sexta-feira, 26 de agosto de 2011

WikiLeaks mostra mídia brasileira a serviço do Estados Unidos


Por Hugo R C Souza   
http://www.anovademocracia.com.br/80/04a.jpg



Novos documentos vazados pela organização WikiLeaks trazem à tona detalhes e provas da estreita relação do USA com o monopólio dos meios de comunicação no Brasil semicolonial. Um despacho diplomático de 2005, por exemplo, assinado pelo então cônsul de São Paulo, Patrick Dennis Duddy, narra o encontro em Porto Alegre do então embaixador John Danilovich com representantes do grupo RBS, descrito como "o maior grupo regional de comunicação da América Latina", ligado às organizações Globo.

O encontro é descrito como "um almoço 'off the record' [cujo teor da conversa não pode ser divulgado], e uma nota complementar do despacho diz: "Nós temos tradicionalmente tido acesso e relações excelentes com o grupo".

Outro despacho diplomático datado de 2005 descreve um encontro entre Danilovich e Abraham Goldstein, líder judeu de São Paulo, no qual a conversa girou em torno de uma campanha de imprensa pró-sionista no monopólio da imprensa no Brasil que antecedesse a Cúpula América do Sul-Países Árabes daquele ano, no que o jornalão O Estado de S.Paulo se prontificou a ajudar, prometendo uma cobertura "positiva" para Israel.

Os documentos revelados pelo WikiLeaks mostram ainda que nomes proeminentes do monopólio da imprensa são sistematicamente convocados por diplomatas ianques para lhes passar informações sobre a política partidária e o cenário econômico da semicolônia ou para ouvir recomendações.

Um deles é o jornalista William Waack, apresentador de telejornais e de programas de entrevistas das Organizações Globo. Os despachos diplomáticos enviados a Washington pelas representações consulares ianques no Brasil citam três encontros de Waack com emissários da administração do USA. O primeiro deles foi em abril de 2008 (junto com outros jornalistas) com o almirante Philip Cullom, que estava no Brasil para acompanhar exercícios conjuntos entre as marinhas do USA, do Brasil e da Argentina.



O IMPÉRIO REQUISITA O PIAUÍ

O segundo encontro aconteceu em 2009, quando Waack foi chamado para dar informações sobre as conformações das facções partidárias visando o processo eleitoral de 2010. O terceiro foi em 2010, com o atual embaixador ianque, Thomas Shannon, quando o jornalista novamente abasteceu os ianques com informações detalhadas sobre os então candidatos a gerente da semicolônia Brasil.

Outro nome proeminente muito requisitado pelos ianques é do jornalista Carlos Eduardo Lins da Silva, d'A Folha de S.Paulo. Os documentos revelados pelo WikiLeaks dão conta de quatro participações do jornalista (ou "ex-jornalista e consultor político", como é descrito) em reuniões de brasileiros com representantes da administração ianque: um membro do Departamento de Estado, um senador, o cônsul-geral no Brasil e um secretário para assuntos do hemisfério ocidental. Na pauta, o repasse de informações sobre os partidos eleitoreiros no Brasil e sobre a exploração de petróleo na camada pré-sal.

Fernando Rodrigues, repórter especial de política da Folha de S.Paulo, chegou a dar explicações aos ianques sobre o funcionamento do Tribunal de Contas da União.

Outro assunto que veio à tona com documentos revelados pelo WikiLeaks são os interesses do imperialismo ianque no estado brasileiro do Piauí.

Um documento datado de 2 de fevereiro de 2010 mostra que representantes do USA participaram de uma conferência organizada pelo governador do Piauí, Wellington Dias (PT), na capital Teresina, a fim de requisitar a implementação de obras de infra-estrutura que poderiam favorecer a exploração pelos monopólios ianques das imensas riquezas em matérias-primas do segundo estado mais pobre do Nordeste.

A representante do WikiLeaks no Brasil, a jornalista Natália Viana, adiantou que a organização divulgará em breve milhares de documentos inéditos da diplomacia ianque sobre o Brasil produzidos durante o gerenciamento Lula, incluindo alguns que desnudam a estreita relação do USA com o treinamento do aparato repressivo do velho Estado brasileiro. A ver.
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Fonte:

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Aluga-se um amigo


Hoje irei comentar a cerca de uma noticia que recebi, cujo me causou um certo espanto e acho que poderia nos levar a certas reflexões sobre a tão falada pós-modernidade (era atual).

No entanto, e o me deparar com tal noticia "moderninha", lembrei-me do que o velho Marx teria dito em 1848, segue:


"A burguesia desempenhou na história um papel eminentemente revolucionário. Onde quer que tenha conquistado o Poder, a burguesia destruiu as relações feudais, patriarcais e idílicas. Ela despedaçou sem piedade todos os complexos e variados laços que prendiam o homem feudal a seus "superiores naturais", para só deixar subsistir, entre os homens, o laço do frio interesse, as cruéis exigências do "pagamento à vista". Afogou os fervores sagrados do êxtase religioso, do entusiasmo cavalheiresco, do sentimentalismo pequeno-burguês nas águas geladas do cálculo egoísta. Fez da dignidade pessoal um simples valor de troca; substituiu as numerosas liberdades, conquistadas com tanto esforço, pela única e implacável liberdade de comércio. Em uma palavra, em lugar da exploração velada por ilusões religiosas e políticas, a burguesia colocou uma exploração aberta, cínica, direta e brutal. A burguesia despojou de sua auréola todas as atividades até então reputadas veneráveis e encaradas com piedoso respeito. Do médico, do jurista, do sacerdote, do poeta, do sábio fez seus servidores assalariados. A burguesia rasgou o véu do sentimentalismo que envolvia as relações de família e reduziu-as a simples relações monetárias." -  Marx e Engels, 1848, cap I.


A noticia que citei fala sobre 4  jovens (de 21 a 24 anos) – Danilo, Hallan, Pablo e Wesley – que abriram um site oferecendo-se como “Amigos de Aluguel” (o preço varia de R$ 150 a R$ 200 a hora).


Segundo eles próprios o serviço é “totalmente sem fins sexuais”, eles não vão à casa dos clientes (e sim só a lugares públicos), e garantem não ter preconceito quanto à orientação sexual de seus contratantes.

Explicam ainda que o  primeiro contato é por  e-mail (e depois por webcam). 


“Temos de tomar cuidado para no ser contratado por alguém com cara de psicopata”, afirma Hallan Ribeiro, o líder do grupo.

Ainda segundo eles, dizem que estão disponíveis para conversas, compras em supermercados, viagens nacionais e internacionais, esportes, baladas etc.

São moradores de São Paulo, mas atendem em qualquer região do país. Dizem também que os clientes podem ainda receber um álbum de fotos ao final do serviço.

O Hallan diz que  nasceu no interior do Espírito Santo e os demais, em Goiânia (GO). Decidiram criar o serviço porque notaram que em São Paulo existem muitas pessoas solitárias.
 “Algumas pagam garoto de programa só para conversar”, afirma Hallan.

