por Mauro Santayana
Em sua edição online de ontem, o Guardian revela que o príncipe Charles, da Inglaterra, em movimento de lobby, se encontrou, durante o ano, com oito ministros ingleses, tratando de assuntos do governo, entre eles os que envolvem o Oriente Médio, e sua presença militar e econômica na região - o que contraria os costumes tradicionais do Reino Unido, onde o Rei (hoje, a Rainha) reina, mas não governa. As relações entre a Família Real e o governo se fazem mediante os encontros, nos momentos de grave necessidade política, entre o monarca que esteja no Trono e o Primeiro Ministro, no rito em que se confirma o princípio de que o poder da Coroa se submete à vontade nacional.
A monarquia é um sistema que o bom senso moderno repele. Há monarcas que se mantêm no Trono com discrição e absoluto respeito constitucional ao Parlamento, como são os soberanos dos países nórdicos. Mas as monarquias inglesa, holandesa e espanhola se mostram, a cada dia mais, servidoras de seus próprios interesses. Os escândalos se sucedem, em uma ofensa direta aos trabalhadores. Os príncipes se envolvem em episódios constrangedores, como vem ocorrendo com o Rei Juan Carlos, da Espanha, onde os casos de corrupção envolvem membros da Casa Real. Os soberanos e de seus presuntivos herdeiros usam de sua condição para dar ordens aos governantes, violando a Constituição e os ritos seculares da instituição.
O príncipe britânico, de acordo com seus acusadores, está defendendo interesses da indústria do armamento, da energia e do sistema financeiro. Isso explica encontros secretos com os ministros e altos funcionários da Defesa, do Tesouro, da Educação, da Economia, para tratar de assuntos relativos a essas pastas.
De acordo com a Casa Real, é normal que o Príncipe de Gales, como herdeiro presuntivo do Trono, mantenha esses encontros, e em segredo. Há, no entanto, a reivindicação da cidadania de que haja transparência nessas reuniões, que cuidam de assuntos em que se envolve o governo e a segurança nacional do povo britânico.
Há, latente, na Inglaterra – e com memória na fugaz, mas marcante, República de Cromwell, do século 17 – os partidários do fim da monarquia e da implantação da República. Não obstante isso, o espírito conservador britânico tem prevalecido para conter essa manifestação de bom senso. É provável, no entanto, que, diante da erosão de sua já combalida respeitabilidade, o sistema monárquico desapareça na Inglaterra, depois que sucumbir na Espanha, onde é, a cada dia e a cada hora, mais claudicante.
É certo que a monarquia foi o ponto de encontro e de entendimento, na Espanha, para encerrar o capítulo do franquismo, sem choques e com o estancamento de sangue, que durou até a morte de Carrero Blanco. Mas, cumprida essa função histórica, passou a ser inútil e prejudicial ao interesse da Nação.
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