"Para mim, é mais barato comprar, nos próximos cinco anos,
na Coreia do Sul, em Cingapura... Mas eu acabo forçado (pelo governo e leis federais) a comprar aqui.
Se me deixarem livre, vou comprar onde for mais barato e não vou criar
emprego no Brasil." - Eike Batista
Eike prevê até '20 anos de crescimento contínuo' no Brasil
Materia de 1 de julho, 2011 - 15:36 (Brasília) 18:36 GMT
O empresário Eike Batista,
presidente-executivo do grupo EBX, disse em entrevista à BBC que prevê
pelo menos “20 anos de crescimento contínuo” no Brasil, mas ressaltou a
necessidade de investir na infraestrutura do país.
"Nossos portos são jurássicos, e nossos
aeroportos estão em estado lamentável", diz o empresário, antes mesmo do
início das perguntas na entrevista que concedeu à editora de economia
da BBC, Stephanie Flanders, em seu escritório no Rio de Janeiro.Eike comentou os planos de construir o superporto do Açu, na cidade de São João da Barra (litoral norte do Rio de Janeiro), que ele definiu como a futura “Roterdã” da América do Sul.
O homem mais rico do Brasil, de acordo com a revista Forbes, ressaltou que, que se não fosse forçado pela regulamentação em vigor no país, iria comprar onde fosse mais barato e deixaria de investir no pais.
Mesmo reconhecendo que não dá para “competir com os sul-coreanos”, Eike defendeu o renascimento da indústria naval, em nome da criação de empregos e do desenvolvimento nacional.
Leia a entrevista concedida pelo empresário.
BBC - Por que construir um superporto?
Eike Batista - Temos uma mineradora gigante e precisamos dessa infraestrutura. Se você depende de alguém, isso pode diminuir suas margens (de ganho). A conseqüência é (construir) todo um sistema de logística. Nesse caso as minas, os dutos ou ferrovia até o porto, e o porto em si. O sudeste do Brasil concentra 75% do nosso PIB, e nós não temos portos eficientes. A China é a fábrica do mundo porque construiu serviços portuários gigantescos, que ofereceram (oportunidades) de negócio, conectando importantes sistemas de logística. Açu será a Roterdã da América do Sul.
BBC - Sobre o seu porto, alguns críticos diriam: parece ótimo, mas é a velha ideia de o Brasil vender commodities, não produtos com valor agregado. É isso?
"Vejo dez ou 20 anos de crescimento contínuo. A China coloca 20 milhões de pessoas no mercado de consumo todo ano. O Brasil coloca dois milhões. A Índia coloca três milhões. Nós vivemos um ciclo em que o mundo é global. Os recursos do mundo estão mapeados, e nós temos muito no Brasil. A natureza nos ajuda." -Eike Batista
BBC - Você acha que o fato de o Brasil exportar commodities e não produtos de valor agregado é um problema?
Eike - No passado foi. Vivemos hoje um ciclo em que a China não vai parar de crescer, talvez não a 10% ou a 11%, mas não menos que 8%. Ferro e aço são fundamentais para uma nação. Se você olhar para os trens de alta velocidade, as cidades, o sistema de metrô...
BBC - Mas eles estão desenvolvendo tecnologia. E as exportações chinesas no Brasil estão crescendo.
Eike - O Brasil era o segundo maior produtor de navios do mundo nos anos 1980. Acabou que tivemos 20 anos de política liberal e pensamos: vamos comprar nossos navios fora. Aí o presidente Lula criou essa obrigação de produto nacional, quando a agência nacional de petróleo trabalhou (licitou a exploração) com os blocos de petróleo. Se você ganhar um bloco, terá de empregar pelo menos 70% de produtos brasileiros. É uma política industrial muito bem arquitetada, baseada no petróleo. Sem o meu estaleiro, eu não conseguiria empregar 70% de produto nacional (nas plataformas de exploração). Eu até poderia, mas teria de usar estaleiros ineficientes, que me sairia uns 40% mais caro. Por isso estou fazendo o porto do Açu.
BBC - A falta de infraestrutura é um problema no Brasil?
Eike - Sim, é. As pessoas se dão por satisfeitas por produzirem soja de maneira eficiente no interior, mas não se importam com o fato de haver 200 km de fila de caminhões esperando para carregá-la no porto de Paranaguá. Eles então perdem 40% da eficiência. Açu vai ajudar a dissolver este problema. Nós seremos capazes de lidar com 350 milhões de toneladas de produtos, petróleo, minério de ferro, contêineres. Todas as indústrias querem produzir lá, porque nosso estaleiro vai atrair muitos parques de produção. E, em vez de 18% de imposto, teremos apenas 2%, porque é considerada área de desenvolvimento. A garantia de produção é baseada em custos muito baixos de produção. Nós não dependemos do mercado. O mercado depende do que iremos produzir.
BBC - Com o Real tão forte, muitos podem dizer que, quando o senhor inaugurar sua Roterdã, já não haverá o que vender.
Eike - Você deve se dar contar do seguinte: o mercado brasileiro é 90% do PIB. Nós só exportamos 11% do nosso PIB. É o mercado interno que está empurrando a economia. Apenas 4% de nosso PIB são hipotecas. Nos EUA são 60%, 70%. Esse país é totalmente desalavancado. Nós estamos vivendo o ciclo que os EUA tiveram nos anos 1960. Em 2020, apenas a nossa produção e da Petrobras saltará de dois milhões de barris hoje para seis milhões. E não estou incluindo soja e minério de ferro. Com mais dois bilhões de pessoas chegando ao mercado de consumo...