Eles têm sido criticados na internet porque -- alega-se – amizade não se compra e que vão acabar como garotos de programa. Hallan afirma que já esperava que houvesse incompreensão por causa da novidade do serviço.

Detalhe: 22% dos paulistanos afirmam ter sintomas de depressão. (outubro de 2008).


Fico Imaginando se Marx ainda estivesse vivo, o que será que acharia desta noticia?




segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Hoje é a Libia e o seu petróleo, mas e amanha?





Na Líbia tem 2.335 tribos. Destas, cerca de 2.000 mantêm-se fiéis a Kadaffi, ou seja, é um golpe de uma minoria...Um golpe militar patrocinado pelos EUA e a maldita OTAN contra Kadaffi.

Mas a TV nao irá contar isso pra vc e vc sequer entende o que esta ocorrendo na Libia, pois zé porveta nao entente (e nem quer entender) de politica. Só que pare e pense, hj é com a Libia, pois hj estao atras do petróleo, amanha estarão atras de agua doce, e amanha nao sera mais a LIbia e sim nós (o Brasil).

Enquanto o regime policial sírio (que forma uma ditadura hereditária violenta e corrupta da família alauíta el-Assad), e que bem pouco favoreceu toda a população do país, e que persegue os curdos do norte sírio, vem merecendo bem poucos comentários, todos se preocupam com Khadafi, que, bem ou mal, construiu a Líbia moderna. 

 Quando Khadafi tomou o poder, derrubando o rei Idriss I, a Líbia pouco mais era que uma coalizão de tribos de beduínos, espalhadas pelo deserto, sob o comando da confraria senussita, de que o rei era o chefe, e algumas poucas populações urbanas em Trípoli, Bengazi e outras cidades litorâneas. O poder de fato, na Líbia de então, era do truste do petróleo, nas mãos das companhias exploradoras ocidentais. 

Exploradoras em todos os sentidos, aliás. Khadafi criou o Estado líbio e generalizou o bem-estar social. Teve defeitos, como todos os governantes autoritários, e jamais criou qualquer instituição democrática, que não existe, de fato, em NENHUM país deste mundo. tampouco nos paises onde o modelo político é como o deles é, ainda, uma monarquia absoluta, uma monarquia tradicional autoritária, ou, no máximo, a monarquia paternalista, porque a democracia (esta  invenção ocidental) que ainda não se aclimatou em nenhuma parte do Oriente (nem no Ocidente), de modo pleno. Nem mesmo no Líbano, Turquia ou Índia! E a situação da Síria é desesperadora: desde março deste ano, o regime de Bashar al-Assad já matou mais gente que toda a ditadura militar brasileira de 1964, em 25 anos! 

Comemorar a queda de Khadafi é comemorar o triunfo da CIA! Será que a CIA e o governo dos Estados Unidos têm qualquer moral para dar lições de democracia para quem quer que seja? Ou o que eles querem são lucros para as empresas petrolíferas, mercados abertos para forçar a venda de seus produtos e bases militares terrestres, aéreas e navais para suas tropas, em sua geopolítica mundial? Deixemos de ser otários e paremos de tapar o sol com a peneira!

Através destes fatos podemos também perceber o quão validas são as teses de Huntington e Fukuyama, ou seja, o fim da historia e o fim das guerras civilizacionais, pois estas se provam a cada dia mais falsas, comprovando que as teses de marxistas como Hobasbawm e Chomsky, é que as que mas se sustentam atualmente,   ou seja, de que o mundo caminha pra barbarie e que os EUA são a maior ameaça ao mundo atual (teses respectivamente de Hobsbawm e Chomsky).

sábado, 13 de agosto de 2011

Um pouco sobre o Niilismo e a Existencia



Quando colocamos a razão antes da observação, em vez de investigar o mundo, investigamos nossa própria razão, nosso próprio universo subjetivo. Fechamo-nos para o mundo sensível e passamos a buscar não fatos observáveis, mas “razões últimas”, “intenções por detrás do mundo”, e essa postura investigativa nunca chegou a lugar algum. Investigar o mundo natural com uma postura metafísica equivaleria, digamos, a tentar descobrir a geografia dos continentes não navegando ao seu redor e anotando aquilo que se observa, mas trancando-nos num quarto e meditando sobre a razão de ser, sobre a essência e a finalidade das voltinhas caprichosas de cada continente. Com essa abordagem não apenas ficamos sem saber como o mundo é, mas ainda gastamos todas as nossas energias em investigações inúteis sobre coisa nenhuma.

Percebemos o erro de inquirir o mundo racionalmente, através da razão pura, e passamos a investigá-lo com os olhos, por meio de procedimentos empíricos. Investigamos a realidade através da experimentação científica, e chamamos de leis naturais os padrões que conseguimos descobrir a respeito de como o mundo funciona. Como tais padrões independem da ótica de um sujeito, dizemos que são objetivos. Assim, quando colocamos a observação antes da razão, passamos a investigar aquilo que queremos descobrir. Em vez de devanear, saímos pelo mundo afora, contornamos os continentes e anotamos aquilo que observamos, e só usamos a razão para saber como estruturar nossas investigações, não para dispensar a necessidade de barcos. Essa postura nos proporcionou mapas úteis, que servem para orientar quaisquer navegadores, em vez de apenas grossos livros com especulações metafísicas sobre a essência transcendente da areia fina. Terminada a observação empírica, tudo o que a metafísica pode fazer é afirmar que há um mundo ao qual o mapa corresponde.

Como o objetivo das ciências é conhecer o mundo, e não entender os porquês de seu suposto criador, tivemos de reajustar nossa concepção metafísica do mundo, reduzindo-a àquilo que tínhamos diante de nós e que era passível de investigação. Nosso conhecimento tornou-se então a descrição objetiva dos fatos — em vez de uma tentativa de explicá-los como resultado da subjetividade de um ser superior. A partir de então demos à ciência o papel de investigar os fatos, de explorar o mundo, e à metafísica restou apenas o papel de conceituar o mundo a partir desses fatos que observamos, ajustando um ao outro para permitir um conhecimento cada vez mais preciso e coerente. Passamos a usar a razão não para entender ou explicar o mundo, mas para tornar o conhecimento possível, para justificar a validade das ciências como um saber objetivo.

Como se percebe, hoje o campo da metafísica é muito mais modesto, e busca apenas entender o que é a realidade e como se dá a nossa relação com ela. Busca explicar como é possível entender o mundo objetivamente, não a partir da ótica subjetiva do “ser absoluto”, mas da ótica subjetiva do homem, que está contida na própria realidade natural, e não acima dela. Assim sendo, o que hoje denominamos metafísica não é a tentativa de investigar o que existe “além” da física, mas além da experiência imediata. Ela busca distinguir aquilo que existe em si mesmo — e que existiria mesmo se não existíssemos — daquilo que existe apenas em nossas mentes. Com essa abordagem, já não tentamos justificar o mundo, mas o conhecimento. Em vez de distinguir entre ser e essência, entre dentro e fora da física, passamos a distinguir entre subjetivo e objetivo, entre dentro e fora do homem. Abandonamos a ideia de que haveria uma “essência transcendental” inefável, pois percebemos que essa essência era apenas nossa subjetividade projetada no mundo exterior.

