Mentiras sobre a história da União Soviética. De Hitler e Hearst a Conquest e Solzjenitsyn!
Por Mário Sousa, em artigo escrito em sueco para o jornal Proletären - O Proletário - onde foi publicado em Abril de 1998
No ano de 1933 a politica alemã sofre modificações que vão
deixar marcas na história mundial durante dezenas de anos. Em 30 de Janeiro
Hitler é nomeado primeiro-ministro, e uma nova maneira de governar, com
violência e sem respeito pelas leis, começa a tomar forma. Para consolidar o
poder, os nazis marcam novas eleições para 5 de março utilizando toda a
propaganda ao seu alcance para assegurar um resultado vitorioso. Uma semana
antes das eleições, em 27 de fevereiro, os nazis incendeiam o parlamento e
acusam os comunistas de serem eles os incendiários. O partido comunista é
proibido e muitos comunistas são presos. Nas eleições que se seguiram os nazis
obtiveram 17,3 milhões de votos e 288 deputados, cerca de 48% do eleitorado.
(em novembro de 1932 tinham tido 11,7 milhões de votos e 196 deputados). Depois
da proibição do partido comunista, os nazis começaram a perseguir os
socialdemocratas e o movimento sindical e os primeiros campos de concentração
começaram a encher-se com todos esses homens e mulheres de esquerda. Entretanto
continuou a aumentar o poder de Hitler no parlamento com a ajuda da direita. No
dia 24 de março Hitler fez passar uma lei no parlamento que lhe deu poderes
totais para governar o país durante quatro anos sem necessidade de consulta
parlamentar. A partir daí começaram as perseguições abertas aos judeus e os
primeiros deram entrada nos campos de concentração, onde já se encontravam
comunistas e socialdemocratas de esquerda. Hitler continuou a marcha pelo poder
total, cortando com todos os acordos internacionais de 1918, que
impunham restrições ao armamento e militarização da Alemanha. O
rearmamento da Alemanha faz-se a grande velocidade. Esta era a situação
politica internacional quando o mito dos milhões de mortos na União Soviética
se começou a formar.
A Ucrânia como uma parte do
espaço alemão
Ao lado de Hitler no comando da Alemanha estava o ministro da
propaganda, Goebells, o máximo responsável por incutir o sonho nazi no povo
alemão. Este era o sonho do povo da raça pura vivendo numa Grande Alemanha, um
país com um grande "lebensraum", um grande espaço para viver. Uma
parte deste "lebensraum", uma área muito maior do que a Alemanha,
iria ser conquistada no Este e incorporada na nação alemã. Em 1925 no livro
Mein Kampf já Hitler tinha indicado a
Ucrânia como uma parte integrante do espaço alemão. A Ucrânia e outras regiões
no Este da Europa iriam pertencer à nação alemã para poderem ser utilizadas de
uma maneira "correta". Segundo a propaganda nazi, a espada alemã iria
libertar essa terra para dar lugar ao arado alemão! Com técnica alemã e
empresas alemãs a Ucrânia iria ser transformada na terra produtora de cereais
da Alemanha! Mas primeiro teriam os alemães que libertar a Ucrânia do seu povo
de "seres humanos inferiores", os quais, segundo a propaganda nazi,
seriam utilizados como força de trabalho escrava nas casas, fábricas e
agriculturas alemãs, em todos os lugares onde a economia alemã necessitasse
deles.
A conquista da Ucrânia e de outras regiões da União Soviética implicava
necessariamente guerra contra a União Soviética, o que era necessário preparar
a longo termo. Para esse efeito o ministério de propaganda nazi, chefiado por
Goebbels, iniciou em 1934 uma campanha sobre um suposto genocídio feito pelos
bolcheviques na Ucrânia, uma terrível catástrofe de fome que teria sido
provocada por Stalin para submeter e obrigar os camponeses a aceitar a política
socialista. O objetivo da campanha nazi era de preparar a opinião pública
mundial para a "libertação" da Ucrânia pelas tropas alemãs. Apesar de
grandes esforços e embora alguns textos da propaganda alemã fossem publicados
na imprensa inglesa, a campanha nazi sobre o "genocídio" na Ucrânia
não teve grande sucesso a nível mundial. Era evidente que Hitler e Goebbels
necessitavam de ajuda para espalhar as calúnias sobre a União Soviética. A
ajuda foi encontrada nos Estados Unidos da América!
William Hearst, um
amigo de Hitler
William Randolph HEARST é o nome do multimilionário americano que veio
ajudar os nazis na guerra psicológica contra a União Soviética. Hearst é o
redator americano conhecido como sendo o "pai" da chamada imprensa
amarela, a imprensa sensacionalista. William Hearst começou a carreira de
redator em 1885, quando o seu pai, George Hearst, milionário da indústria
mineira, senador e redator, lhe deu a chefia do jornal São Francisco Daily
Examiner. Assim começou também o império jornalístico de Hearst que de uma
maneira definitiva iria deixar marcas profundas na vida e nos conceitos dos estadunidenses.
Depois da morte do pai, William Hearst vendeu todas as ações da indústria
mineira que herdou e começou a investir o capital no mundo jornalístico. A
primeira compra que fez foi o New York Morning Journal, um jornal de tipo
tradicional que Hearst transformou totalmente num jornal sensacionalístico. As
notícias eram compradas a qualquer preço e quando não havia crueldades ou
crimes violentos para contar, cabia aos jornalistas e fotógrafos
"arranjar" o assunto. É justamente esta a marca da "imprensa
amarela", a mentira e a crueldade arranjada e servida como verdade.
As mentiras de Hearst fizeram dele milionário e pessoa importante no
mundo jornalístico, sendo em 1935 um dos homens mais ricos do mundo com uma
fortuna avaliada em 200 milhões de dólares. Depois da compra do Morning
Journal, Hearst continuou a comprar e fundar jornais diários e semanários por
todos os EUA. Na década dos anos 40, William Hearst era proprietário de 25
jornais diários, 24 semanários, 12 estações de rádio, 2 serviços de notícias
mundiais, um serviço de notícias para filme, a empresa de filmes Cosmopolitan e
muito mais. Em 1948 comprou uma das primeiras estações de televisão dos EUA, a
WBAL-TV em Baltimore. Os jornais de Hearst vendiam 13 milhões de
exemplares diários com cerca de 40 milhões de leitores! Quase um terço da
população adulta dos EUA lia diariamente os jornais de Hearst! E além disso,
muitos milhões de pessoas em todo o mundo recebiam a informação da imprensa de
Hearst através dos serviços de notícias, filmes e uma série de revistas que
eram traduzidas e editadas em grandes quantidades em todo o mundo. Os números
acima citados mostram bem de que maneira o império de Hearst influenciou a vida
política americana e a vida política do mundo em geral durante muitos anos (entre outras coisas, contra a participação
dos EUA na segunda guerra mundial pelo lado da União Soviética e nas campanhas
anticomunistas de McCarty na década 50).
Os conceitos de William Hearst eram extremamente conservadores,
nacionalistas e anticomunistas. A sua politica era a politica da extrema
direita. Em 1934 fez uma viagem à Alemanha, onde foi recebido por Hitler como
convidado e amigo. Depois desta viagem os jornais de
Hearst tornaram-se ainda mais reacionários, sempre com artigos
contra o socialismo, contra a União Soviética e em especial contra Stalin.
Hearst tentou também utilizar os seus jornais para fazer propaganda
nazi abertamente, com uma série de artigos de Göring, a mão direita de Hitler.
No entanto os protestos de muitos leitores obrigaram-no a parar a publicação e
retirar os artigos.
Depois da visita a Hitler os jornais sensacionalistas de Hearst vinham
cheios de "revelações" sobre acontecimentos terríveis na União
Soviética como assassínios, genocídios, escravidão, luxo para os governantes e
fome para o povo, sendo estas as grandes "notícias" diárias. O
material era dado a Hearst pela Gestapo, a polícia política da Alemanha nazi.
Nas primeiras páginas dos jornais havia muitas vezes caricaturas ou imagens
falsas da União Soviética onde Stalin era retratado como um assassino de faca
na mão. Não esqueçamos que estes artigos eram lidos diariamente por 40 milhões
de pessoas nos Estados Unidos e milhões de outras em todo o mundo!
O mito da fome na Ucrânia
Uma das primeiras campanhas da imprensa de Hearst contra a União
Soviética foi sobre os supostos milhões de mortos, vitimas da fome na Ucrânia.
A campanha iniciou-se em 18 de fevereiro de 1935 no jornal Chicago American com
um título na primeira página, "Seis milhões de mortos de fome na União
Soviética". Utilizando material vindo da Alemanha nazi começou assim o
simpatizante do nazismo e magnata da imprensa William Hearst a publicar
histórias fantásticas sobre um genocídio provocado pelos bolcheviques com
muitos milhões de mortos de fome na Ucrânia. A realidade era bem diferente. O
que se tinha passado na União Soviética no princípio da década de 1930 foi uma
grande luta de classes em que os camponeses pobres e sem terra se levantaram
contra os grandes agrários ricos, os kulaks, e iniciaram a luta pelos coletivos
agrícolas, os kolchozes. Esta grande luta de classes que envolvia direta ou
indiretamente 120 milhões de camponeses causou instabilidade na produção
agrícola e em algumas regiões falta de produtos alimentares. A falta de comida
enfraquecia as pessoas, o que contribuiu para um aumento de vítimas de
epidemias infecciosas. Este tipo de epidemias era nessa altura um acontecimento
tristemente comum no mundo. De 1918 a 1920 uma epidemia infecciosa
conhecida como a gripe espanhola fez milhões de mortos nos EUA e na Europa
(mais de 20 milhões), mas nunca ninguém acusou os governos desses países
de matarem os seus cidadãos. O fato é que os governos nada podiam fazer contra
epidemias desta espécie. Só com o aparecimento da penicilina durante a segunda
guerra mundial é que as epidemias infecciosas puderam começar a serem
combatidas com êxito no fim da década de 1940.
