Roberto F. Costa
Voltaire
afirmava que os homens nascem e morrem, no infindável suceder das gerações,
deixando como marco de sua passagem pelo planeta, apenas uma possível
contribuição para a evolução da humanidade.
Dizia
também, que a vasta maioria dos homens somente servia para reproduzir
exatamente o sistema que receberam da geração imediatamente antecedente, em
nada contribuindo para a evolução do homem enquanto espécie, o que era
sintetizado no adágio "nos numerus summus et consumere fruges nati"
(=nós nascemos apenas para fazer número e consumir os frutos da terra), que
equivale a dizer que a imensa maioria da população mundial não serve para nada,
e que a humanidade só avança pela diligência de uns poucos.
Por
outro lado, Mikhail Bakunin alegava que atrás de nós, no nosso passado, temos a
animalidade, quando andávamos de quatro e temíamos a lua, o sol e os raios como
deuses, depois passando a humanidade pelo estágio intermediário de predomínio
dos deuses e mitos, quando estava apenas genuflexa a divindades, somente com o
advento da ciência do século XX se permitindo levantar e caminhar, altivo e
altaneiro, com o olhar fixo em sua humanidade, um ideal a alcançar.
Veja
que o super-homem de Friedrich Nietzsche não tem nenhum dos super-poderes de
seu homônimo ianque, mero plágio mal-disfarçado, mas é aquele que finalmente
assumiu a consciência e as conseqüências de sua humanidade, a responsabilidade
sobre seu futuro, antes deixada a cargo dos projetos divinos. Morto deus, está o
homem órfão e sozinho, somente tendo a si próprio como medida das coisas...
Não
sabemos sobre o senso que anima a moira Láquesis, de nada adiantando apelar à
sua mãe Themis, que é indiferente a tais reclamações; e como não sabemos o dia
da nossa morte, temos que fazer com que cada dia tenha valido algo, e não
apenas o passar do tempo, comendo, transando e entorpecendo os sentidos para
esquecer o objetivo maior, que é a humanização.
Mas
veja que o homem tem seu expoente máximo no reino das idéias e significados e,
assim, se algum sentido teleológico pode haver para nossa existência, esse só
pode ser encontrado no terreno da cultura.
Rhett
Butler, o personagem de Clark Gable, em "Gone With the Wind..." era
um sulista cínico, certo da supremacia militar do Norte na Guerra de Secessão,
e portanto convencido da inevitável derrocada das forças sulistas. Apesar
disso, mesmo se mantendo neutro durante toda a guerra civil, alistou-se com o
General Lee quando não havia mais a possibilidade de vitória, preferindo cerrar
fileiras com os derrotados do momento por uma questão de honra, em que pese com
isso mais uma vez comprando o ódio de seu amor Scarlet O'Hara, interpretado
pela linda Vivien Leigh.
É
o eterno conflito na alma humana entre o feijão e o sonho, imortalizado por
Orígenes Lessa, onde tentamos a todo momento ponderar entre a satisfação
hedonista da nossa existência imediata e a compulsão pela transcendência, de
sermos mais importantes do que uma simples máquina comedora de alimentos e
fazedora de cocô.
Morreremos
todos, é certo. Mas se diferença existe entre uma vida e outra, a honradez é o
fiel da balança na qual as pesamos. Se podemos classificar de poética a atitude
de Rhett Butler, é porque a poesia, comum a toda arte, é uma recriação
idealizada da realidade e portanto a estrela que perseguimos almejando nossa
humanidade.
Em
suma, se existe sentido para a vida, só pode ser encontrado na dedicação a uma
causa na qual acreditamos, mesmo sabendo que jamais colheremos o resultado de
uma possível longínqua vitória, mas sim que ajudamos a asfaltar a estrada das
futuras gerações em seu caminho para a humanização; mesmo sabendo que nosso
trabalho e vida serão por elas ignorados a nível individual, ou que nosso
sacrifício pode ser vão ou inócuo, que nossa utopia seja irrealizável, mas com
a certeza de que vivemos e morremos como homens, e não como animais
irracionais...
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