Esse movimento de naturalização tem profundas implicações a respeito de como pensamos o mundo e o lugar do homem na existência — e, como essa mudança de ótica é relativamente recente, ainda carregamos muitos preconceitos metafísicos herdados da metafísica tradicional essencialista. A relação do niilismo com a metafísica, no caso, seria justamente a tentativa de entender as implicações de reduzir o homem ao natural. O niilismo existencial nega que haja sentido em buscar um sentido subjetivo no mundo objetivo, exterior ao homem. Ou seja, a investigação da realidade natural nunca poderá envolver questões subjetivas, pois não podemos investigá-las por meio da observação de fatos naturais.

Para levar tais questões subjetivas adiante, investigando, por exemplo, a “razão de ser do homem”, precisaremos naturalizar essa questão, isto é, abordá-la dentro do contexto de um mundo natural regido por leis físicas impessoais. O problema é que, ao naturalizar a subjetividade, a questão mostra-se algo tão despropositado quanto procurar uma fundamentação física para o Natal ser em dezembro. Entender nossa subjetividade como resultado de um processo natural torna ilegítima a maioria das questões que levantamos sobre o mundo em si mesmo. Assim, quando o âmbito da reflexão metafísica fica amarrado à ciência, à experimentação, aos fatos naturais, o resultado é que deixam de ser admissíveis as investigações metafísicas que não digam respeito àquilo que foi observado no mundo natural. Afirmar que o homem não pode procurar para si mesmo um sentido que não seja baseado em fatos naturais equivale, é claro, a destruir a ideia de sentido pela raiz — ficando as investigações sobre o sentido da vida restritas a fatos naturais, como sobrevivência da espécie e perpetuação genética, por exemplo.

Como se nota, o niilismo faz o incômodo papel de “carrasco das investigações sem sentido”. Não se trata realmente de uma ideologia, de uma ótica com qualquer objetivo “positivo”, mas de uma postura de reflexão analítica e retificadora. O niilismo não busca explicar ou guiar o homem, mas situá-lo imparcialmente dentro daquilo que se conhece por meio da ciência. Nessa ótica, como o fim da metafísica tradicional equivale a uma ruptura radical com a teologia, podemos dizer que o niilismo faz o papel de coveiro do sentido: busca sepultar todas as questões levantadas com base na suposição de que haveria uma “razão” para tudo o que existe. O além desaparece, restando apenas o aqui.

Nessa abordagem, aquilo que denominamos vazio da existência seria precisamente o vácuo criado por essa drástica redução de nossa concepção metafísica do mundo. Pensávamos que o que existia dentro de nós, nossa subjetividade, também existia fora de nós, refletindo os “princípios últimos” da realidade, algo como um “espírito do mundo”. Agora, reduzindo o mundo à física, aos fenômenos naturais, essa essência passou a equivaler às leis físicas — algo que julgávamos ser apenas uma pequena parcela da realidade. Quando passamos a ver o mundo como algo natural e objetivo, tornamo-nos também algo natural e objetivo, e isso nos decepcionou grandemente — sendo o papel do niilismo manter o homem decepcionado até que decida abandonar suas criancices existenciais.

Entendendo que as leis físicas são, por assim dizer, a “essência” da realidade, a observação mais interessante a ser feita é a seguinte. A existência do homem é uma lei física? Não. Há algo no mundo natural que torne a existência do homem necessária como a gravidade? Não. Segue-se que não fazemos parte do mundo natural enquanto homens, mas enquanto matéria. Como não há leis naturais subjetivas, nossa subjetividade não tem essência. Em vez de necessária, a existência do homem é contingente: somos um acidente. A naturalização da realidade implodiu a subjetividade, e o homem foi reduzido a nada.

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Feitas essas observações, vemos que o niilismo nos coloca numa situação bastante estranha, como se fôssemos visitantes no mundo, hóspedes temporários da matéria — e é exatamente esse o caso. Somos um fenômeno natural, e nossa ideia aqui é nos revisarmos por completo enquanto tais, passando a limpo nossa compreensão da realidade.

Até este ponto, ocupamo-nos em explicar que o vazio da existência decorre de reconhecermos o caráter não-humano do mundo em si. Daqui em diante, nos dedicaremos a delinear com maior clareza o que seria esse mundo não-humano, distinguindo-o de nosso universo subjetivo. Nossa primeira observação será a respeito da busca pelo conhecimento. Isso foge um ponto do assunto, mas é importante. Depois começaremos a delinear a distinção entre objetivo e subjetivo em detalhes, e daremos alguns exemplos de “aplicação” do niilismo enquanto procedimento analítico.

Não há dúvida de que compreender o mundo sempre foi nossa maior ambição filosófica. Porém, exceto pela curiosidade, no processo de entendê-lo não há qualquer ponto de partida seguro, e isso sempre nos incomodou. Foram propostas muitas soluções para o problema da incerteza em nosso conhecimento, mas todas elas se mostraram inconclusivas — ainda hoje não temos qualquer certeza. O que dificilmente nos ocorre, entretanto, é questionar o ponto de chegada: as certezas. Se não temos qualquer ponto de partida seguro, por que achamos seguro dizer que a certeza é o ponto de chegada? Ora, certezas são o objetivo de quem busca segurança, não conhecimento. O problema da incerteza nasce simplesmente de nossa angústia — não se trata de algo a ser solucionado por meio da investigação, mas por meio de calmantes.

Perceba-se, então, que não faz sentido procurar certezas no mundo, pois o próprio conceito de certeza foi inventado por nós mesmos — e não com o fim de melhor conhecer o mundo, mas de nos sentirmos mais seguros. Repudiamos certezas porque queremos entender o mundo, não justificar nossos rodeios ansiolíticos. A crença na necessidade de certezas desvirtua nossa compreensão porque, o aceitarmos a noção de certeza, passamos a investigar a realidade física em busca dessas mesmas certezas, num processo obviamente circular. Esse objetivo de alcançar “verdades absolutas” nunca foi demonstrado como válido, apenas suposto como desejável por filósofos medievais inspirados pela matemática.

Nessas circunstâncias, se não podemos partir do pressuposto de que devemos buscar certezas, já não temos ponto de partida nem de chegada, o que é ótimo. Livres desses preconceitos, podemos começar a construir uma visão imparcial, que não está comprometida com a “paz na alma” como critério da verdade.