Os artigos na imprensa de Hearst sobre os milhões de mortos de fome na
Ucrânia que tinha sido "provocada pelos comunistas" eram detalhados e
terríveis. A imprensa de Hearst utilizou tudo ao seu alcance para fazer da
mentira realidade, provocando a opinião pública nos países capitalistas a
voltar-se fortemente contra a União Soviética. Assim se originou o primeiro
grande mito dos milhões de mortos na União Soviética. Na vaga de protestos
contra a fome "provocada pelos comunistas" que se seguiu na imprensa
ocidental ninguém quis escutar os desmentidos da União Soviética, sendo o
completo desmascaramento das mentiras da imprensa de Hearst em 1934, adiado até
1987! Durante mais de 50 anos e na base destas calúnias, várias gerações de
pessoas em todo o mundo foram levadas a formar uma visão negativa do socialismo
e da União Soviética.
O império massmedia de
Hearst ano 1998!
William Hearst morreu em 1951 na sua casa em Beverly Hills na
Califórnia. Hearst deixou um império massmedia que ainda hoje continua a espalhar
a sua mensagem reacionária por todo o mundo. A empresa The Hearst Corporation é
uma das maiores do mundo em que vivemos, reunindo mais de 100 companhias onde
trabalham 15.000 pessoas. O império de Hearst abrange hoje jornais, revistas,
livros, rádio, televisão, TV cabo, agências de notícias e multimedia.
52 anos para
desmascarar uma mentira!
A campanha de desinformação dos nazis sobre a Ucrânia não morreu com a
derrota da Alemanha nazi na segunda guerra mundial. As mentiras nazistas foram
retomadas pela CIA e pelo MI5 britânico e tiveram sempre um lugar garantido na
guerra de propaganda contra a União Soviética. As campanhas anticomunistas de
McCarthy nos EUA, depois da segunda guerra mundial, também viveram à custa dos
"milhões de mortos de fome da Ucrânia". Em 1953 foi publicado um
livro nos EUA sobre este tema, com o titulo "Black Deeds of the
Kremlin" (Os feitos negros do Kremlin). A publicação foi paga por
refugiados ucranianos nos EUA, gente que tinha colaborado com os nazis na
segunda guerra mundial, a quem o governo americano deu asilo político
apresentando-os ao mundo como democratas.
Quando Reagan foi eleito presidente dos EUA e iniciou a sua campanha
anticomunista na década de 1980, renovou-se a propaganda dos "milhões de
mortos na Ucrânia". Em 1984 um professor da Universidade de Harvard editou
um livro com o título de "Human life in Rússia" (Vida humana na
Rússia) em que estava incluído o material falso da imprensa nazi de Hearst de
1934. Em 1984 foram assim reeditadas as mentiras e falsificações nazistas dos
anos 30, mas agora com a capa respeitável de uma universidade americana. Mas a
história não fica por aqui. Já em 1986 saiu mais um livro sobre o tema, com o título
"The Harvest of Sorrow",
escrito pelo anterior agente da polícia secreta britânica Robert Conquest, que
é hoje professor da Universidade de Stansfort na Califórnia. Pelo
"trabalho" com o livro, Conquest recebeu 80.000 dólares da Ukrania
National Association. A mesma associação pagou também um filme feito em 1986, o
"The Harvest of Despair", em que, entre outras coisas, se utilizou o
material de Conquest. Nesta altura já os números apresentados nos EUA dos
"mortos de fome na Ucrânia" iam em 15 milhões de pessoas!
No entanto os milhões de mortos de fome na Ucrânia apresentados na
imprensa americana de Hearst e a sua utilização em livros e filmes era material
completamente falso. O jornalista canadense Douglas Tottle demonstrou
rigorosamente essa falsificação no seu livro "Fraud, Famine and Fascism,
The Ukrainian Genocide Myth from Hitler to Havard" editado em Toronto em
1987. Entre outras coisas Tottle mostrou que o material fotográfico
apresentado, fotografias horríveis de crianças esfomeadas, foi tirado de
publicações do ano de 1922 numa altura em que milhões de pessoas morreram na
guerra e de fome, quando oito exércitos estrangeiros invadiram a União
Soviética durante a guerra civil de 1918 - 1921. Douglas Tottle apresenta
também os fatos sobre a reportagem da fome, feita em 1934 e demonstra a
mixórdia de mentiras publicadas na imprensa de Hearst.
O jornalista que durante muito tempo tinha enviado reportagens e
fotografias das chamadas zonas da fome, um certo Thomas Walter, nunca tinha
estado na Ucrânia, mas apenas estado em Moscou durante cinco dias. Este fato
foi revelado pelo jornalista Louis Fischer, o então correspondente de Moscou do
jornal americano The Nation. Fisher revelou também que o jornalista M. Parrott,
o verdadeiro correspondente em Moscou da imprensa de Hearst, tinha enviado a
Hearst reportagens que nunca foram publicadas, sobre as ceifas com muito bons
resultados em 1933 na União Soviética e sobre uma Ucrânia soviética em
desenvolvimento. Tottle mostra-nos também que o jornalista que fez as
reportagens sobre a suposta fome para Hearst, o tal Thomas Walker, na realidade
se chamava Robert Green, um condenado escapado da prisão estatal do Colorado!
Este Walker, ou seja Green, foi preso no retorno aos EUA e confessou em
tribunal nunca ter estado na Ucrânia. Todas estas mentiras sobre os milhões de
mortos de fome na Ucrânia nos anos 30, uma fome que teria sido provocada por Stalin,
só vieram a ser conhecidas e desmascaradas em 1987! O nazista Hearst, o agente
da policia Conquest e outros, têm enganado milhões de pessoas com as suas
mentiras e falsas reportagens. Ainda hoje aparecem as histórias do nazi Hearst
em livros recém editados, de escritores pagos pela direita.
A imprensa de Hearst, com uma posição monopolista em muitas cidades nos
EUA e com agências de notícias em todo o mundo, foi o grande megafone da
Gestapo. Num universo dominado pelo capital monopolista foi possível à imprensa
de Hearst transformar as mentiras da Gestapo em verdades e fazê-las sair em
muitos jornais, estações de rádio e mais tarde na televisão em todo o mundo.
Quando a Gestapo desapareceu, continuou a guerra suja da propaganda contra o
socialismo e a União Soviética, agora com a CIA como patrão. As campanhas
anticomunistas na imprensa americana continuaram na mesma escala.
"Business as usual" - negócio como sempre, primeiro a Gestapo, depois
a CIA.
Robert Conquest - o
centro dos mitos.
Este homem amplamente citado na imprensa burguesa, um verdadeiro oráculo
para a burguesia, merece aqui uma apresentação muito concreta. Robert Conquest
é um dos autores que mais tem escrito sobre os "milhões de mortos na União
Soviética", na realidade o verdadeiro "pai" de quase todos os
mitos e mentiras sobre a União Soviética difundidos depois da segunda guerra
mundial. Conquest é conhecido principalmente pelos seus livros "O grande
terror" de 1969 e "Harvest of Sorrow" (Colheita de amargura) de
1986. Conquest escreve sobre milhões de mortos de fome na Ucrânia, nos campos
de trabalho Gulag e durante os processos de 1936 a 1938, utilizando
como fontes de informação os exilados ucranianos nos EUA pertencentes aos
partidos de direita que haviam colaborado com os nazistas na segunda guerra
mundial. Muitos dos heróis de Conquest são conhecidos como criminosos de guerra
que comandaram e participaram no genocídio dos judeus na Ucrânia. Um destes é
Mykola Lebed, condenado como criminoso de guerra depois da segunda guerra
mundial. Lebed era o chefe de segurança em Lvov durante a ocupação nazi e as
terríveis perseguições aos judeus em 1942. Em 1949 a CIA levou Lebed
para os Estados Unidos onde tem trabalhado como desinformador.
O estilo nos livros de Conquest é de um anticomunismo violento e
fanático. No livro de 1969 diz-nos Conquest que o número de mortos na fome na
União Soviética nos anos 1932-33 foi de 5 a 6 milhões de pessoas,
metade delas na Ucrânia. Mas em 1983, durante a campanha anticomunista de Reagan,
já Conquest aumentava os anos de fome até 1937 e os mortos até 14 milhões! Tal
declaração valeu-lhe um trabalho bem pago quando em 1986 foi escolhido por
Reagan para escrever o material do livro da campanha presidencial com o fim de
preparar o povo americano para uma invasão soviética... O livro chama-se
"Que fazer quando os russos vierem, um manual de sobrevivência"! Um
trabalho estranho para um professor de história...
