14 de julho de 2005 • 14h31 • atualizado às 14h41 via BBC/TERRA
Karl Marx (1818-1883) foi eleito pelos ouvintes da Radio 4, da emissora pública britânica BBC, "o filósofo mais importante da história" . O autor de O Capital pode ter perdido espaço no Leste europeu e seu nome pode ter desaparecido de praças e ruas, mas seu prestígio parece ter sobrevivido à queda do muro de Berlim, pelo menos no Reino Unido.
Marx recebeu 28% dos 30 mil votos dos ouvintes, muito na frente do segundo lugar, o escocês David Hume.
Os jornalistas da revista The Economist tentaram, em vão, fazer uma campanha entre seus leitores para angariar votos a favor de Hume, grande representante do empirismo e defensor de um ceticismo moderado, como única forma de frear Marx.
Hume, pensador anti-dogmático que influenciou na filosofia moral e nos trabalhos econômicos do amigo Adam Smith, o maior dos economistas clássicos, obteve apenas 12,7% dos votos.
Outros meios britânicos apoiaram diferentes filósofos. O jornal The Guardian, de centro-esquerda, apadrinhou outro alemão, Immanuel Kant, que ficou em sexto.
Com certo esnobismo, um jornal mais a esquerda, The Independent, inclinou-se pelo austríaco Ludwig Wittgenstein, iniciador da chamada Filosofia Analítica do século XX, que ficou em terceiro da lista.
Vários famosos pediram voto para filósofos como o imperador romano Marco Aurelio, Friedrich Nietzsche e o dinamarquês Soren Kierkegaard.
Platão, considerado por muitos o maior pensador de todos os tempos, ficou em quinto lugar, com 5,65%, imediatamente atrás de Nietzsche (6,49%).
Nietzsche recebeu mais votos do que Kant, que obteve 5,61% e ficou em sexto, que São Tomás de Aquino (4,82%) e que os gregos Sócrates (4,82%) e Aristóteles (4,52%).
Karl Popper foi o menos votado dos dez filósofos (4,20%), muito abaixo de seu compatriota e antigo rival de Oxford, Wittgenstein.
O filósofo votado pelos ouvintes como o maior de todos os tempos esteve por certo muito vinculado ao Reino Unido, onde foi jornalista, pesquisou o fenômeno da era industrial e foi durante anos assíduo visitante do Museu Britânico.
Seu túmulo, enfeitado com seu busto e que recebe homenagem dos partidos comunistas de todos os países, está no cemitério de Highgate, no norte da capital.
A popularidade de Marx é explicada pelo historiador marxista Eric Hobsbawm pelo fato de que, com o fim do comunismo, o autor de O Manifesto Comunista tenha sido libertado da deformação de seu pensamento nos antigos países do chamado socialismo real.
A feminista americana Camille Paglia se queixa de que na lista da BBC apareçam só filósofos homens e propõe uma formada exclusivamente por pensadoras, que inclui Simone de Beauvoir, Hannah Arendt, Mary Wollstonecraft e a neo-platônica Hipátia, de Alexandria, que viveu entre os anos 370 e 415 d.C. e foi matemática e astrônoma.
Por que Marx segue tão atual?
via Carta Maior 16/07/2005
A BBC já havia noticiado de que Marx liderava a lista dos maiores filósofos de todos os tempos em pesquisa que estava realizando, como que apelando para alguma articulação paralela que evitasse essa vitória. A revista The Economist foi buscar, no fundo do baú dos filósofos clássicos, e decidiu que aquele que poderia fazer frente ao barbudo subversivo era... David Hume – talvez considerando que o David poderia ser associado a Beckham e dar popularidade ao empirista inglês. Outros apelaram para Wittgenstein, para Kant, Nietszche e quase para Churchill.
Não deu: Marx foi eleito, pelos ouvintes da BBC – a vetusta emissora estatal britânica, durante o terceiro mandato da “terceira via” de Tony Blair, sob o patronato teórico de Antony Giddens – o maior filósofo de todos os tempos.
Passada a euforia do curto ciclo expansivo da economia dos EUA nos anos 90, que teve em Davos, na Microsoft e no McDonalds seus ícones, depois que se deram conta de que as promessas da “nova economia” de que o capitalismo a partir do toque de Midas dos computadores cresceria sem parar, eram falácias, algumas publicações conservadoras voltaram a dar valor a Marx. Mas, atenção! Conforme o capitalismo de mercado se estendia a zonas inesperadas do mundo – da China às empresas públicas privatizadas, da exploração do trabalho escravo e de crianças à exploração do trabalho de presidiários – e conforme se revelava dramaticamente que as análises de Marx sobre as crises cíclicas continuavam a acompanhar o capitalismo como sua pele insuperável – de que a crise, acompanhada dos maiores escândalos da sua história econômica, dos EUA, a crise do sudeste asiático, do Brasil, da Argentina, eram apenas alguns novos exemplos -, Marx era revalorizado.Mas apenas como analista.