Apenas agora, saindo desse círculo, abandonando todas as expectativas, nosso ponto de partida passa ser observar o que temos diante de nós. Abrimos os olhos, vemos que há um mundo, e que estamos nele — mais nada. Essa é a postura mais básica e neutra que podemos adotar. Partir de posturas complicadas e confusas torna tudo complexo e confuso, então partimos de nossa existência no mundo, que é a coisa mais elementar e imediata à qual temos acesso. Claro, não temos “fé” nisso, não pensamos que se trate de uma verdade incontestável. Talvez estejamos errados ao pensar que existimos. Talvez existir seja uma ilusão. Há infinitos talvezes teóricos, mas queremos que também nossos motivos para a dúvida sejam baseados em fatos, não em suposições metafísicas inócuas.

Sendo que não possuímos motivos razoáveis para duvidar de nossa existência, não duvidamos. Pensamos que existimos porque estamos aqui, e só. Essa não é uma questão que possamos resolver por meio de meditações metafísicas — não temos como investigá-la. O que nos leva a aceitar a existência do mundo como um fato é o fato de o termos diante de nós. Isso é tudo o que podemos dizer. Sabemos que existir é um absurdo, mas é um fato absurdo, não apenas uma especulação.

Desse modo, existir não se trata de uma crença metafísica: trata-se simplesmente de abrirmos os olhos e nos vermos acontecer neste algo que chamamos mundo. Nossa postura seria metafísica apenas se abríssemos os olhos acreditando que devemos buscar certezas ou razões últimas. Em vez disso, abrimo-los tão somente, e é isso o que vemos. Se existir é uma ilusão, é diante da ilusão que estamos, e queremos conhecê-la, seja ela o que for. Essa incerteza básica sobre o existir é algo que simplesmente temos de aceitar, do contrário viciaremos nossa investigação logo de início, passando a andar em círculos à moda dos teólogos.
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Autor: Cancian
Adaptação: Marivalton Rissatto
Obs: Créditos ao autor.

Um pouco sobre o Niilismo e a Metafisica



Aquilo que se preocupa em buscar o que está “além” da realidade não é a ciência, mas a metafísica, que significa literalmente depois da física. Mas o que está além da física? Ora, a resposta é óbvia: nada. Muito menos razões. Num mundo onde tudo é físico, só aquilo que inventamos pode ser metafísico, ao menos se entendermos por metafísica a clássica investigação de “razões últimas”. Para além do âmbito do realismo científico, a metafísica não tem função; é absurdo que tenha função. Na busca pelo conhecimento objetivo, o bastão foi passado para a ciência. Está morta a metafísica que investiga o mundo “profundamente”, por meio da razão pura. Isso nunca levou a nada, pois tentamos descobrir a realidade não olhando para o mundo, mas para um espelho. As respostas metafísicas para a existência parecem-nos interessantes porque, obviamente, partem do conveniente pressuposto de que a razão humana é capaz de substituir a experimentação e acessar uma suposta “essência do ser” por meio de uma intuição mágica, como que descobrindo o mundo por controle remoto. Parece tentador que possamos explicar a realidade desse modo, mas a metafísica é um tiro no escuro, algo tão inútil quanto usar a imaginação para prever o futuro.

Vejamos a questão do seguinte modo: a metafísica nasceu numa época de ignorância, em que os homens sequer sabiam da existência de bactérias. Sequer lhes passava pela cabeça que nossos cérebros eram feitos de neurônios. Mesmo assim, queriam explicar racionalmente a decomposição e o pensamento. Como não tinham microscópios para ver a realidade com precisão, constatando assim a existência de micro-organismos decompositores, limitavam-se a devanear teorias metafísicas, especulando sobre “realidades ocultas” que nos apodreciam em segredo, e é claro que não tinham a menor ideia do que estavam falando. Ao ver um corpo em decomposição, por exemplo, imaginavam que isso talvez se devesse a alguma ordem natural das coisas que nos impunha a decomposição como um “sentido existencial”. Assim, por ignorar que o que nos apodrece são as bactérias, supuseram que isso seria devido à misteriosa “essência decompositora do ser”. Esse tipo de raciocínio delirante, constituído por uma rigorosa lógica tapa-buracos, é o cerne da metafísica. Ela aborda todas as questões da existência com esse mesmo grau de autismo.

Nessa abordagem, em vez de investigado, o mundo deve ser pensado. Em vez de observar fatos, devemos buscar explicações de razão pura, devaneando sobre alguma essência sobrenatural que determina fatos naturais. Claro que, se o ser fosse racional em si mesmo, algo como uma equação matemática, a verdade seria algo abstrato que transcende os próprios fatos, isto é, a “essência do ser” seria constituída de princípios lógicos. Mas de onde tiramos a ideia de que o ser é racional? E o que é isso de “essência”? Não se sabe. O fato é que essa metafísica delirante nunca teria nascido se houvéssemos dado aos gregos um microscópio e uma tabela periódica.

Vistas desse modo, as mais profundas investigações metafísicas são pura e simples perda de tempo, pois estão em busca de algo que simplesmente não está lá — e a grande maioria das questões da existência, das questões que consideramos mais importantes, são levantadas não pela física, mas pela metafísica, pelo mais vergonhoso blablablá inquisitivo. Se tais observações parecem fortes, isso ocorre porque, mesmo hoje, nossa visão moderna da realidade ainda esconde muitos preconceitos metafísicos.

Pensemos, por exemplo, na razão de ser da vida. De onde tiramos essa ideia maluca? Certamente não da experiência, certamente não do mundo que temos diante de nossos olhos. Essa é uma questão metafísica despropositada, pois se trata de algo que em nenhuma circunstância poderia ser solucionado pela observação do mundo físico, e isso pode ser ilustrado pelo simples fato de que a observação do mundo físico feita pela biologia moderna, apesar de explicar perfeitamente bem como a vida funciona, não é aceita como resposta para essa questão. Senão, vejamos: observamos um espermatozoide e um óvulo fundirem-se; vemos as células multiplicando-se; vemos todas as etapas envolvidas na formação de outro organismo; vemos a vida acontecer bem diante de nós; tudo está perfeitamente claro. Mesmo assim, continuamos insistindo na crença de que há algo “por detrás” dessa realidade, um algo que é mais importante que a própria realidade. Esse algo, obviamente, são nossas crendices metafísicas. A ciência não pode responder a questão da “razão de ser” da vida porque esse modo de conceber a vida não corresponde à realidade. Seria o mesmo que pedir que a ciência respondesse onde ficam os dragões alados que vimos após consumir alucinógenos.