Na realidade isto não é estranho para um homem que em toda a sua vida
tem vivido à custa de mentiras e histórias inventadas sobre a União Soviética e
Stalin, primeiro como agente da polícia e depois como escritor e professor da
Universidade de Stansfort na Califórnia. O passado de Conquest foi exposto no
jornal The Guardian em 27 de Janeiro de 1978, num artigo que o apontava como um
ex-agente do departamento de desinformação IRD - Information Research Departement,
do serviço secreto inglês. O IRD foi uma secção iniciada em 1947 (com o nome
inicial de Communist Information Departement) tendo como tarefa principal
combater a influência dos comunistas em todo o mundo através de
"plantar" histórias escolhidas no seio dos políticos, jornalistas e
todos os que influenciavam a opinião pública.
As atividades do IRD eram muito amplas, tanto na Inglaterra como no
exterior. Quando o IRD teve que ser formalmente extinto em 1977, por causa de
contatos com a extrema direita, verificou-se que, só na Inglaterra, mais de 100
dos jornalistas mais conhecidos tinham pessoalmente um contato com um agente do
IRD, que regularmente dava ao "seu" jornalista material para os
artigos a escrever. Isto era rotina nos grandes jornais ingleses, tais como o
Financial Times, Times, Observer, Sunday Times, Telegraph, Economist, Daily
Mail, Mirror, Express, Guardian e outros. Os fatos apresentados pelo jornal The
Guardian dão-nos assim uma indicação de como a polícia política dirige as notícias
que chegam ao grande público.
Robert Conquest foi agente da IRD desde o começo desta seção da policia
secreta e até 1956. O "trabalho" de Conquest era escrever as chamadas
"histórias negras" sobre a União Soviética, histórias falsas
consideradas como fatos, a serem distribuídas a jornalistas e outras pessoas
com influência na opinião pública. Depois de ter formalmente deixado a IRD,
Conquest continuou a escrever textos propostos pela IRD e com o apoio dessa
polícia. O seu livro "O grande Terror", livro básico da direita sobre
os "milhões de mortos" durante a luta partidária na União Soviética
em 1937, é na realidade um compilado de textos que ele escreveu durante a sua
vida como agente da IRD. O livro foi acabado e publicado com o apoio da IRD. Um
terço dos livros impressos foram comprados pela Editora Praeger, que
normalmente é conhecida por publicar literatura com origem na polícia política
americana, a CIA. O livro de Conquest tem sido utilizado para ser dado como
presente aos chamados "idiotas úteis", a professores universitários e
a gente que trabalha na imprensa, rádio e televisão, para garantir que as
mentiras de Conquest e da extrema direita continuem a ser espalhadas por
grandes camadas da população. Conquest é ainda hoje uma das fontes mais
importantes onde os historiadores de direita vão buscar material sobre a União
Soviética.
Alexander Solzhenitsyn
Uma outra pessoa sempre associada a livros e artigos de jornal sobre
supostos milhões de mortos e presos na União Soviética é o russo Alexander
Solzhenitsyn. Solzhenitsyn tornou-se conhecido no mundo capitalista nos fins
dos anos 60 com o seu livro "O arquipélago do Gulag", sobre a
situação dos presos nos campos de trabalho na União Soviética. Ele mesmo esteve
preso oito anos condenado por atividades contrarrevolucionárias em 1946, por
ter distribuído propaganda contra o povo da União Soviética. Segundo
Solzhenitsyn, a luta contra a Alemanha nazi na segunda guerra mundial tinha
sido uma luta desnecessária e todos os sofrimentos impostos ao povo soviético
pelos nazis podiam ter sido evitados se o governo soviético tivesse feito um
compromisso com Hitler. Solzhenitsyn acusou também o governo soviético e Stalin
de serem ainda piores que Hitler e, como ele dizia, pelos terríveis resultados
da guerra para o povo da União Soviética. Solzhenitsyn não escondia a sua
simpatia pelos nazistas. Foi condenado como traidor.
Solzhenitsyn começou em 1962 a publicar livros na União
Soviética com o consentimento e ajuda de Nikita Krustjov, sendo o primeiro
livro publicado "Um dia na vida de Ivan Denisovitjs" sobre a vida de
um preso. Krustjov utilizava os textos de Solzhenitsyn para combater a herança
socialista de Stalin. Solzhenitsyn ganhou em 1970 o Prêmio Nobel da literatura
com o livro "O arquipélago de Gulag". Os seus livros começaram então
a ser publicados em grandes quantidades nos países capitalistas, tornando-se o
autor um dos instrumentos mais importantes do imperialismo no combate ao
socialismo e à União Soviética. Aos seus textos sobre os campos de trabalho
juntou-se outra propaganda sobre os supostos milhões de mortos na União
Soviética, o que foi utilizado nas massmedias capitalistas como sendo verdades.
Em 1974 Solzhenitsyn deixou a seu pedido de ser cidadão soviético emigrando
para a Suíça e mais tarde para os Estados Unidos. Nesta altura era considerado
na imprensa capitalista como o maior lutador pela liberdade e democracia. As
suas simpatias nazis foram enterradas para não perturbar a guerra de propaganda
contra o socialismo.
Nos Estados Unidos, Solzhenitsyn foi convidado muitas vezes para fazer
intervenções em reuniões importantes. Ele foi, por exemplo, o principal orador
no congresso dos sindicatos AFL-CIO em 1975 e em 15 de Julho de 1975 foi
convidado para fazer um discurso sobre a situação no mundo no Senado dos EUA!
Os discursos de Solzhenitsyn eram de uma agitação violenta e provocativa,
argumentando e fazendo propaganda pelas ideias mais reacionárias. Entre outras
coisas bateu-se por novos ataques ao Vietnam depois da vitória deste sobre os
EUA. E mais: depois de 40 anos de fascismo em Portugal, quando os oficiais do
exército de esquerda, tomaram o poder na revolução popular de 1974,
Solzhenitsyn começou a fazer propaganda por uma intervenção militar dos EUA em
Portugal, que, dizia ele, iria ser membro do tratado de Varsóvia se os EUA não
intervissem! Nos seus discursos, Solzhenitsyn lamentava sempre a libertação das
colônias portuguesas na África.
Mas é claro que o ponto principal dos discursos de Solzhenitsyn era
sempre a guerra suja contra o socialismo. Desde execuções supostas de milhões e
milhões de pessoas na União Soviética até às dezenas de milhares de americanos
presos e escravizados que Solzhenitsyn dizia existirem no Vietnam do Norte! Foi
esta ideia de Solzhenitsyn de americanos utilizados como escravos no Vietnam do
Norte que deu origem aos filmes Rambo sobre a guerra do Vietnam. Os jornalistas
americanos que tinham ousado escrever sobre paz entre os EUA e a União
Soviética eram acusados por Solzhenitsyn nos seus discursos como sendo
traidores potenciais. Solzhenitsyn fazia também propaganda por um aumento da
capacidade militar dos EUA contra a União Soviética, que ele dizia ser mais
poderosa em "tanques e aviões, de cinco a sete vezes mais que os EUA"
e em armas atômicas que "em breve" seriam "duas, três e por fim
cinco" vezes mais potentes que as dos EUA. Os discursos de Solzhenitsyn
nos EUA eram a voz da extrema direita, mas ele iria ainda mais longe, mais à
direita, em apoio público ao fascismo.
Em apoio do fascismo
de Franco.
Depois da morte de Franco em 1975, o regime fascista espanhol começou a
perder o controle da situação política e no começo de 1976 os acontecimentos na
Espanha tomaram um caráter tal que cativou a opinião pública mundial. Greves e demonstrações
exigiam democracia e liberdade e o herdeiro de Franco, o rei Juan Carlos, foi
obrigado a iniciar uma liberalização muito cuidadosamente, para acalmar a
agitação social. Ora neste momento importante para a vida política espanhola,
aparece Alexander Solzhenitsyn em Madrid e dá uma entrevista ao programa
"Directisimo" um sábado á noite, em 20 de Março, na melhor hora
televisiva (jornais ABC e Ya de 21 de Março de 1976). Solzhenitsyn que tinha
recebido as perguntas previamente, utilizou a oportunidade para fazer todo o
tipo de declarações reacionárias. A sua intenção não foi de dar um apoio à
chamada liberalização do rei. Ao contrário, Solzhenitsyn prevenia as pessoas
contra as reformas democráticas!
Na sua intervenção na televisão declarou que "Cento e dez milhões
de russos morreram vítimas do socialismo" e comparou "a escravidão a
que estavam submetidos os soviéticos à liberdade que se disfrutava em
Espanha". Solzhenitsyn acusou também os "círculos progressistas"
de "utópicos" por considerarem Espanha como uma ditadura. Os
progressistas eram toda a oposição democrática de liberais a socialdemocratas e
comunistas. "No Outono passado" disse Solzhenitsyn, "a opinião
pública mundial estava preocupada com a sorte dos terroristas espanhóis. ( Os
cinco antifascistas condenados à morte e executados pelo regime de Franco, nota
do autor MS) Cada vez mais a opinião pública progressista exige reformas
políticas imediatas, ao mesmo tempo que apoia os atos terroristas".
"Os que querem reformas democráticas rápidas, saberão o que virá a suceder
amanhã ou depois de amanhã? A Espanha, amanhã poderá ter democracia, mas depois
de amanhã, saberá não cair no totalitarismo depois da democracia?" Às
perguntas cuidadosas dos jornalistas se tais declarações não podiam ser vistas
como um apoio a regimes de países onde não existia liberdade respondeu
Solzhenitsyn que "Eu conheço somente um sítio onde não há liberdade, esse
sítio é a Rússia". As declarações de Solzhenitsyn na televisão espanhola
foram um apoio direto ao fascismo espanhol, uma ideologia que ele ainda hoje
apoia.