Como tantos “ marxólogos” ou ex-marxistas convertidos a Witgenstein, a Kant ou a Foucault, passou-se a separar o Marx analista do Marx político.
Mas então, por que Marx? Por que ele foi eleito o maior filósofo de todos os tempos, no país do apóstolo fundador do liberalismo, John Locke, por um órgão conservador de imprensa?
Porque a obra de Marx segue sendo o instrumento fundamental para a compreensão do mundo contemporâneo, um século e meio depois de ser escrita. Tantos que “abandonaram” o marxismo, o substituíram por que visão do mundo?
Enquanto isso, é no marco das análises de Marx que se consegue inteligibilidade do mundo contemporâneo, dominado cada vez mais pela lógica do capital, da mercadoria, das crises cíclicas. Mas também pela lógica da luta de classes, quando o capitalismo liberal reproduz da forma mais aguda as contradições entre proprietários do capital e a esmagadora maioria da humanidade, que vive do seu trabalho.
O reconhecimento de Marx como o maior filósofo de todos os tempos só recoloca com força suas idéias e o seu método – a dialética -, como marcos insuperáveis de compreensão e de proposta de transformação revolucionária do mundo.
Marx recebeu 28% dos 30 mil votos dos ouvintes, muito na frente do segundo lugar, o escocês David Hume.
Os jornalistas da revista The Economist tentaram, em vão, fazer uma campanha entre seus leitores para angariar votos a favor de Hume, grande representante do empirismo e defensor de um ceticismo moderado, como única forma de frear Marx.
Hume, pensador anti-dogmático que influenciou na filosofia moral e nos trabalhos econômicos do amigo Adam Smith, o maior dos economistas clássicos, obteve apenas 12,7% dos votos.
Outros meios britânicos apoiaram diferentes filósofos. O jornal The Guardian, de centro-esquerda, apadrinhou outro alemão, Immanuel Kant, que ficou em sexto.
Com certo esnobismo, um jornal mais a esquerda, The Independent, inclinou-se pelo austríaco Ludwig Wittgenstein, iniciador da chamada Filosofia Analítica do século XX, que ficou em terceiro da lista.
Vários famosos pediram voto para filósofos como o imperador romano Marco Aurelio, Friedrich Nietzsche e o dinamarquês Soren Kierkegaard.
Platão, considerado por muitos o maior pensador de todos os tempos, ficou em quinto lugar, com 5,65%, imediatamente atrás de Nietzsche (6,49%).
Nietzsche recebeu mais votos do que Kant, que obteve 5,61% e ficou em sexto, que São Tomás de Aquino (4,82%) e que os gregos Sócrates (4,82%) e Aristóteles (4,52%).
Karl Popper foi o menos votado dos dez filósofos (4,20%), muito abaixo de seu compatriota e antigo rival de Oxford, Wittgenstein.
O filósofo votado pelos ouvintes como o maior de todos os tempos esteve por certo muito vinculado ao Reino Unido, onde foi jornalista, pesquisou o fenômeno da era industrial e foi durante anos assíduo visitante do Museu Britânico.
Seu túmulo, enfeitado com seu busto e que recebe homenagem dos partidos comunistas de todos os países, está no cemitério de Highgate, no norte da capital.
A popularidade de Marx é explicada pelo historiador marxista Eric Hobsbawm pelo fato de que, com o fim do comunismo, o autor de O Manifesto Comunista tenha sido libertado da deformação de seu pensamento nos antigos países do chamado socialismo real.
A feminista americana Camille Paglia se queixa de que na lista da BBC apareçam só filósofos homens e propõe uma formada exclusivamente por pensadoras, que inclui Simone de Beauvoir, Hannah Arendt, Mary Wollstonecraft e a neo-platônica Hipátia, de Alexandria, que viveu entre os anos 370 e 415 d.C. e foi matemática e astrônoma.
Por que Marx segue tão atual?
via Carta Maior 16/07/2005
Quando a revista Time fez uma consulta aos leitores para escolher o personagem do século XX, apavorada com os resultados, fez correr a notícia de que Hitler estava em primeiro lugar, em um desesperado apelo aos leitores para brecar esse acesso de sinceridade dos que se haviam pronunciado. Uma articulação paralela levou á vitória de Einstein – em uma homenagem inócua à “ciência”, a partir da teoria da relatividade, sobre a qual a maioria esmagadora dos leitores da Time não entende o significado. Mas foi salva a cara.