Para ser no mínimo razoáveis, temos de admitir que nunca tivemos motivos legítimos para pensar que a vida tem uma “razão de ser”, pois nada em nossa experiência no mundo nos sugere essa pergunta. Que tipo de fenômeno físico poderia nos ter insinuado essa questão? Olhamos para uma flor e pensamos: ó, que curioso, há nesse vaso uma flor! Por que não há na flor um vaso? Por que a flor não tem dentes? Que mistério! Isso só pode ser porque ela tem uma “razão de ser” — a flor desabrochou para cumprir um sentido transcendental! Sementes e pólen nada têm a ver com isso: trata-se de algo mais profundo, muito superior ao mundo material! Então propomos a nós mesmos o desafio: vou descobrir que razão é essa! Passados alguns anos, voltamos da faculdade de teologia e respondemos que isso só Deus sabe.

Nesse tipo de investigação, saímos desesperadamente em busca da resposta para uma pergunta sem sentido, e ainda nos espantamos por nunca encontrá-la. Claro que essa pergunta só poderia ser respondida se o mundo fosse algo como um playground de humanos, feito à nossa imagem e semelhança por alguma divindade entediada. Porém, como o mundo não se comporta segundo nossas expectativas infantis, em vez de admitir o óbvio, de aceitar que real é aquilo que está bem diante de nossos olhos, achamos mais sensato inventar uma segunda existência misteriosa que carrega a “essência oculta” da nossa — um mundo que só podemos imaginar como uma imensa biblioteca cheia de pergaminhos empoeirados nos quais ficam anotadas as “razões de ser” de tudo o que há no mundo em que estamos.

Portanto, para transformar uma crença absurda qualquer numa gloriosa “investigação metafísica”, basta colocar no fim dela um ponto de interrogação: teremos diante de nós mais um “mistério insondável”, mais uma prova da profunda ignorância do homem em relação ao mundo em que vive. Contudo, sejamos francos: não fomos nós próprios que, sem nenhum motivo respeitável, inventamos que a flor tem uma “razão de ser”, que precisa ter uma razão? Transformamos esse raciocínio circular em algo tão grandioso que, ao investigá-lo, temos a ilusão de estar andando em linha reta. Perdemo-nos em devaneios, e chamamos isso de “meditações transcendentais”, de “busca pelo sentido íntimo do ser”, coisa que não passa do homem correndo em torno do próprio rabo em busca de razões que insuflem sua vaidade. Diante desse algo oculto que nos torna tão monstruosamente ingênuos, a questão do mistério do mundo parece um assunto de piolhos.

Recobremos a sensatez. Se prestarmos alguma atenção, veremos que a verdadeira razão de ser da flor não é realmente uma razão, mas um fato: o fato de ela ter germinado e desabrochado; isso é tudo. O resto são questões metafísicas sem sentido, meros disparates interrogativos que levam nossas investigações para um mundo imaginário que nada tem a ver com aquilo que estamos tentando entender.

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Já deve estar bastante claro por que a postura niilista é incômoda, então prossigamos ao próximo tópico. Como o niilismo está ligado a uma mudança em nossa concepção metafísica da existência, convém esboçarmos o que é a metafísica atualmente, e principalmente o que ela era. A metafísica que criticamos aqui é a chamada metafísica tradicional, a qual parte de pressupostos antropocêntricos, lança-se em investigações sem pé nem cabeça, buscando algo que não existe para explicar o que existe. A metafísica moderna, por outro lado, busca apenas delinear uma visão coerente do que é a realidade, deixando à ciência o papel de descobrir o que existe. Em vez de sonhar, ela pensa a partir dos fatos que conhecemos, mas sem fazer extrapolações aberrantes. O contraste entre ambas nos ajudará a entender melhor o contexto do niilismo.

A metafísica é uma área da filosofia que busca investigar os aspectos mais fundamentais da existência por meio da razão. Ela trata daquilo que não nos é imediatamente acessível através dos sentidos, que não pode ser investigado direta e experimentalmente, isto é, através da ciência. Faz perguntas como “que é existir?”, “que é a razão?”, “que é a realidade?” etc. A metafísica faz perguntas tão básicas que a ciência não pode respondê-las diretamente, e a própria prática da ciência pressupõe muitos assuntos que apenas a metafísica investiga. A ciência somente observa fatos e os registra metodicamente — ela investiga com os olhos; a metafísica, com a razão.

Quando afirmamos que “todos os seres vivos nascem, crescem, reproduzem-se e morrem”, fazemos uma afirmação científica, que pode ser observada. Quando afirmamos que “a vida não tem sentido”, fazemos uma afirmação metafísica, pois se trata de algo que concluímos a partir de um processo de abstração intelectual, e abstrações não podem ser observadas. Portanto, quando conceituamos a realidade a partir de fatos, estamos fazendo filosofia, não ciência. A ciência não pensa, mas precisamos pensar para fazer ciência coerentemente, e esse é o papel da reflexão metafísica no contexto moderno: orientar nossas investigações. Em grande parte, a metafísica moderna tornou-se um meio de evitar os erros ingênuos da metafísica tradicional.

Como vimos acima, a metafísica tradicional é essencialista, ou seja, supõe que tudo o que existe possui uma “essência” que faz com que seja aquilo que é. O papel da reflexão metafísica seria, nessa ótica, investigar racionalmente tal “essência”, já que os fatos observados não seriam mais que sua manifestação. Já foi dito que essa essência é fogo, água, números, razões, deuses etc.; hoje diz-se que essa essência é tolice. Tal metafísica não se preocupa em entender o mundo em que estamos: busca entender um mundo transcendental de essências imaginárias do qual o nosso seria o resultado. Suas investigações pressupõem uma ordem das coisas que é extrínseca ao ser, ou seja, sobrenatural. Ela busca descobrir uma essência que também é uma explicação: a razão pela qual o mundo existe. Esse tipo de questionamento, obviamente, só seria compatível com um mundo que tivesse uma “essência transcendente”, coisa que remete à ideia de uma “subjetividade por detrás do mundo”. Por isso dizemos que a metafísica tradicional possui uma orientação teológica, pois confere atributos divinos à existência. Assim, esse tipo de investigação metafísica parece filosofia, mas na verdade é teologia.

A metafísica moderna, por outro lado, investiga a realidade não numa ótica transcendente, mas imanente. Em vez de especular sobre o que há “por detrás” do horizonte da existência, ela busca entender o que é a existência que está sob nossos pés, não sobre nossos travesseiros. Ou seja, trata a questão da “essência do ser” não como algo que fica fora do próprio ser, remetendo a “razões últimas”, mas como uma ordem das coisas que é intrínseca ao ser, ou seja, natural. A partir dos fatos que conhecemos, buscamos entender o aqui em função do aqui, não de um suposto “além”.

A própria noção científica que temos da realidade está baseada em suposições metafísicas — basta pensarmos no objetivismo e no naturalismo. O objetivismo afirma que, fora de nossas cabeças, existe uma realidade comum a todos. O naturalismo afirma que o mundo funciona em seus próprios termos, que não possui qualquer essência sobrenatural que o determina de fora para dentro. Pode parecer estranho que a ciência moderna parta de suposições metafísicas, mas elas são necessárias para que não caiamos no relativismo, para que tenhamos um ponto de referência sensato sobre o que é o mundo. Para investigar o mundo cientificamente, temos de supor o que o mundo é, e isso é uma suposição metafísica. Ainda mais, temos de conceituar o que é conhecimento, diferenciar o conhecimento subjetivo do objetivo, definir o que é uma prova, e por que provas são válidas, assim como por quais critérios essa validade é estabelecida, o que é tarefa de outra área exterior à ciência, a epistemologia.