Esta é uma das razões porque Solzhenitsyn desapareceu cada vez mais dos
discursos públicos durante os seus 18 anos de exilio nos EUA e uma das causas
porque os governos capitalistas não lhe dão total apoio politico. Para os
capitalistas foi uma benção dos céus poder utilizar um homem como Solzhenitsyn
na guerra suja contra o socialismo, mas tudo tem os seus limites. Na nova
Rússia capitalista o que decide o apoio do mundo ocidental aos grupos políticos
é pura e simplesmente a possibilidade de fazer bons negócios com bons lucros ao
abrigo da política desses grupos. O fascismo como alternativa política para a
Rússia não é considerado como politica que estimule os negócios. Por isso o
projeto politico de Solzhenitsyn para a Rússia é letra morta no que diz
respeito a apoio do mundo ocidental. É que Solzhenitsyn quer como futuro
político para a Rússia a volta do regime autoritário dos Czares em ligação com
a igreja tradicional russa-ortodoxa! Nem os imperialistas mais arrogantes estão
interessados a apoiar uma estupidez politica deste calibre. Para encontrar
apoio a Solzhenitsyn no mundo ocidental há que rebuscar na idiotia intelectual
da extrema direita.
Nazis, polícias e
fascistas!
Assim são eles, os mais dignos representantes dos mitos burgueses dos
"milhões de mortos e presos na União Soviética" - o nazi William
Hearst, o agente da policia Robert Conquest e o fascista Alexander
Solzhenitsyn. Conquest tem tido o papel principal, sendo as suas informações
utilizadas pelas massemedia capitalistas em todo o mundo e formando
inclusivamente uma escola dentro de certas universidades. O trabalho de
Conquest é sem dúvida um trabalho de desinformação policial de primeira classe.
Na década de 1970 Conquest teve uma grande ajuda de Solzhenitsyn e de uma série
de figuras de segunda com Andrei Sakharov e Roy Medvedev. Além disso apareceu
um pouco por todo o mundo uma série de especuladores em mortos e presos a quem
a imprensa burguesa sempre pagou a preço de ouro. Mas a realidade dos fatos foi
por fim apresentada e mostra a verdadeira cara de todos estes falsificadores da
história. A ordem de Gorbatchov para abrir os arquivos secretos do partido à
investigação histórica teve consequências que ninguém podia prever.
Os arquivos mostram as mentiras da propaganda
A especulação sobre milhões de mortos na União Soviética é uma parte da
guerra suja de propaganda contra a União Soviética e por isso mesmo os
desmentidos e esclarecimentos oficiais dos soviéticos nunca foram levados a
sério e nunca tiveram lugar na imprensa capitalista. Eram, pelo contrário, alvo
de troça, enquanto que aos "especialistas" comprados pelo capital foi
dado todo o espaço requerido para difundirem as suas fantasias. Que fantasias
eram realmente! O que os milhões de mortos e presos proclamados por Conquest e
outros "críticos" têm de comum, é que são produto de aproximações
estatísticas falsas e métodos de avaliação sem base científica.
Métodos falsos dão
milhões de mortos
Conquest, Solzhenitsyn, Medvedev e outros utilizaram-se de estatística
publicada pela União Soviética, por exemplo, escrutínios nacionais da
população, aos quais adicionaram um suposto aumento populacional sem ter em
conta a situação real existente no país. Assim chegaram à conclusão de quantas
pessoas deveria haver no país no final de certos anos. As pessoas que faltavam
eram apresentadas como mortos e presos à conta do socialismo. Um método simples
mas totalmente falso. Este tipo de "revelação" de acontecimentos
políticos tão importantes nunca passaria se a "revelação" fosse sobre
o mundo ocidental. Nesse caso teria havido com toda a certeza professores e
historiadores que se levantariam contra tal falsificação. Mas como o que estava
em causa era a União Soviética, a falsificação tem passado. Um dos motivos é certamente
o de que professores e historiadores põem as possibilidades de avançar na
carreira profissional em primeiro lugar e só muito depois a honra profissional.
Em números, quais foram
afinal as conclusões dos "críticos"?
Segundo Robert Conquest (numa avaliação feita em 1961) tinham morrido 6
milhões de pessoas de fome na União Soviética no princípio dos anos 30. Este
número foi aumentado por Conquest para 14 milhões em 1986. No que diz respeito
aos campos de trabalho Gulag, estavam ali detidos, segundo Conquest, 5 milhões
de presos em 1937, antes das depurações no partido, no exército e no estado
terem começado. Depois das depurações começarem, vieram segundo Conquest,
durante 1937-38, mais 7 milhões de presos o que faz um resultado de 12 milhões
de presos nos campos de trabalho em 1939! E não esqueça o leitor que estes 12
milhões do Conquest são SOMENTE os presos políticos! Nos campos de trabalho
havia também criminosos de delito comum, os quais, segundo Conquest seriam em
número muito maior que os presos políticos. Isto significa que, segundo
Conquest havia cerca de 25-30 milhões de presos nos campos de trabalho na União
Soviética.
Também segundo Conquest foram executados em 1937-39 um milhão de presos
políticos, enquanto que 2 milhões morreram à fome. Resultado final das
depurações de 1937-39 segundo Conquest, 9 milhões de presos políticos e 3
milhões de mortos! Estes números foram em seguida submetidos a
"apreciações estatísticas" por Conquest para concluir que os
bolcheviques tinham morto nada menos que 12 milhões de presos políticos entre
1930 e 1953. Juntando esses números aos mortos de fome nos anos 30, chega
Conquest à conclusão de que os bolcheviques haviam morto 26 milhões de pessoas.
Numa última apreciação estatística diz Conquest que em 1950 havia 12 milhões de
presos políticos na União Soviética!
Alexander Solzhenitsyn utilizou mais ou menos as mesmas apreciações
estatísticas que Conquest. Mas usando os métodos pseudocientíficos com outras
premissas, chega ainda a conclusões mais extremas. Solzhenitsyn aceita os números
de Conquest de 6 milhões de mortos na fome de 1932-33; no entanto, com respeito
às depurações de 1936-39, considera que morreram no mínimo 1 milhão por ano!
Fazendo um resumo diz-nos Solzhenitsyn que desde as coletivizações da
agricultura até à morte de Stalin em 1953, tinham os comunistas morto 66
milhões de pessoas na União Soviética. Além disso, aponta o governo soviético
como culpado pela morte de 44 milhões de russos que ele afirma terem morrido na
segunda guerra mundial. A conclusão de Solzhenitsyn é que "110 milhões de
russos morreram vítimas do socialismo". No que diz respeito a presos
diz-nos Solzhenitsyn que o número de pessoas nos campos de trabalho em 1953 era
de 25 milhões!
Gorbatchov abre os
arquivos
A coleção de números fantásticos acima apresentada, um produto de
fantasias muito bem pagas, tem saído na imprensa burguesa desde os anos 60,
tendo esses números sempre sido apresentados como fatos verdadeiros, obtidos na
base de métodos científicos. Por detrás desta falsificação estão as policias
políticas ocidentais, principalmente a americana CIA e a inglesa
MI5. O impacto dos massmedias na opinião publica é tão grande que os números
hoje são ainda considerados verdadeiros em grandes camadas das populações dos
países ocidentais. Esta situação penosa tem piorado. Na própria União Soviética
onde Solzhenitsyn e outros críticos conhecidos, como Andrei Sacharov e Roy
Medvedev, não encontravam nenhum apoio para os números fantásticos, houve uma
mudança significativa em 1990. Na nova "imprensa livre" durante
Gorbatchov, tudo o que se opunha ao socialismo era apresentado como positivo, o
que teve consequências desastrosas. Uma inflação sem igual começou a aumentar a
quantidade de mortos e presos durante o socialismo, que agora se misturavam num
só grupo de dezenas de milhões de "vitimas" dos comunistas.
A histeria na nova imprensa livre de Gorbatchov levou por diante as
mentiras de Conquest e Solzhenitsyn. Ao mesmo tempo foram abertos por
Gorbatchov os arquivos do Comitê Central para investigação histórica, o que era
exigido pela imprensa livre. A abertura dos arquivos do Comitê Central do
Partido Comunista é na realidade a questão central desta história confusa, isto
por duas razões. Em parte porque nos arquivos se encontram todos os fatos que
podem esclarecer a verdade. Mas ainda mais importante porque todos os
especuladores de mortos e presos na União Soviética têm dito durante anos e
anos que no dia em que os arquivos se abrissem os números por eles apresentados
seriam confirmados! Todos os especuladores em mortos e presos afirmaram que
assim seria, todos: Conquest, Solzhenitsyn, Sacharov, Medvedev e os demais. Mas
quando os arquivos foram abertos e os estudos dos documentos existentes
começaram a ser publicados, aconteceu uma coisa muito estranha.
De repente já nem a imprensa livre de Gorbatchov nem os especuladores em
presos e mortos estavam interessados nos arquivos! Os resultados das
investigações feitas nos arquivos do Comitê Central pelos historiadores russos
Zemskov, Dougin e Xlevnjuk, que se começaram a publicar em 1990 em revistas
cientificas, passaram totalmente desapercebidos! Os relatórios com os
resultados das investigações históricas iam contra a corrente da inflação em
mortos e presos da imprensa livre mas permaneceram desconhecidos. Os relatórios
foram publicados em revistas cientificas de pouca venda, praticamente
desconhecidas do grande público. Os relatórios científicos não podiam concorrer
com a histeria da imprensa, ganhando as mentiras de Conquest e Solzhenitsyn o
apoio de muitas camadas da população na União Soviética, hoje Rússia. Também no
ocidente, os relatórios dos investigadores russos sobre o sistema correicional
durante Stalin, passaram sem notícias de primeira página ou reportagens na
televisão. Porquê?