BBC - Mas eles vão comprar produtos chineses, não brasileiros.
BBC - Mas isso não significa que as pessoas vão comprar 70% de produtos brasileiros nas lojas.
Eike - No caso da indústria do petróleo, sim. O grande motor da economia do Brasil será o petróleo. No caso da indústria naval, quem pensar em vir ao Brasil terá benefícios fiscais. O governo está interessado em promover a indústria naval.
BBC - Se eu conversasse com um empresário dos EUA ou no Reino Unido, eles diriam que querem o apoio do governo. Mas não diriam que querem proteção, 70% dos produtos nacionais. Este é o modelo brasileiro?
Eike - Cingapura é um dos países mais bem administrados do mundo. Eles não tinham empreendedores. Foi o governo quem induziu as indústrias. No Brasil, pouco empreendedores se arriscam. Porque a China é uma força na indústria? Eles (governo) estão empregando uma grande quantidade de capital em suas empresas. Até nos EUA. Veja a Nasa... Se há bons cérebros no governo e eles entendem o mercado, então deixe o governo induzir o crescimento. Para mim, é mais barato comprar, nos próximos cinco anos, na Coreia do Sul, em Cingapura... Mas eu acabo forçado a comprar aqui. Se me deixarem livre, vou comprar onde for mais barato e não vou criar emprego no Brasil.
"Para mim, é mais barato comprar, nos próximos cinco anos, na Coreia do Sul, em Cingapura... Mas eu acabo forçado a comprar aqui. Se me deixarem livre, vou comprar onde for mais barato e não vou criar emprego no Brasil."
Eike Batista
Eike - Se não tivéssemos um mercado interno, eu nunca conseguiria montar meu estaleiro. A Petrobras é tão grande que só o que eles compram já induziria a instalação de mais dois estaleiros. Será muito difícil competir nos próximos sete anos com os sul-coreanos, porque eles têm trabalhadores muito eficientes. Mas o petróleo é nosso.
BBC - O seu porto me lembra a política de substituição de importações dos anos 1960. É uma volta ao modelo?
Eike - Se você tem um mercado interno, tem controle da matéria-prima, pode agregar valor ao forçar a produção local. Se eu comprar um carro da Alemanha, será metade do preço. Mas há 14 montadoras no país, e os chineses estão chegando. Por quê? Porque é a única forma de ter acesso ao mercado brasileiro. É o modelo da China. Você quer o meu mercado? Construa aqui. Nós estamos criando 2,5 milhões de postos de trabalho por ano.
BBC - Mas eles estão consumindo produtos chineses...
Eike - Por enquanto, por enquanto. O IPad está vindo para o Brasil. Se compro um IPad aqui, me custa 2,5 vezes o que pagaria em Nova York.
BBC - A crise deixou desacreditada a ideia de que se deve abrir os mercados para tudo?
Eike - Acho que sim, porque nós nunca poderíamos competir (em certos setores). Meu projeto começa com 35% da eficiência dos sul-coreanos.
BBC - O senhor está dizendo que não pode competir, então...
Eike - Não, não... Eu preciso de investimentos, da metodologia de construção. Vou conseguir 80% da eficiência sul-coreana nos próximos cinco anos. Tudo bem. O país estará criando e preservando empregos, porque há 100 bilhões de barris (no fundo do mar), e esta (naval) será uma indústria pelos próximos cem ou 150 anos.
BBC - No Brasil a burocracia é pesada, o custo de contratar alguém é grande... Isso tende a mudar?
Eike - Nós nunca vamos chegar à eficiência da Coreia do Sul, mas é o petróleo brasileiro quem esta pagando a conta. Nos últimos anos, tivemos de tirar 120 licenças ambientais...Eu tenho empreendimento no Chile e a burocracia não é menor, na Colômbia não é menor.
BBC - O Brasil já viveu tempos de bonança na economia, com retração depois. O senhor acha que desta vez será diferente?
Eike - Vejo dez ou 20 anos de crescimento contínuo. A China coloca 20 milhões de pessoas no mercado de consumo todo ano. O Brasil coloca dois milhões. A Índia coloca três milhões. Nós vivemos um ciclo em que o mundo é global. Os recursos do mundo estão mapeados, e nós temos muito no Brasil. A natureza nos ajuda.
BBC - Mas vocês retiram a riqueza do solo, não produzem...
Eike - Nós estamos criando os produtos finais, por isso o Brasil diz: venha e produza aqui. Por isso eu sou um dos empresários que esta investindo em eficiência. Estamos buscando a eficiência dos alemães, e os queremos no porto do Açu. Por que eles não vieram na última década? Falando com alemães, japoneses, eles dizem: “Nós adoramos seu pais, 200 milhões de consumidores em potencial. Mas não sabemos como entrar nem como sair”. E isso, logisticamente falando. Um navio, para atracar no Brasil, deve reservar quatro dias extras. O contêiner pode ficar até 60 dias no terminal. Você tem a burocracia dos portos públicos, possíveis greves de estivadores, e eventual corrupção na alfândega. É um desastre.
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