Sem investigar tais questões com seriedade, não saberíamos como interpretar os resultados de nossas observações ou como estruturar experimentos científicos a fim de conhecer a realidade. A função de metafísica moderna, nessa ótica, seria justamente estabelecer um fundamento teórico para nortear a investigação da realidade sensível feita pelas ciências.

Um ponto de vista que rejeitasse indistintamente a metafísica não nos permitiria fazer quaisquer suposições a respeito da realidade que estivessem além da experiência imediata. Não poderíamos, por exemplo, justificar a suposição de que existe de uma realidade objetiva, e com isso cairíamos no relativismo, talvez até no solipsismo. Não havendo nada objetivo, toda a realidade se resumiria a uma construção social — inclusive a matéria, a gravidade, a eletricidade. A criação de um mapa-múndi seria algo tão arbitrário quanto um romance, pois tudo não passaria de uma ficção subjetiva. O relativismo faz bem ao enfatizar nossas limitações, mas levá-lo a sério seria tão despropositado quanto afirmar que uma publicação científica é arbitrária como uma revista de quadrinhos.

Não há, portanto, qualquer sentido pejorativo em dizer que fazemos uma afirmação metafísica ao supor que o mundo é natural e objetivo. Trata-se de algo metafísico apenas porque falamos a respeito da constituição básica do mundo, de algo teórico de que precisamos para alicerçar as ciências. Claro que as descobertas da ciência respaldam perfeitamente tais suposições, mas nem por isso elas deixam de ser metafísicas, pois são algo que nunca poderá ser demonstrado diretamente através da realidade sensível, mas apenas conceituado, pensado.

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As suposições metafísicas a respeito da realidade são importantes para nos nortear, para nos dar uma visão global da realidade, mas, como se trata de um terreno especulativo, devemos ser muito cuidadosos quanto ao que supomos sobre o mundo em si mesmo. A metafísica pensa no escuro, e pode facilmente perder-se em devaneios. Se supusermos, por exemplo, que o mundo é “racional em si”, passaremos a pensar que nele tudo tem uma “razão de ser”, que há um motivo inteligível que explica, digamos, por que a gravidade atrai os corpos em vez de os repelir. Que tipo de razão seria essa? Não se sabe, mas corpos caindo a 9,8 m/s ao quadrado seriam o resultado dessa “razão”. Mas por que essa essência não faz com que os corpos caiam a 15 m/s ao cubo? Qual é o motivo disso? Não sabemos onde procurar tais razões, mas conforta-nos pensar que o mundo é racional, e isso é tudo de que precisamos para nos convencermos. O fato é que não há metafísica alguma na gravidade. Sabemos que a gravidade atrai os corpos porque vimos isso acontecer. Trata-se de uma afirmação científica, empírica, não de uma racionalização abstrata.

Argumentos puramente racionais, no fim das contas, só refletem o modo como usamos as palavras. Se não pudermos verificá-los, eles não dizem nada — assim como não diz nada o argumento da “causa primeira”. Quando perguntamos por que “motivo” a gravidade é assim, estamos pressupondo que ela poderia ser de outra forma, e que é como é por um motivo que pode ser entendido. Isso pressupõe que as leis naturais são racionais, implicando que a razão, de algum modo, está na essência da realidade. Mas a gravidade não foi pensada, foi observada. Não é uma teoria, mas um fato — e não precisamos pensar quando podemos ver. Portanto, aqui a metafísica não tem função.

Levantar questionamentos metafísicos sobre fatos naturais equivale a humanizar a existência, supondo que haja uma “intenção racional” por detrás do que existe, como se o mundo houvesse sido projetado por seres humanos ou supra-humanos. Mas de onde tiramos a ideia de que o ser é racional em si mesmo? A explicação mais plausível é esta: de nós mesmos, pois isso nunca foi demonstrado por qualquer observação da realidade. Novamente vemos que essa busca pelo “sentido oculto da realidade” é apenas teologia disfarçada. Para ilustrar, percebamos que perguntar o “porquê” do mundo natural seria o mesmo que perguntar o porquê de o Sol brilhar. Claro que, ao fazer esse tipo de pergunta, colocamo-nos no lugar do Sol, pensando nas razões pelas quais brilharíamos se fôssemos essa estrela. Partindo disso, respondemos, por exemplo, que o Sol brilha “para aquecer a Terra”, e é claro que essa suposição não pode ser demonstrada, tampouco condiz minimamente com as descobertas da Astronomia. Essa espécie de resposta é claramente antropocêntrica, pois busca fora do homem, na realidade em si mesma, algo que só existe em nosso universo subjetivo: intencionalidade.

As ciências, ao chegarem aos mesmos resultados a partir de observadores independentes, podem justificar a suposição de que existe uma realidade objetiva, independente de nós. Como nunca constatamos mudanças nas leis que regem os fenômenos, também podemos justificar a suposição de que o mundo é natural. Mas como podemos sustentar que a razão existe fora do homem? Só estaríamos autorizados a pensar na existência como possuidora de uma “razão de ser” se esta houvesse sido criada por uma força sobrenatural inteligente, se houvesse muitos indícios disso nos fatos que observamos, mas não há nenhum.

Esse tipo de raciocínio reverso, que procura intencionalidade nas coisas, só é admissível em questões subjetivas. Por exemplo, assim como prédios possuem alicerces, colunas de concreto, reforços de aço, elevadores, janelas, andares, portas, e assim como cada um desses elementos possui uma estrutura e uma finalidade, se o universo houvesse sido projetado, também nele haveria uma “razão de ser” inteligível que constitui sua essência e que explica por que cada coisa é como é, e não de outro modo. A essência do mundo em si mesmo, no caso, seria equivalente à intenção do engenheiro que o projetou — e só nessa ótica esse tipo de investigação metafísica faria sentido, mas precisaríamos pressupor que ele teve um criador. Isso nos permite entender melhor por que a metafísica tradicional possui uma orientação teológica: ela faz questionamentos que só são admissíveis partindo-se do pressuposto de que o mundo foi criado inteligentemente para cumprir uma finalidade. Por isso, no fim das contas, a metafísica tradicional resume-se à tentativa de fazer engenharia reversa no projeto divino.
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Autor: Cancian
Adaptação: Marivalton Rissatto
OBS:Créditos ao autor.