O que dizem os relatórios
dos investigadores russos?
Os relatórios da investigação do sistema corretivo soviético são
expostos num trabalho com cerca de 9.000 páginas. Os investigadores que
escreveram os relatórios são vários, sendo os mais conhecidos os historiadores
russos V.N. Zemskov, A.N. Dougin e O.V. Xlevnjuk. O seu trabalho foi começado a
publicar em 1990 estando em 1993 praticamente acabado e totalmente publicado na
Rússia. Os relatórios da investigação chegaram ao conhecimento do ocidente em
colaboração com investigadores de diversos países ocidentais. Os dois trabalhos
conhecidos pelo autor deste texto, são o trabalho apresentado em França na
revista L'Histoire em Setembro de 1993 por Nicolas Werth, chefe investigador do
instituto francês de investigação cientifica, CNRS, (Centre National de la
Recherche Scientifique) e o trabalho publicado nos EUA na revista The American
Historical Review, por J. Arch Getty, professor de história da Universidade da
Califórnia, Riverside, em conjunto com G.T. Rettersporn, investigador do
instituto francês de investigação CNRS e o investigador russo V.N. Zemskov do
instituto de História Russa da Academia das Ciências Russa.
Existem também hoje em dia livros sobre o assunto escritos pelos
investigadores acima mencionados ou por outros investigadores dos mesmos grupos
de investigação. Antes de entrarmos no assunto quero deixar aqui esclarecido
para que não haja confusão futura, que nenhum dos cientistas envolvidos nestes
trabalhos tem uma visão socialista do mundo, mas sim um compreensão burguesa e
antisocialista, muitas vezes bastante reacionária. Isto dito para que o leitor
não pense que o que se vai expor é produto de uma "conspiração
comunista". O que acontece quando os investigadores acima citados,
desfazem completamente as mentiras de Conquest, Solzhenitsyn, Medvedev e
outros, é que o fazem simplesmente pelo fato de que põem a honra profissional
em primeiro lugar e não se deixam comprar para efeitos de propaganda.
Os relatórios de investigação russos dão resposta a uma quantidade muito
grande de perguntas sobre o sistema correcional soviético. Para nós é o tempo
de Stalin que é o mais interessante para estudar, é aí que está a causa da
discussão. Nós pomos algumas perguntas muito concretas e procuramos as
respostas no material das revistas L'Histoire (L'H) e The American Historical
Review (AHR). Esta será a melhor maneira de pôr em debate algumas das partes
mais importantes do sistema correcional soviético. As perguntas são as seguintes:
1. O que era o sistema correcional soviético?
2. Qual era o número de presos, "políticos" e de delito comum?
3. Quantos mortos houve nos campos de trabalho?
4. Quantos foram os condenados à morte até 1953 e em especial durante as
depurações de 1937-38?
5. Qual era em geral o tempo de prisão?
Depois de termos respondido às 5 perguntas, pomos em discussão as penas
impostas aos dois grupos mais debatidos quando a questão dos presos e mortos na
União Soviética se põe, nomeadamente os kulaks condenados em 1930 e os contrarrevolucionários
de 1936-38.
Os campos de trabalho no
sistema correcional
Comecemos com a pergunta 1 sobre o sistema correcional soviético. Depois
de 1930 o sistema correcional soviético compreendia prisões, campos de trabalho
e colônias de trabalho do Gulag, zonas especiais abertas e pagamento
de multas. Aquele que recebesse voz de prisão era geralmente colocado numa
prisão normal enquanto se faziam as investigações que poderiam demonstrar a sua
inocência e dar-lhe liberdade ou levar o caso a julgamento. O acusado levado a
julgamento podia ser considerado inocente e ganhar a liberdade ou caso fosse
julgado culpado condenado a uma pena de multa, prisão ou em casos mais raros,
pena de morte. A pena de multa podia ser uma certa percentagem do salário
durante um certo tempo. Os acusados julgados a pena de prisão podiam ser postos
em diferentes tipos de prisão dependendo do tipo de crime.
Para os campos de trabalho Gulag iam os criminosos de crimes graves
(homicídio, roubo, violação, crimes econômicos, etc.) e uma grande parte dos
condenados por atividades contrarrevolucionárias. Outros criminosos com pena
superior a três anos podiam também ser postos em campos de trabalho. Depois de
um tempo num campo de trabalho o preso podia ser mudado para uma colônia de
trabalho ou uma zona especial aberta. Os campos de trabalho eram zonas muito
grandes onde os condenados viviam e trabalhavam debaixo de um grande controle.
Trabalhar e não ser um peso para a sociedade era coisa evidente, nenhuma pessoa
saudável passava sem trabalhar. Pode ser que alguém hoje em dia pense que isto
é terrível, mas esta era a realidade. O número de campos de trabalho era de 53
em 1940. As colônias de trabalho Gulag eram 425, unidades muito menores que os
campos de trabalho e com um regime mais livre e com menos controle. Para aí iam
os presos com penas de prisão menores, tanto de delito comum ou políticos,
trabalhando em liberdade em fábricas e na agricultura que eram uma parte da
economia da sociedade civil. Na maioria dos casos o salário desses trabalhos
revertia por inteiro ao condenado, em igualdade com os outros trabalhadores. As
zonas especiais abertas eram em geral zonas agrícolas para as quais eram
exilados os kulaks, que tinham sido expropriados durante a coletivização. Outros
condenados por penas menores ou atividades contrarrevolucionárias podiam também
cumprir as penas nestas zonas.
454 mil e não 9
milhões!
Segunda pergunta. Qual era o número de presos "políticos" e de
delito comum? A questão inclui os presos nos campos de trabalho e nas colônias
de trabalho do Gulag e nas prisões, ainda que tendo em conta que a privação da
liberdade nas colônias de trabalho era na maioria dos casos reduzida. Vejamos
os números do quadro abaixo do material da AHR respeitante ao período de vinte
anos a começar em 1934 quando o sistema correcional foi reunido numa
administração central e até 1953 quando Stalin morreu.
Da tabela acima há uma série de conclusões a tirar. Para começar podemos
comparar os números da tabela com os de Robert Conquest. Este diz-nos que em
1939 havia 9 milhões de presos políticos nos campos de trabalho e que 3 milhões
mais tinham morrido durante o período de 1937-39. Não esqueça o leitor que os
números de Conquest se referem apenas a presos políticos! Além desses, diz-nos
Conquest que havia os presos de delito comum que segundo ele eram em muito
maior número que os "políticos". Em 1950 havia segundo Conquest 12
milhões de presos políticos! Com os fatos na mão podemos ver agora o
falsificador que este Conquest na realidade é. Não há um único número que
corresponda à realidade. No ano de 1939 havia em todos os campos, colônias e
prisões cerca de 2 milhões de presos. Desses eram 454 mil condenados por crimes
políticos e não 9 milhões como Conquest afirma. Os mortos nos campos de
trabalho de 1937 a 1939 foram cerca de 160 mil e não 3 milhões como
diz Conquest. No ano de 1950 havia nos campos de trabalho 578 mil presos por
crimes políticos e não 12 milhões. Não esqueça o leitor que este Robert
Conquest ainda hoje é uma das fontes mais importantes da propaganda da direita
contra o comunismo. Para os pseudointelectuais da direita Conquest é como um
deus. No que diz respeito aos números de Alexander Solzhenitsyn,
os 60 milhões
de mortos nos campos de trabalho, não há necessidade de comentários, o ridículo
da afirmação é evidente. Só uma mente enferma pode afirmar tais fantasias.
Deixemos agora os falsificadores e façamos uma análise concreta das
estatísticas do Gulag. A primeira questão que se põe é o que pensar do número
de pessoas no sistema correcional. Que significado tem o número mais alto de
2,5 milhões? Cada pessoa posta em prisão é um testemunho de que a sociedade
ainda não se desenvolveu para poder dar a cada cidadão o necessário para uma
vida positiva. Vendo as coisas desta maneira, são os 2,5 milhões uma nota
negativa para a sociedade.
A ameaça interna e
externa
Mas ao número de pessoas abrangidas pelo sistema correcional tem que ser
dada uma explicação mais concreta. A União Soviética era um país que
recentemente tinha deixado o feudalismo e a herança social no que diz respeito
ao valor humano era muitas vezes um peso para a sociedade. No sistema antigo
com os Czares, os trabalhadores eram obrigados a viver numa miséria profunda e
a vida humana não tinha muito valor. Roubos e crimes violentos eram punidos com
uma violência sem limites. Revoltas contra a monarquia acabavam usualmente com
massacres, condenações à morte e penas de prisão muito grandes. Estas relações
sociais e a maneira de pensar com elas relacionada leva muito tempo a mudar,
tendo isto influenciado o desenvolvimento da sociedade na União Soviética e
também a criminalidade no país.
