feitas para todos, inclusive para você. Aceitar que todos os cidadãos têm os mesmos direitos e os mesmo deveres – não há cidadãos de primeira classe e excluídos. Não oferecer mimos que possam ser confundidos com propina. Não manter um caixa dois que lhe permita burlar o fisco. Entender que a coisa pública é de todos – e não uma terra de ninguém à sua disposição para fincar o garfo. Ser honesto, ser justo, não atrasar mais do que gostaria que atrasassem com você. Se algum desses códigos sociais lhe parecer alienígena em algum momento, cuidado: você pode estar contaminado pelo vírus do PIB. Reaja, porque enquanto não erradicarmos esse mal nunca vamos ser uma sociedade para valer.
http://www.contioutra.com/perfeito-idiota-brasileiro/