Um pouco sobre o Niilismo

O niilismo pode ser definido como a implosão da subjetividade. Alternativamente, e sendo um pouco mais claros, podemos defini-lo como uma descrença em qualquer fundamentação metafísica para a existência humana. Não se trata, entretanto, de algo difícil de ser definido, mas de ser apreendido. Por ser uma noção bastante ampla e abstrata, existe muita confusão em torno dela. Vejamos alguns dos principais motivos disso. Primeiro, o niilismo é vago em si mesmo, pois vem de nihil, que significa nada. A palavra niilismo, que poderia ser traduzida como “nadismo”, de imediato, não nos dá qualquer ideia do que se trata. Segundo, o niilismo não possui qualquer conteúdo positivo. Por se tratar de uma postura negativa, só conseguiremos entendê-la depois que tivermos consciência do que ela nega, e por isso a compreensão do niilismo envolve muitos outros conceitos; ele só se tornará visível depois que esboçarmos seu contexto. Por fim, o niilismo também não recebeu, historicamente, um emprego consistente, sendo que cada pensador ou movimento o interpretou de modo bastante particular, quase sempre com um pano de fundo ideológico, na tentativa míope de justificar um niilismo ativo e militante.

Em geral, vemos o niilismo associado a outras ideias, denotando seu vazio inerente. Por exemplo, niilismo político seria mais ou menos equivalente ao anarquismo, repudiando a crença de que este ou aquele sistema político nos conduziria ao progresso, o qual não passaria de um sonho mentiroso. O niilismo moral equivaleria à negação da existência de referenciais morais objetivos, ou seja, de valores bons ou maus em si mesmos. O niilismo epistemológico, por sua vez, seria a afirmação de que nada pode ser conhecido ou comunicado. Portanto, vemos que associar qualquer noção ao niilismo não é exatamente um elogio, mas algo como colocar ao seu lado uma placa dizendo: aqui não há nada — principalmente nada do que se acredita haver.

O niilismo, todavia, não é só um termo que justapomos a qualquer ideia que nos desagrade, a fim de desmerecê-la. Seu poder de apontar o vazio das coisas não pode ser usado como uma arma, pois, quando se dispara o tiro de nada, automaticamente deixa de existir a arma, e a coisa toda perde o sentido. O niilismo, sendo um processo radical de crítica, não pode ser usado parcialmente. Não podemos, por exemplo, usar o niilismo moral para refutar valores específicos, com os quais não simpatizamos, imaginando que os nossos próprios valores sobreviveriam à crítica. Quando afirmamos que a moral não existe, isso implica que não existem quaisquer valores, sejam os nossos valores, sejam os de nossos oponentes. Com o niilismo moral, toda a moral é reduzida a nada, inclusive a nossa. A redução da moral a nada, como vemos, está respaldada não na gramática, mas na suposição de que a moral é vazia em si mesma, de que ela não tem fundamentos reais e objetivos. Não se trata de simpatizarmos ou não com a moral, mas da constatação segundo a qual ela é um sonho, uma fantasmagoria inventada por nós próprios, não sendo leis morais, portanto, mais relevantes que leis de trânsito.

Nós, entretanto, nos ocuparemos principalmente do niilismo existencial, ou seja, a postura segundo a qual a existência, em si mesma, não tem qualquer fundamento, valor, sentido ou finalidade. Segundo o niilismo existencial, tudo o que existe carece de propósito, inclusive a vida. Todas as ações, todos os sentimentos, todos os fatos são vazios em si mesmos, desprovidos de qualquer significado. Nessa ótica, viver é algo tão sem sentido quanto morrer, e estamos aqui pelo mesmo motivo que as pedras: nenhum. Essa parece ser a categoria mais fundamental de niilismo, em relação à qual os demais tipos tomam o aspecto de casos particulares. Os niilismos moral e político, por exemplo, podem claramente ser deduzidos do niilismo existencial — pois, se a própria existência não tem valor, isso implica que nada tem valor, inclusive valores morais, inclusive o progresso.

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O único modo de compreender o niilismo existencial é através da reflexão. O vazio da existência nunca poderia ser demonstrado através da prática, ou apreendido por meio da experiência imediata. Se, por exemplo, reduzíssemos nosso planeta a nada com bomba nuclear, isso não demonstraria coisa alguma. A visão desse planeta despedaçado também não provaria nada. Tal postura destrutiva prática faz pouco sentido, pois equivale a tentar refutar um livro queimando-o. O niilismo existencial se demonstra quando reduzimos o homem a nada, e para isso basta possuir algum talento intelectual aliado à honestidade, pois o esvaziamento da existência é a mera consequência de a entendermos. Não precisamos degolar a humanidade inteira para provar que a vida carece de sentido.

Para reduzir o homem a nada, e compreender que isso demonstra o niilismo existencial, temos de apreender o vazio objetivo da existência — sendo óbvio que, na condição de sujeitos, só podemos fazê-lo subjetivamente. O problema é que, no processo demonstrar que a existência é vazia, somos o próprio vazio que estamos tentando apontar — tentamos explicar que nós próprios não temos explicação. Parece paradoxal, mas não é. Bastará que consigamos entender nós próprios como um fato, e o niilismo se tornará praticamente uma obviedade. Só então perceberemos que o niilismo não é, como a princípio pode parecer, uma postura extremada, envolvendo algum tipo de revolta, mas apenas uma visão honesta e sensata da realidade — uma visão tornada possível em grande parte devido às descobertas científicas modernas. Com algumas definições e explicações simples, podemos chegar a uma noção razoável da ótica apresentada pelo niilismo existencial. Como o argumento é um pouco longo, vamos por partes. Façamos algumas observações preliminares sobre por que o niilismo nos parece algo tão incômodo.

Muitos, por preconceito, têm medo do “vazio da existência”, mas esse medo, em si mesmo, é algo completamente sem sentido, pois equivale a temer aquilo que não existe; o vazio não é uma ameaça positiva. Senão, vejamos: Não existe vida em Vênus. Alguém se sente aterrorizado diante dessa afirmação? Dificilmente. Não existem bancos em Marte. Alguém empalidece diante disso? Também não. Suponhamos, entretanto, que durante todas as nossas vidas houvéssemos trabalhado arduamente, acreditando que todo o nosso esforço seria convertido em dinheiro num banco em Marte. Agora sim nós nos sentiríamos ameaçados pela afirmação de que nesse planeta não há, nunca houve banco algum, pois vivíamos em função disso, acreditávamos nesse suposto dinheiro marciano como aquilo que dava sentido às nossas vidas. Portanto, o que nos aterroriza não é o vazio da existência, ou o vazio de bancos interplanetários — o que nos enche de medo é a possibilidade de descobrir que estávamos completamente equivocados em nossas crenças a respeito da realidade. Seria esmagadora a consciência de havermos dado grande importância, de havermos dedicado nossas vidas inteiras a algo que simplesmente não existe. É por isso que estremecemos diante da afirmação de que a existência não tem sentido, embora essa afirmação seja tão segura quanto a de que não há dinheiro noutros planetas do sistema solar.