Outro fator a ter em conta é que a União Soviética, um país que nos anos
trinta tinha cerca de 160-170 milhões de habitantes, estava fortemente ameaçada
por potências estrangeiras. Na base das grandes mudanças politicas na Europa na
década de 1930, vinha a principal ameaça de guerra da Alemanha nazi, ameaça
contra a sobrevivência dos povos eslavos, constituindo também as democracias
ocidentais um bloco com intenções intervencionistas. Esta situação muito séria
foi resumida por Stalin em 1931 com as seguintes palavras "Estamos
atrasados entre 50 a 100 anos em relação aos países avançados. Temos
que percorrer esta distância em 10 anos. Ou o fazemos ou seremos
arrasados". Dez anos depois, em 22 de Junho de 1941, a União
Soviética era invadida pela Alemanha nazi e os seus aliados. A sociedade
soviética foi obrigada a grandes esforços durante o decênio de 1930-40, sendo a
maior parte dos recursos utilizados nos preparativos de defesa para a guerra
contra os nazis. Isto fez com que as pessoas tivessem uma vida de trabalho sem
grandes compensações a nível pessoal. A reforma de 7 horas de trabalho diário
teve que ser retirada em 1937 e em 1939 eram quase todos os domingos dias de
trabalho. Num período difícil como este, em que uma grande guerra determinou o
desenvolvimento social durante duas décadas, 1930 e 1940, uma guerra que custou
à União Soviética 25 milhões de vidas perdidas e metade do país em cinzas,
aumentou a criminalidade quando as pessoas tentavam obter aquilo que a vida não
lhe podia dar.
Durante este tempo muito difícil na União Soviética havia como máximo
2,5 milhões de pessoas no sistema correcional ou seja 2,4 % da população
adulta. Como se poderá avaliar este número? É muito ou pouco? Façamos uma comparação.
Mais presos nos EUA
Por exemplo nos Estados Unidos da América, um país com 252 milhões de
habitantes em 1996, o país mais rico do planeta que consome sozinho 60% dos
recursos mundiais, quantas pessoas há no sistema correcional? Qual é a situação
neste país, que não é ameaçado por nenhuma guerra e onde não existem mudanças
sociais que possam ameaçar a estabilidade econômica? Numa notícia (bem pequena)
nos jornais em Agosto de 1997, do serviço de noticias FLT-AP dizia-se que nos
EUA "Nunca anteriormente tinham existido tantas pessoas no sistema
correcional como 5,5 milhões em 1996". Isto representa um aumento de 200
mil pessoas desde 1995 o que faz com que o número de criminosos nos EUA
"seja 2,8% da população adulta". Estes dados vêm todos do
departamento de justiça estadunidense. O número de pessoas condenadas como
criminosas nos EUA é hoje superior em 3 milhões ao que foi o máximo na União
Soviética! Na União Soviética houve no máximo 2,4% da população adulta
condenada por crime - nos EUA estão condenados 2,8% e a quantidade continua a
crescer! Segundo um comunicado à imprensa do departamento de justiça dos EUA de
18 de Janeiro de 1998, aumentou o número de presos nos EUA em 1997 com 96.100
pessoas.
E no que diz respeito aos campos de trabalho soviéticos é verdade que
era um regime duro e difícil para os presos, mas veja-se bem como é hoje a
situação nas prisões nos EUA onde por todo o lado existe violência, drogas, prostituição
e escravatura sexual (290.000 violentados por ano nas prisões dos EUA). Ninguém
se sente em segurança nas prisões nos EUA! Isto num tempo moderno na sociedade
mais rica de sempre!
Um fator importante -
falta de medicamentos.
Respondamos agora à pergunta número 3. Quantos foram os mortos nos
campos de trabalhos? Os casos de morte nos campos de trabalho variaram muito de
ano para ano, de 5,2% em 1934 a 0,3% em 1953. Os casos de morte nos
campos de trabalho eram causados pela falta de recursos na sociedade, em
primeiro lugar falta de medicamentos para combater epidemias. Este problema não
era especifico dos campos de trabalho, existindo igualmente na sociedade em
geral como também na grande maioria dos países do mundo. Depois dos antibióticos
terem sido descobertos e começado a ser utilizados depois da segunda guerra
mundial, a situação modificou-se radicalmente. Na realidade os anos mais difíceis
foram os anos de guerra quando o barbarismo nazi obrigou todos os cidadãos da
União Soviética a viver uma vida muito dura. Durante estes quatro anos morreram
nos campos de trabalho mais de meio milhão de presos o que é mais de metade de
todos os mortos durante 20 anos. Não esqueçamos que no mesmo período, nos anos
da guerra, morreram 25 milhões de pessoas na sociedade livre. Quando as
condições na União Soviética melhoraram no decênio de 1950 e com o uso de
antibióticos o número de mortos entre os presos diminuiu para 0,3%.
Vejamos agora a pergunta número 4. Quantos foram os condenados à morte
até 1953 e em especial durante as depurações de 1937-38? Já vimos os números de
Robert Conquest de 12 milhões de presos políticos que os bolcheviques teriam
matado nos campos de trabalho de 1930 a 1953, dos quais 1 milhão em
1937-38. Os números de Solzhenitsyn são de dezenas de milhões de mortos nos
campos de trabalho, dos quais 3 milhões foram mortos em 37-38. Mas ainda tem
havido números mais elevados citados na propaganda suja contra a União
Soviética. A russa Olga Shatunovskaia, por exemplo, dá-nos um número de 7
milhões de mortos nas depurações de 1937-38!
Mas os documentos dos arquivos soviéticos agora publicados dão-nos uma
informação diferente. É preciso dizer em primeiro lugar que os números dos
condenados à morte se encontram em vários arquivos e que os investigadores para
nos darem um resultado aproximativo são obrigados a recolher dados desses
arquivos com um certo risco de contagem dupla e portanto de darem um número
maior de o que foi na realidade. Segundo Dmitrii Volkogonov, o chefe dos
anteriores arquivos soviéticos nomeado por Jeltsin, foram condenados à morte 30.514
pessoas por tribunais militares de 1 de Outubro de 1936 a 30 de
Setembro de 1938. Uma outra informação que agora existe vem da KGB. Segundo uma
informação à imprensa em Fevereiro de 1990 tinham 786.098 pessoas sido
condenadas à morte por crimes contra a revolução durante os 23 anos de 1930 até
1953. Desses condenados tinham, segundo a KGB, 681.692 sido condenados em
1937-38. Não há possibilidade de fazer um controle das informações que a KGB
nos dá, mas esta última afirmação é duvidosa. Seria muito estranho tantos
condenados em dois anos. Será que a atual KGB pró-capitalista nos dá uma
informação correta da KGB pró-socialista? Em todo o caso, veio-se a verificar
que as estatísticas que estão na base da informação da KGB mostram que o número
mencionado de condenados à morte durante esses 23 anos se refere a criminosos
de delito comum e contrarrevolucionários e não apenas a contrarrevolucionários
como a KGB pró-capitalista referiu na informação à imprensa em Fevereiro de
1990. Dos arquivos tira-se também a conclusão de que o número de criminosos
condenados à morte era aproximadamente igual para os de delito comum e os
contrarrevolucionários.
A conclusão a que podemos chegar é de que o número de condenados à morte
em 1937-38 foi de cerca de 100 mil e não de vários milhões como tem sido
apresentado na propaganda ocidental. É preciso também ter em conta que nem
todos os condenados à morte na União Soviética eram executados. Uma grande
parte passava a pena de prisão nos campos de trabalho. Também é importante
fazer uma diferença entre criminosos de delito comum e contrarrevolucionários.
Muitos dos condenados à morte eram criminosos condenados por crimes violentos
como assassínio ou violação. Este tipo de crime era há sessenta anos penalizado
com sentença de morte numa grande parte dos países do mundo
Pergunta número 5 - Qual era em geral o tempo de prisão? O tempo de
prisão dos condenados é uma das questões em que os rumores da propaganda
ocidental têm sido dos piores. A descrição geral é de que estar preso na União
Soviética significava anos sem conta na prisão - quem para lá entrava já não
saía. Isto é completamente falso! A grande maioria dos presos no tempo de Stalin,
na realidade foram condenados no máximo a 5 anos de prisão!
A estatística de AHR dá-nos fatos concretos. Os criminosos de delito
comum na Federação russa em 1936 receberam as seguintes penas de prisão - até 5
anos, 82,4% - de 5 a 10 anos 17,6%. ( 10 anos - pena máxima de prisão
até 1937). Os criminosos políticos condenados na União Soviética em tribunais
civis em 1936 receberam as seguintes penas de prisão - até 5 anos, 44,2% -
de 5 a 10 anos 50,7%. No que diz respeito aos condenados nos campos
de trabalho Gulag, onde as penas maiores eram cumpridas, a estatística de
Janeiro de 1940 é a seguinte - até 5 anos,56,8% - de 5 a 10 anos,
42,2% - mais de 10 anos, 1,0%. Para o ano de 1939 temos estatísticas dos
tribunais da União Soviética. A distribuição das penas de prisão é a seguinte -
até 5 anos, 95,9% - de 5 a 10 anos. 4,0% - mais de 10 anos, 0,1%.
Como vemos é a suposta infinidade do tempo de prisão na União Soviética, mais
um mito espalhado no ocidente para combater o socialismo.
As mentiras sobre a União Soviética.
Uma breve discussão sobre os relatórios dos investigadores.
As investigações dos historiadores russos revelam uma realidade
totalmente diferente da que tem sido ensinada nas escolas e universidades do
mundo capitalista durante os últimos cinquenta anos. Durante esses cinquenta
anos de guerra fria têm várias gerações aprendido só mentiras sobre a União
Soviética e isto tem deixado marcas profundas em muitas pessoas. Este fato
constatado também se verifica nos relatórios dos investigadores franceses e americanos.
