sexta-feira, 1 de abril de 2016

POR QUE É UM VERDADEIRO GOLPE DE ESTADO ?


Othoniel Pinheiro Neto*

É preciso que se deixe bem claro que o impeachment é uma sanção política de caráter excepcional decorrente da prática de crime de responsabilidade do Presidente da República.

É excepcional, porque somente em hipóteses de grave violação à Constituição é que poderá haver a quebra de um mandato do Chefe do Poder Executivo eleito pelo povo para ocupá-lo.

Trata-se de um julgamento político-jurídico porque existe o juízo de admissibilidade da Câmara dos Deputados (este sim, um julgamento de índole política) e um efetivo julgamento pelo Senado Federal, quando deverão ser respeitados o devido processo legal e apontado, de forma estrita, qual o crime de responsabilidade que foi cometido em harmonia com a lei.

No atual processo de impeachment, a inexistência de crime de responsabilidade fica evidenciada quando se constata que a denúncia não aponta violações à lei orçamentária (art. 10 da Lei nº 1.079/50), mas, sim, supostas violações à Lei de Responsabilidade Fiscal configuradas pela inovação da orientação do TCU após as práticas apontadas como ilícitas que embasam o pedido de impeachment. Nessa situação, os gestores públicos somente teriam a obrigação de seguir a nova orientação do TCU após a mudança do entendimento, o que não se aplica à infração apontada como fundamento do processo de impeachment contra o Governo Dilma, que praticou as “pedaladas fiscais” antes da nova orientação do TCU, que apontou como irregulares tais condutadas. De toda forma, não há, nessa hipótese, violação tipificada na lei nº 1.079/50, ou seja, não existe violação à lei orçamentária, razão pela qual, improcede o pedido de impeachment.

No entanto, o caráter golpista dessa marcha está em algo muito mais grave.

No atual estágio de nossa democracia constitucional, é indispensável, em quaisquer julgamentos de ilícitos, que os julgadores comportem-se de maneira imparcial e totalmente desprovida de paixões, uma vez que deverão analisar a existência de condutas típicas e ilícitas para aplicações de penalidades previstas. Não é sem razão, que aos magistrados são direcionadas determinadas garantias e vedações.

Assim, um julgamento de um crime de responsabilidade movido por paixões, por negociatas de toda ordem, por ódio e por insatisfação com derrotas eleitorais, compromete, não somente o devido processo legal, mas também toda a segurança jurídica de nossa República, uma vez que se abrirá a oportunidade de derrubar um Presidente da República por questões de maioria parlamentar, em que a real discussão a respeito do crime de responsabilidade somente serviria de pretexto para mascarar uma realidade não amparada constitucionalmente: a derrubada do Chefe do Executivo que não possui maioria no Parlamento ou a hipótese de eleição indireta.

Por isso, o atual cenário mostra, de forma clara, a construção de um golpe de Estado.

É público e notório no Brasil, que os derrotados nas eleições de 2014, desde a proclamação do resultado das urnas, não fazem outra coisa a não ser tentar reverter o quadro da derrota. Nesse panorama, tipificação de crime de responsabilidade é o que menos importa.

Neste momento de paixões exacerbadas e descontrole emocional, manipulados por patinhos da FIESP e por mídias com tenebrosas intenções, é preciso ter prudência para não jogarmos fora toda uma construção democrática e constitucional.

Racionalidade é o melhor caminho.

*Doutor em Direito pela UFBA e Professor de Direito Constitucional

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