Resistimos ao niilismo não porque ele seja falso, mas porque reorganizar nossa visão da realidade seria muito trabalhoso. Então, se colocarmos nossos interesses pessoais de lado, veremos que o que nos inquieta no niilismo é o fato de que ele nos confronta duramente com nossa própria ingenuidade, com o fato de termos nos deixado enganar tão grandiosamente que nossas vidas passaram a depender de mentiras, de suposições imaginárias. Portanto, percebamos que, quando o niilismo aponta essas mentiras, ele não está destruindo a realidade, e sim nossas ilusões. Nessa ótica, o niilismo nada mais é que um exercício de honestidade e imparcialidade, e apenas esvazia a realidade das ficções que nunca existiram de fato. Essa honestidade pode ser dolorosa, mas é um sinal de maturidade. Se a existência, despida de ilusões, nos parece vazia, saibamos ao menos admitir que a culpa é nossa por termos nos enchido delas. Se gostamos de nos enganar, tudo bem. Porém, se nosso interesse for nos tornarmos capazes de lidar com a realidade como adultos, sempre será preferível aceitar a existência tal qual é em si mesma, ainda que isso signifique abrir mão de muitas de nossas crenças mais arraigadas. É preferível viver num mundo sem sentido a acreditar num sentido falso para o mundo, que aponta para lugar nenhum.

Como vemos, a preocupação essencial do niilismo não é descobrir a verdade, mas apontar as mentiras e reconhecer as limitações. Descrever os fatos é o papel da ciência. O niilismo apenas consiste na disciplina de sermos honestos diante desses fatos que observamos, entender e aceitar suas implicações. Nesse sentido, uma das áreas mais afetadas pelo niilismo são as “grandes questões” da existência. Isso porque as respostas para tais questões são, em geral, muito mais óbvias do que pensamos — e muitas vezes inclusive sabemos quais são, mas preferimos continuar acusando a ciência de ser “cega e limitada” para justificar nossos preconceitos.

Afirmamos que tais assuntos são demasiado “profundos” apenas como pretexto para tratá-los superficialmente; dizemos que são “mistérios”, “impossíveis de responder”, apenas porque temos medo das respostas. Outras vezes deixamos essas questões de lado, não para proteger nossas ilusões, mas porque pensamos que investigá-las nos conduziria à loucura. Muito pelo contrário, isso nos conduziria apenas à lucidez, nos permitiria viver com os pés no chão. Mas o que é o chão? Ora, aquilo que está sob nossos pés. O que é o mundo? Ora, é aquilo que temos diante de nossos olhos. O que é o ser? Ora, é aquilo que existe. Em grande parte, o niilismo consiste na rara capacidade ver o óbvio.

Perguntemo-nos, por exemplo, que é o homem? Ora, somos aquilo que parecemos ser: máquinas. Basta consultar qualquer livro de anatomia básica. Não há nada “por detrás”. Esse “por detrás” não passa de uma fantasia. Foi inventado por nós numa tentativa infantil de humanizar a existência. Não obstante, apesar de sabermos perfeitamente bem o que é o homem, ainda assim acreditamos que há na equação um misterioso “algo mais”. Continuamos nos enganando com a noção de “profundidade” do saber, que nos faz querer buscar o “por detrás” do mundo. Ainda mais, que nos faz acreditar que a verdadeira realidade está nesse “por detrás” que, exatamente por ser uma ilusão, equivale a nada.

Quando estudamos o homem como se ele não fosse uma máquina, é claro que não poderíamos chegar a conclusão alguma, pois isso é um absurdo. Seria o mesmo que um rato investigando-se como se não fosse um roedor, julgando que a “razão de ser” de seu dente não pode ser apenas roer queijo. O suposto “sentido íntimo da realidade” que o homem busca a partir de sua subjetividade é o mesmo que esse rato buscaria se tivesse uma inteligência semelhante à nossa, supondo toda uma ordem metafísica “por detrás” do mundo que atribui ao seu dente um “sentido roedor transcendental” que remete ao Queijo Absoluto. Pouco surpreende que a ciência até hoje nunca tenha encontrado aquilo que não existe. A ciência só pode investigar o mundo natural pelo simples fato de que o resto são delírios metafísicos. Abandonar problemas sem sentido não é limitação intrínseca, é sensatez.

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Autor: Cancian
Adaptação: Marivalton Rissatto
Obs: Créditos ao autor.

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Avanço tecnologico = Tragédia Social

 A robotização e o desemprego.O fundador e presidente da gigante taiwanesa Foxconn, Terry Gou, anunciou que a empresa irá fabricar 1 mihão de robôs para substituir empregados em suas fábricas, relatou a agência oficial de notícias chinesa Xinhua.

A estimativa é de que 50% da produção seja mecanizada até o final de 2014.

A Foxconn conta hoje com cerca de 10 mil robôs, que, ao lado de seus atuais 1,2 milhão de funcionários, operam máquinas de soldagem, borrifo de químicos e montagem. As máquinas que serão agregadas ao chão de fábrica manterão as mesmas funções.

A maior montadora de componentes para Apple e Nokia planeja ter 300 mil robôs até o ano que vem e 1 milhão de máquinas até 2014. A motivação seria o corte em despesas operacionais, devido aos crescentes salários dos trabalhadores, e o aumento da eficiência na produção.

Mais de 1 milhão dos funcionários da Foxconn trabalham na China continental, nas fábricas que a gigante mantém em Shenzhen e Sichuan.

Em comunicado enviado à BBC Brasil, a Foxconn declarou que o investimento é destinado ao desenvolvimento de pesquisa e tecnologia pela empresa, e que será aplicado única e exclusivamente às operações que a companhia mantém na China continental.

A questão da mão-de-obra utilizada pela empresa é caso de notícia há mais de um ano, quando foi registrada uma série de suicídios de trabalhadores, em especial na fábrica localizada em Shenzhen.


Em um ano, foram 11 casos de funcionários que saltaram do alto dos prédios da empresa.

Segundo alguns analistas, as causas das mortes poderiam estar ligadas à longa jornada de trabalho, aos baixos salários e à falta de segurança nas linhas de montagem.
Foxconn no Brasil

Durante a viagem da presidente Dilma Rousseff à China, em abril, a empresa prometeu fazer investimentos da ordem de US$ 12 bilhões no Brasil.

O governo calcula que a empresa possa gerar até 100 mil empregos diretos e indiretos. A fábrica, que deverá produzir tablets e telas para o iPad, deve ter mão-de-obra majoritariamente brasileira.

Mas a discussão em torno dos trabalhadores contratados criou também impasse para o avanço do acordo de investimento.

De acordo com o comunicado enviado pela Foxconn à BBC Brasil, não houve avanços na possível cooperação com o Brasil


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Fonte:
http://economia.uol.com.br/ultimas-noticias/bbc/2011/08/01/foxconn-planeja-empregar-1-milhao-de-robos-ate-2014.jhtm