Nestes relatórios são-nos dados números e tabelas de presos e mortos,
discutindo-se esses números num trabalho de grande amplitude. Mas o principal e
mais importante, isto é, os crimes praticados pelos presos, nunca é alvo de uma
discussão séria! A propaganda política dos capitalistas tem-se referido sempre
aos presos na União Soviética como sendo vítimas e os investigadores utilizam
este termo sem pôr em questão a sua veracidade. Quando os investigadores passam
das colunas de estatística aos comentários sobre os acontecimentos, vêm as
concepções burguesas à luz e o resultado é por vezes macabro. Os condenados no
sistema correcional soviético são chamados vítimas, mas o fato é que a maioria
eram ladrões, assassinos, violadores, etc. Criminosos deste calibre nunca
seriam tratados como "vitimas" na imprensa se os crimes fossem
cometidos na Europa ou nos EUA. Mas como os crimes foram cometidos na União
Soviética tudo é possível. Chamar "vítima" a um assassino ou violador
que repete o crime é coisa muito suja. Uma tomada de posição pela justiça
soviética no que diz respeito aos criminosos de delito comum condenados por
crimes violentos deveria de ser consequente, senão no tipo de pena pelo menos
na questão da condenação do crime.
Os koulaks e a contrarevolução
No que diz respeito aos contrarrevolucionários é também importante
discutir os crimes de que foram acusados. Discutamos dois exemplos para mostrar
o fundo da questão, em primeiro lugar os koulaks condenados no começo da década
de 1930 e depois os conjurados e contrarrevolucionários condenados em 1936-38.
Segundo os relatórios publicados sobre os koulaks, os camponeses ricos, foram
381 mil famílias ou seja cerca de 1,8 milhões de pessoas condenadas a exílio.
Uma pequena parte dessas pessoas foi condenada a penas nos campos de trabalho
ou em colônias de trabalho. Mas qual foi a causa da condenação desses koulaks?
O camponês rico russo, o koulak, sujeitou os camponeses pobres durante
centenas de anos a uma opressão sem limites e a uma exploração sem
considerações. Dos 120 milhões de camponeses em 1927, viviam 10 milhões de
koulaks na abundância e os restantes 110 milhões ainda na pobreza - antes da
revolução na mais completa das misérias. A riqueza dos koulaks vinha do
trabalho mal pago aos camponeses pobres. Quando os camponeses pobres se
começaram a juntar em cooperativas agrícolas desapareceu a principal fonte de
riqueza dos koulaks. Mas os koulaks não desistiram, tentando retomar a
exploração através da fome. Grupos de koulaks armados atacavam as cooperativas agrícolas,
matavam camponeses pobres e funcionários do partido, deitavam fogo aos campos e
matavam os animais de trabalho. Provocando a fome entre os camponeses pobres os
koulaks tentavam garantir a continuação da pobreza e da sua posição de poder.
Os acontecimentos que se sucederam não foram o que os assassinos tinham
pensado. Desta vez os camponeses pobres foram apoiados pela revolução e
mostraram-se mais fortes do que os koulaks, os quais foram derrotados, presos e
condenados a exílio ou a penas em campos de trabalho.
Dos 10 milhões de koulaks foram 1,8 milhões condenados. Houve talvez
injustiças nesta enorme luta de classes nos campos soviéticos que contava com
120 milhões de pessoas. Mas poderemos acusar os pobres e os oprimidos, na sua
luta por uma vida que valha a pena viver, na sua luta para que os filhos não
viessem a ser analfabetos com fome, de não serem civilizados ou clementes nos
seus juízos? Podem-se acusar os que durante centenas de anos nunca tiveram
acesso aos avanços da civilização de não serem civilizados? E digam-nos, quando
foi a classe exploradora dos koulaks civilizada ou clemente para com os
camponeses pobres durante anos e anos de exploração sem fim?
As depurações de 1937
O nosso segundo exemplo, sobre os contrarrevolucionários condenados nos
julgamentos de 1936-38 depois das depurações no partido, exército e no aparelho
estatal, tem raízes na história do movimento revolucionário na Rússia. Milhões
de pessoas participaram na luta vitoriosa contra o Czar e a burguesia russa,
vindo muitos deles a entrar para o partido comunista. Entre todas essas pessoas
havia infelizmente os que tinham entrado para o partido por outras razões do
que para lutar pelo poder proletário e pelo socialismo. Mas a luta de classes
era tal que muitas vezes não havia tempo nem possibilidades para pôr à prova os
novos militantes. Até mesmo militantes de outros partidos que se diziam
socialistas e que tinham combatido o partido bolchevique foram aceites no
partido comunista. A uma parte desses novos militantes foram dados postos
importantes no partido bolchevique, estado e exército, tudo dependendo da sua
capacidade individual para conduzir a luta de classes.
Eram tempos muito difíceis para o jovem estado soviético e a grande
falta de quadros, ou simplesmente de pessoas que soubessem ler, obrigava o
partido a não fazer grandes exigências no que diz respeito à qualidade dos
novos militantes e quadros. De todos estes problemas formou-se com o tempo uma
contradição que dividiu o partido em dois campos - de um lado os que queriam ir
para a frente na luta pela sociedade socialista, por outro lado os que
consideravam que ainda não havia condições para realizar o socialismo e que
propunha uma politica socialdemocrática. A origem destas últimas ideias vinha
de Trotski, que tinha entrado para o partido comunista em Julho de 1917.
Trotski foi com o tempo obtendo apoio de alguns dos bolcheviques mais
conhecidos. Esta oposição unida contra os ideais bolcheviques originais era uma
das opções na votação partidária sobre a politica a seguir pelo partido, realizada
em 27 de Dezembro de 1927. Antes desta votação tinha havido uma grande
discussão partidária durante vários anos e não houve duvida quanto ao resultado.
Dos 725.000 votos a oposição só obteve 6.000 - ou seja, menos de 1% dos
militantes do partido apoiaram a oposição unida.
Em consequência da votação e uma vez que a oposição trabalhava por uma
política diferente da do partido, o comitê central do partido comunista decidiu
expulsar do partido os principais dirigentes da oposição unida. A pessoa
central da oposição, Trotski, foi expulso da União Soviética. Mas a história da
oposição não acabou aqui. Sinovjev, Kamenjev e Evdokimov fizeram pouco depois autocrítica,
assim como vários dos principais trotskistas como Pjatakov, Radek,
Preobrajenski e Smirnof. Todos esses foram novamente aceitos como militantes do
partido e retomaram os seus trabalhos no partido e no estado. Com o tempo
verificou-se que as autocríticas da oposição não eram uma expressão verdadeira,
estando os principais oposicionistas unidos do lado da contrarrevolução cada
vez que a luta de classes endurecia na União Soviética. A maioria desses
oposicionistas foi expulso e readmitido mais umas duas vezes antes de se ter
formado a situação definitiva em 1937-38.
Sabotagem industrial
O assassínio de Kirov em Dezembro de 1934, o presidente do partido em
Leningrado e uma das pessoas mais importantes do comitê central, veio a dar
origem à descoberta de uma organização secreta que preparava uma conspiração
para tomar posse da direção do partido e do governo do país através de um ato
violento. A luta politica que tinham perdido em 1927 queriam agora ganhá-la através
de violência organizada contra o estado. A organização tinha uma rede de apoios
no partido, no exército e aparelho estatal em todo o país, sendo as atividades
mais importantes sabotagem industrial, terrorismo e corrupção. Trotski, o
principal inspirador da oposição dirigia as atividades do estrangeiro. A
sabotagem industrial causava uma perda terrível para o estado soviético, com um
custo econômico enorme como por exemplo máquinas importadas que se estragavam
sem possível reparação, e uma enorme baixa na produtividade nas minas e
fábricas.
Uma das pessoas que em 1939 descreveu o problema foi o engenheiro
americano John Littlepage, um dos especialistas estrangeiros contratados para
trabalhar na União Soviética. Littlepage trabalhou 10 anos na indústria mineira
soviética, entre 1927 e 1937, principalmente nas minas de ouro. No seu livro
"In search of Soviet gold" escreve, "Eu nunca tive interesse
pela subtilidade das manobras políticas na Rússia enquanto as podia evitar; mas
tive que estudar o que acontecia na indústria Soviética para poder fazer um bom
trabalho. E estou firmemente convencido de que Stalin e os seus colaboradores
levaram muito tempo até descobrir que os comunistas revolucionários
descontentes eram os seus inimigos mais perigosos". Littlepage escreveu
também que a sua própria experiência confirmava as declarações oficiais de que
uma conspiração conduzida do exterior se utilizava de uma grande sabotagem
industrial como uma parte de um processo para fazer cair o governo. Já em 1931
Littlepage tinha sido obrigado a constatar isso durante um trabalho nas minas
de cobre e chumbo no Ural e no Kasaquistão. As minas eram uma parte do grande
complexo de cobre-chumbo cujo chefe máximo era Piatakov, o vice comissário do
povo para a indústria pesada. O estado das minas era catastrófico no que diz
respeito à produção e ao bem estar dos trabalhadores. A conclusão de Littlepage
foi de que havia uma sabotagem organizada proveniente da direção superior do
complexo de cobre-chumbo.
