quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Drones: acabamos de matar uma criança?

Via Rebelion do Le Monde França
Tradução do francês para o espanhol: Susana Merino

Tradução do espanhol para o português: Renzo Bassanetti


É um arrepiante relato bélico cujos atores jamais pisaram nos campos de batalha. Durante mais de cinco anos, Brandon Bryant combateu encerrado em um container não maior que um trailer, no interior dos Estados Unidos. “Somente era necessário que eu apertasse um botão no Novo México para que um homem morresse na outra ponta do planeta”, sintetiza o jornalista do diário alemão Der Spiegel em uma cativante investigação sobre os pilotos de drones publicada nesta semana em versão francesa em Courier International.

Nela se descobre a outra cara da guerra moderna e “invisível”, à qual “a distância retira gravidade”. “A guerra moderna pretende ser mais precisa que a antiga”, escreve o jornalista, e por isso muitos a chamam de “mais humana”. É sobre isso a idéia apresentada sobre o raro testemunho do jovem soldado.

Brandon Bryant tem 27 anos e lembra com precisão as montanhas afegãs com seus cumes nevados e seus verdejantes vales, que lhe recordam seu estado natal de Montana, observando-as a mais de 10 mil quilômetros de distância.

Síntese:

Naquele dia, havia, na retícula do drone, uma casa plana com um estábulo para as cabras, lembra ele. Quando chega a ordem de abrir fogo, Brando aperta um botão com a mão esquerda [...]. Restam 6 segundos antes do impacto. “Os segundos passam lentamente”, lembra atualmente Brandon [...]. Ele ainda pode deter o míssil. Três segundos, e Brandon observa até o menor píxel da tela. De repente, uma criança que corre junto a um dos ângulos da casa[..]. Brandon vê um resplendor na tela, e uma explosão. Caem pedaços da construção. A criança desapareceu. Brandon tem o estômago transformado em um nó.

“Acabamos de matar uma criança?”, pergunta ao colega que está sentado ao seu lado.

“Creio que era uma criança”, responde-lhe o piloto [...].

Intervém então alguém que eles não conhecem, alguém que se encontra em alguma parte em algum posto de comando do exército e que acompanhou o ataque: “Não, era um cachorro”.

Lembram de novo o que registraram. Um cachorro com duas pernas? Nesse dia, quando Brandon sai de seu container, o coração da América profunda se estende diante dele. A densa grama da estepe sem limites, os campos o cheiro da borda dos bosques[...]. Está desenrolando-se uma guerra.

O responsável pela força de intervenção de drones na Força Aérea Norte-Americana prefere evocar o uso humanitário dos drones, logo após o terremoto do Haiti, o sucesso contra as forças de Kadhafi na Líbia ou o apoio aéreo às tropas terrestres no Afeganistão, afirmando: “Salvamos vidas”. Diante do jornalista, o comandante jura “não ter visto morrer mais que combatentes”.

Por seu lado, Brandon afirma que durante seus seis anos na Força Aérea Norte-Americana “viu morrerem homens, mulheres e crianças”, e que jamais imaginou que mataria tanta gente.

Impactado pelas terríveis cenas que assiste diretamente, apesar da distância, ele termina por não suportar mais seu “cockpit” no Novo México. Sonha com infravermelhos, à noite não consegue dormir, diz a seus superiores. Em seu diário íntimo, escreve: “No campo de batalha não há beligerantes, somente sangue, e a guerra é total. Sinto-me absolutamente morto. Gostaria que meus olhos se desmanchassem”.

Um dia, ele cai no escritório cuspindo sangue. Os médicos do departamento de antigos combatentes diagnosticam-lhe uma síndrome pós-traumática. “A esperança de uma guerra confortável, sem seqüelas psicológicas, durou demais”, diz o jornalista.

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