A BBC já havia noticiado de que Marx liderava a lista dos maiores filósofos de todos os tempos em pesquisa que estava realizando, como que apelando para alguma articulação paralela que evitasse essa vitória. A revista The Economist foi buscar, no fundo do baú dos filósofos clássicos, e decidiu que aquele que poderia fazer frente ao barbudo subversivo era... David Hume – talvez considerando que o David poderia ser associado a Beckham e dar popularidade ao empirista inglês. Outros apelaram para Wittgenstein, para Kant, Nietszche e quase para Churchill.
Não deu: Marx foi eleito, pelos ouvintes da BBC – a vetusta emissora estatal britânica, durante o terceiro mandato da “terceira via” de Tony Blair, sob o patronato teórico de Antony Giddens – o maior filósofo de todos os tempos.
O resultado, imprevisto para os apostadores da Bolsa de Londres, colocou a Marx em primeiro lugar, com 28% dos votos. Isto é, quase um de cada três ouvintes da BBC escolheu a Marx como o maior filósofo de todos os tempos.
Bem antes da BBC, Marx já havia recebido outras consagrações, como a de Sartre:
“O marxismo é a filosofia insuperável de nosso tempo”.
Porém, desde o fim da URSS, a direita se apropriou da idéia de que “a roda da história não volta para trás”, de que o horizonte insuperável da história é o da economia capitalista de mercado e o da democracia liberal e de que a liberdade se identifica com o “livre comércio”.
Passada a euforia do curto ciclo expansivo da economia dos EUA nos anos 90, que teve em Davos, na Microsoft e no McDonalds seus ícones, depois que se deram conta de que as promessas da “nova economia” de que o capitalismo a partir do toque de Midas dos computadores cresceria sem parar, eram falácias, algumas publicações conservadoras voltaram a dar valor a Marx. Mas, atenção! Conforme o capitalismo de mercado se estendia a zonas inesperadas do mundo – da China às empresas públicas privatizadas, da exploração do trabalho escravo e de crianças à exploração do trabalho de presidiários – e conforme se revelava dramaticamente que as análises de Marx sobre as crises cíclicas continuavam a acompanhar o capitalismo como sua pele insuperável – de que a crise, acompanhada dos maiores escândalos da sua história econômica, dos EUA, a crise do sudeste asiático, do Brasil, da Argentina, eram apenas alguns novos exemplos -, Marx era revalorizado.Mas apenas como analista.
Como tantos “ marxólogos” ou ex-marxistas convertidos a Witgenstein, a Kant ou a Foucault, passou-se a separar o Marx analista do Marx político.
Aquele seria resgatável, para tentar prevenir as crises do capitalismo, para entender fenômenos de produtividade do trabalho, para calcular a taxa de exploração da força de trabalho. Mas o político seria um desastre. Seus “prognósticos” teriam resultados em quimeras – revolução no centro do capitalismo – ou em desastres – a URSS.
Mas então, por que Marx? Por que ele foi eleito o maior filósofo de todos os tempos, no país do apóstolo fundador do liberalismo, John Locke, por um órgão conservador de imprensa?
Porque a obra de Marx segue sendo o instrumento fundamental para a compreensão do mundo contemporâneo, um século e meio depois de ser escrita. Tantos que “abandonaram” o marxismo, o substituíram por que visão do mundo?
Que grandes obras foram produzidas por esses refúgios alternativos ao “marxismo superado”?
Quais as visões do mundo produzidas por esses “superadores” do marxismo?
Enquanto isso, é no marco das análises de Marx que se consegue inteligibilidade do mundo contemporâneo, dominado cada vez mais pela lógica do capital, da mercadoria, das crises cíclicas. Mas também pela lógica da luta de classes, quando o capitalismo liberal reproduz da forma mais aguda as contradições entre proprietários do capital e a esmagadora maioria da humanidade, que vive do seu trabalho.
A hegemonia do capital financeiro corrói por dentro a capacidade do capitalismo de se impor como “força civilizatória”, contraposta à barbárie plebéia dos proletários.
O reconhecimento de Marx como o maior filósofo de todos os tempos só recoloca com força suas idéias e o seu método – a dialética -, como marcos insuperáveis de compreensão e de proposta de transformação revolucionária do mundo.
A leitura de suas obras e sua aplicação criadora seguem sendo os instrumentos essenciais de todos os revolucionários.
Suas palavras ecoam com mais força que nunca, no novo século: “Proletários de todo o mundo, uni-vos!”
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Comentários são como afagos no ego de qualquer blogueiro e funcionam como incentivo e, às vezes, como reconhecimento. São, portanto muito bem vindos, desde que revestidos de civilidade e desnudos de ofensas pessoais.Lembrando que vc é o único responsável pelo que disser aqui. Divirta-se!
As críticas, mais do que os afagos, são bem vindas.