O livro de John Littlepage dá-nos também a conhecer de onde a oposição
trotskista recebia o dinheiro necessário para pagar a atividade contrarrevolucionária.
Vários membros da oposição secreta utilizavam os seus postos na União Soviética
para aprovar a compra de máquinas de certas fábricas no estrangeiro. Os
produtos aprovados eram de uma qualidade muito baixa mas eram pagos pelo
governo soviético ao preço mais alto. As fábricas estrangeiras davam à
organização de Trotski no estrangeiro o ganho econômico de tais transações, em
troca do que Trotski e os seus conjurados na União Soviética continuavam a
fazer mais compras dessas fábricas.
Roubo e corrupção.
Este procedimento foi constatado por Littlepage em Berlim na primavera
de 1931 quando da compra de elevadores industriais para as minas. A delegação
soviética era chefiada por Piatakov, sendo Littlepage o especialista
encarregado de verificar a qualidade dos elevadores e aprovar a compra.
Littlepage descobriu a fraude com os elevadores de má qualidade, inúteis para a
União Soviética, mas quando comunicou o fato a Piatakov e aos outros membros da
delegação soviética foi recebido de uma maneira fria como se quisessem fugir
aos fatos e continuando a exigir que ele aprovasse a compra dos elevadores.
Littlepage não aprovou. Na altura pensou que o que se passava era uma questão
de corrupção pessoal e que os membros da delegação recebiam subornos da fábrica
de elevadores. Mas depois de Piatakov, no julgamento de 1937, ter confessado a
sua ligação à oposição trotsquista, Littlepage foi obrigado a constatar que o
que ele tinha observado em Berlim era muito mais do que corrupção a nível
pessoal. O dinheiro em causa era destinado ao pagamento das atividades da
oposição secreta na União Soviética, atividades essa que compreendiam
sabotagem, terrorismo, subornos e propaganda.
Zinoviev, Kaménev, Piatakov, Radek, Smirnof, Tomski, Boukharine e outros
tão queridos à imprensa ocidental burguesa, utilizavam-se dos postos que o povo
soviético e o partido lhes tinha dado, para roubar dinheiro ao estado, para que
esse dinheiro fosse utilizado pelos inimigos do socialismo no estrangeiro na
sabotagem e no combate à sociedade socialista na União Soviética.
Planos para golpe de
estado
O
tipo do crime no que diz respeito a roubo, sabotagem e corrupção é um crime
sério, mas as atividade da oposição iriam muito mais longe. A conspiração
contrarrevolucionária preparava-se para tomar o poder com um golpe
de estado no qual toda chefia soviética seria eliminada, começando pelo
assassínio das pessoas mais importantes do comitê central do partido comunista.
A parte militar do golpe de estado seria realizada por um grupo de generais
encabeçado pelo marechal Toukhatchevski. Segundo Issak Deutsher, o trotskista
que escreveu muitos livros contra Stalin e a União Soviética, o golpe de estado
seria iniciado com uma operação militar contra o Kremlin e contra as tropas
mais importantes nas grandes cidades como Moscou e Leningrado. A conspiração
era, segundo Deutscher, chefiada por Toukhatchevski em conjunto com Gamarnik,
chefe dos comissários politicos do exército, o general Iakir, comandante de
Leningrado, o general Ouborévitch, comandante da academia militar de Moscou e o
general Primakov um dos chefes da cavalaria.
O marechal Toukhatchevski era um oficial do antigo exército czarista que
depois da revolução se tinha passado para o Exército Vermelho. Em 1930 cerca de
10% dos oficiais, ou seja cerca de 4.500, eram antigos oficiais czaristas.
Muitos deles nunca tinham deixado as suas posições burguesas e esperavam na
calada uma oportunidade para lutarem por elas. A oportunidade apareceu quando a
oposição se preparava para dar um golpe de estado. Os bolcheviques eram fortes
mas as conspirações civil e militar também trataram de arranjar amigos fortes.
Segundo a confissão de Boukharine no julgamento publico em 1938, existia um
acordo feito entre a oposição trotskista e a Alemanha nazi, no qual grandes
regiões, entre elas a Ucrânia, seriam dadas à Alemanha nazi depois do golpe de
estado contrarrevolucionário na União Soviética. Este era o pagamento exigido
pela Alemanha nazi pelo apoio prometido aos contrarrevolucionários. Boukharin
tinha sido informado deste acordo por Radek que sobre a questão tinha recebido
uma diretiva de Trotski. Todos estes conspiradores que tinham sido eleitos para
altas posições, para chefiar, administrar e defender a sociedade socialista,
trabalhavam na realidade para destruir o socialismo. Além do mais é preciso não
esquecer que tudo isto se passou no decênio de 1930 quando o perigo nazista
crescia sem parar e os exércitos nazistas punham a Europa a arder e preparavam
uma invasão da União Soviética. Os conspiradores foram condenados à morte como
traidores em julgamento público. Os culpados de sabotagem, terrorismo,
corrupção, tentativa de assassínio e que queriam dar uma parte do país aos
nazistas não podiam esperar outro fim. Chamar-lhes vítimas é um erro total.
Mais números
mentirosos
É interessante saber como a propaganda ocidental, através de Robert
Conquest, tem mentido sobre as depurações no Exército Vermelho. Conquest diz no
seu livro "O grande terror" que em 1937 havia 70.000 oficiais e
comissários políticos no Exército Vermelho e que 50% desses, ou seja 15.000
oficiais e 20.000 comissários, tinham sido presos pela polícia política e que
tinham sido executados ou aprisionados para o resto da vida nos campos de
trabalho. Nesta afirmação de Conquest, aliás como em todo o livro, não existe
nada de verdade. O historiador Roger Reese no seu trabalho "The Red Army
and the Great Purges" dá-nos fatos e mostra o verdadeiro significado que
as depurações de 1937-38 tiveram para o exército. O número de pessoas em
posição de chefia no Exército Vermelho e na aviação, ou seja oficiais e
comissários políticos, era de 144.300 em 1937 crescendo para 282.300 até 1939.
Durante as depurações de 1937-38 foram despedidos 34.300 oficiais e comissários
por motivos políticos, mas antes de maio de 1940 já 11.596 tinham sido
reabilitados e reintegrados nos seus postos. Isto significa que durante as
depurações de 1937-38 foram despedidos 22.705 oficiais e comissários políticos
(cerca de 13.000 oficiais do exército, 4.700 da aviação e 5.000 comissários políticos)
o que é 7,7% de todos os oficiais e comissários e não 50% como Conquest diz.
Desses 7,7%, foi uma parte condenada como traidores, mas para a grande maioria
o material histórico à disposição indica terem passado à vida civil.
Uma última pergunta. Os julgamentos de 1937-38 foram justos para com os
acusados? Vejamos por exemplo o julgamento de Boukharine, o funcionário mais
alto do partido que trabalhava para a oposição secreta. Segundo o embaixador
americano em Moscou nessa altura, um conhecido advogado de nome Joseph Davies
que esteve no tribunal durante todo o julgamento, foi permitido a Boukharine
falar livremente durante todo o julgamento e expor o seu caso sem qualquer impedimento.
Joseph Davies escreveu para Washington que durante o julgamento se mostrou que
os acusados eram culpados "dos crimes que se comprovaram" e que
"A opinião geral entre os diplomatas que assistiram ao processo é de que
se provou a existência de uma conspiração muito grave".
Aprendamos com a história!
A discussão do sistema correcional soviético durante o tempo de Stalin,
sobre o qual se têm escrito milhares de artigos e livros mentirosos e se têm
filmado centenas de filmes falsos, dá-nos conhecimentos importantes. Os fatos
mostram-nos mais uma vez que as histórias sobre o socialismo publicadas na
imprensa burguesa são na sua maioria falsas. A direita através da imprensa, rádio
e televisão que domina, pode confundir e distorcer a realidade e fazer que
grande quantidade de pessoas venham a considerar mentiras declaradas como
verdades. Isto é especialmente verdade no que se refere a questões históricas.
Novas histórias da direita devem portanto ser encaradas como falsas até que o
contrário seja demonstrado.
Esta atitude cautelosa tem razão de ser. O fato é que mesmo tendo
conhecimento dos relatórios russos a direita continua a reproduzir as mentiras
que ensina há mais de 50 anos e que já foram totalmente desmascaradas. A
direita segue a sua herança histórica: uma mentira repetida muitas vezes, acaba
por ser dada como verdade. Depois dos relatórios dos investigadores russos
terem sido publicados no ocidente, começaram a ser editados em vários países um
número de livros, com a única finalidade de dar ao esquecimento os relatórios
russos e fazer com que as velhas mentiras venham a público como verdades novas.
São livros com boa apresentação, de capa a capa só com mentiras
sobre o comunismo e o socialismo.
As mentiras da direita são repetidas para combater os comunistas de
hoje! São feitas para que os trabalhadores não encontrem uma alternativa ao
capitalismo e ao neoliberalismo. São uma parte da guerra suja contra os
comunistas que têm uma alternativa para o futuro, a sociedade socialista. Essa
é a causa dos livros novos com mentiras velhas.
Tudo isto impõe obrigações a todos os que têm uma visão socialista da
história. Cabe a nós tomar a responsabilidade de trabalhar para fazer dos
jornais comunistas, autênticos jornais das classes trabalhadoras, para dar combate
às mentiras da burguesia! Esta é sem dúvida uma missão importante na luta de
classes de hoje que num futuro próximo se desenvolverá com novas forças.
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